O Estado de S. Paulo - 14/07/2011
Após um início de ano hesitante, com dificuldade de se comunicar com o mercado financeiro, a partir de abril o Banco Central (BC) passou a dar sinais inequívocos de que está comprometido com atingir o centro da meta para a inflação em 2012.
Ao enfatizar o aumento dos juros como principal instrumento de combate à inflação - deixando para as medidas macroprudenciais a tarefa primordial de equilibrar o mercado de crédito (e secundariamente ajudar no combate à inflação via redução do crédito e da demanda) - e afirmar que o "ajuste das condições monetárias por um período suficientemente prolongado é a estratégia mais adequada para garantir a convergência da inflação para a meta em 2012", o BC conseguiu estancar a deterioração das expectativas e retomar o controle do processo.
O Relatório Trimestral de Inflação (RTI) consolidou essa percepção. No RTI, o BC se mostrou preocupado com a lentidão da desaceleração da atividade econômica e com a persistência do aquecimento no mercado de trabalho, com aumentos reais de salários acima dos ganhos de produtividade.
Segundo o relatório, ocorreu uma deterioração do trade-off entre inflação e desemprego. Enquanto a estimativa da taxa de crescimento do produto para 2011 permaneceu em 4%, as estimativas para a taxa de inflação mostraram deterioração. Em todos os cenários analisados, a taxa de inflação permanece acima do centro da meta em 2012, sugerindo que, para que ela volte para o centro da meta, o crescimento da economia terá de ser menor do que 4% e a Selic, acima de 12,75% ao ano.
Atingir a meta não será fácil. Como o mercado de trabalho é, em geral, o último a reagir às políticas de desaceleração da atividade e, a partir de 2012, fatores como o reajuste do salário mínimo e as obras da Copa e da Olimpíada irão atuar na direção de manter esse mercado aquecido, o atual ritmo de desaceleração pode não ser capaz de levar este mercado ao equilíbrio antes que esses fatores comecem a atuar. Se isso ocorrer, o BC seria forçado a intensificar o aperto monetário para evitar uma corrida entre salários e preços, uma situação com a qual o País não convive desde os anos 80 do século passado.
O segundo ponto é a questão fiscal. Para 2011 as condições são bastante favoráveis para o cumprimento da meta de superávit primário. Mas, para os anos seguintes, alguns sinais começam a preocupar. Além dos gastos decorrentes da preparação para a Copa e a Olimpíada, o reajuste do salário mínimo em 14% vai gerar um aumento importante das despesas com Previdência e assistência social, e as dificuldades na articulação política do governo têm gerado especulações quanto à possibilidade de o Congresso Nacional aprovar legislações que têm efeitos relevantes sobre os gastos do governo. Em especial, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 300, que cria um piso salarial para os policiais militares, e a Emenda 29, que aumenta os gastos governamentais com saúde. Em conjunto, esses três fatores podem produzir um aumento de despesas públicas próximo a R$ 100 bilhões por ano. Não seria fácil compensar esse aumento de gastos com reduções em outros setores. E uma redução do superávit pressionaria a inflação por causa do aumento de demanda numa economia já aquecida e por causa do aumento das expectativas de inflação geradas pela queda do superávit primário.
Este é um cenário perigoso. O problema não é a inflação em 2012, mas o fato de que, quanto mais conivente com uma inflação crescente e acima da meta, maior a pressão por indexação salarial e mais difícil e custoso evitar a aceleração da taxa de inflação no futuro.
A menos que ocorra uma queda nos preços das commodities ou uma valorização forte do real, o BC poderá, em breve, se ver diante da necessidade de substituir a expressão "por um período suficientemente prolongado" por "com maior intensidade", na frase citada no segundo parágrafo deste artigo, caso realmente queira levar a inflação para o centro da meta em 2012.
Entrevista:O Estado inteligente
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