O GLOBO - 23/07/11
Atire a primeira pedra na política de benefícios fiscais quem entender que o renascimento da indústria naval do Rio de Janeiro poderia esperar a formulação de um pacto nacional sobre incentivos fiscais. Ou, ainda, aqueles que julgam que o Brasil possui carga tributária adequada e bem distribuída, e que eventuais intervenções pontuais e urgentes podem esperar até que os representantes de todos os Estados entrem em um consenso sobre como harmonizar nosso sistema tributário.
Condenar a guerra fiscal é fechar os olhos para uma dura realidade regional. Num país em que a União discute há décadas a reforma tributária, os governadores e prefeitos têm que dar resposta política imediata aos seus desafios econômicos. E, aí, não tem segredo: a política de incentivos fiscais pode significar a diferença entre o desenvolvimento e a estagnação.
Entender o incentivo fiscal como algo positivo ou, vá lá, inevitável significa concordar com todas as iniciativas governamentais nessa área? Claro que não, pois, com tanto benefício na praça, é quase impossível que não haja algo por extinguir, consertar ou aprimorar.
Separar o joio do trigo, eis a questão. Não se trata de uma tarefa trivial. Vivemos em um país pródigo em exemplos de boas intenções, acompanhadas de ideias geniais que se perderam na falta de uma política capaz de manter a sanha dos espertalhões sob controle. Gravadas em nossa memória estão as finadas Sudam e Sudene, que começaram suas trajetórias nos cadernos de economia e terminaram nos de polícia. Reiteremos o óbvio: conceder benefícios sem a preocupação com a transparência e o estabelecimento de controles é o melhor caminho para fomentar um ambiente propício para o saque do erário público. Levando em conta esse histórico sombrio, é imperativo não só discutir benefícios e beneficiados do Rio de Janeiro como também conferir se o poder público tem estrutura para dar transparência e controlar tais incentivos.
No quesito transparência constata-se que ainda há muito que se fazer. Isso porque documentos oficiais como o Orçamento do Estado e o Boletim de Transparência Fiscal editado pela Secretaria de Fazenda ignoram solenemente o tema. Convenhamos, sequer mencionar nos relatórios financeiros um item que alcança, por baixo, a cifra de 12 bilhões é imperdoável. Pressionada pela imprensa e pelo poder legislativo, a administração pública começa a jogar luz sobre o tema. A expectativa é de que a saia justa resulte em uma mudança nessa incompreensível política de silêncio.
Urge também indagar: o Estado do Rio de Janeiro controla os incentivos fiscais que generosamente concede? No calor dos questionamentos sobre o tema, administração da Secretaria de Fazenda admitiu suas limitações e propôs a criação de um cadastro nacional de empresas candidatas a benefícios fiscais. Trata-se de mais uma ideia muito bem-vinda, mas que fique claro que não trata de algo imprescindível para acompanhar de perto quanto se dá e se recebe. Se invocamos a autonomia para conceder os benefícios, não é coerente colocar na conta da federação o ônus do seu controle.
Sabendo-se que recursos humanos e financeiros não faltam à Secretaria de Fazenda, fica a certeza de que basta a vontade política para a correção dos rumos na divulgação e controle dos benefícios fiscais. Que o presente debate sirva para trazê-la à tona. A sociedade agradece.
RICARDO BRAND é auditor fiscal da Receita Estadual do Rio de Janeiro.
Entrevista:O Estado inteligente
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