Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, julho 19, 2011

O facínora amigo - Alon Feuerwerker

Correio Braziliense,
Para azar de Dilma e do chanceler Antonio Patriota, o futuro próximo reservava uma surpresa e tanto ao Brasil e ao resto da humanidade. O futuro espreitava logo ali, na esquina

Tenho escrito frequentemente sobre o cinismo nascido do cruzamento entre a política partidária-governamental e a militância pelos direitos humanos. Esta última só consegue realizar-se, na plenitude, quando toma distância prudente daquela.

Um exemplo é a duplicidade da reação brasileira às decisões hemisféricas sobre o tema.

A posição interamericana sobre a necessidade de levar os torturadores ao banco dos réus é tratada pelo establishment petista como palavra final, irrecorrível.

Já as restrições à construção de Belo Monte são recebidas como ingerência indevida nos assuntos internos do Brasil.

O PT gostaria de rever a Lei da Anistia, mas também pretende construir a hidrelétrica no Xingu. Daí a preferência pelo cardápio à la carte. O que convém é saudado, o que não convém é repudiado.
E com igual ênfase, sempre evocando os princípios. Que os há para todos os gostos.

Embora os direitos humanos estejam no coração de cada um dos dois assuntos. Se vale num caso, deveria, em tese, valer no outro. Se o Brasil deve abrir mão da soberania na Anistia, por que não deveria também subordinar-se quando entra em pauta Belo Monte?

Por falar nisso, o que sobrou mesmo da "nova política externa" do governo Dilma Rousseff e do chanceler Antonio Patriota? Alguém sabe onde foi parar? Alguém viu?

A administração Dilma ganhou um gás de marketing na largada, ao votar contra o Irã na ONU. A ministra dos Direitos Humanos chegou a declarar que doravante os direitos humanos seriam inegociáveis.

Os apressados saudaram então a suposta ruptura com o período anterior.

Para azar de Dilma e do chanceler Antonio Patriota, o futuro próximo reservava uma surpresa e tanto ao Brasil e ao resto da humanidade. O futuro espreitava logo ali, na esquina.

Após décadas (ou séculos, conforme a contabilidade) de opressão, 2011 ficará como o ano em que o mundo árabe desencadeou o basta aos regimes ditatoriais e corruptos.

Não chega a ser uma completa novidade histórica, pois meio século atrás a região assistiu a uma onda parecida, de viés nacionalista, socialista e militar. Cujos líderes, com o tempo, preferiram reproduzir o formato das monarquias que um dia tinham proposto derrubar.

Naturalmente agora com eles próprios no comando.

A atual revolução árabe é plural, ainda que o fundamentalismo religioso mantenha certa preponderância. Mas esse é assunto só dos povos árabes, que responderão pelas suas escolhas. Na paz ou na guerra. Como vem acontecendo.

Quem vê a coisa de fora e se diz movido pela defesa dos direitos humanos não tem como vacilar.
Se o governo brasileiro desejasse mesmo levar à prática o anunciado lá atrás, deveria estar na linha de frente da condenação aos regimes autoritários e do apoio aos movimentos democráticos.

Mas não tem sido assim. O Brasil, desde quase sempre, desde bem antes dos governos do PT, olha para as ditaduras de lá como se fossem realidades congeladas.

No fritar dos ovos, talvez o Brasil tenha sido, e ainda seja, o melhor amigo dos ditadores, dos corruptos, dos genocidas daquele pedaço do mundo.

No caso líbio o Brasil ainda ficou meio em cima do muro, mas agora na Síria a diplomacia brasileira tem se destacado pelo esforço de lançar boias para salvar o facínora de Damasco.

Enquanto a coisa estava restrita ao Egito, à Tunísia, ao Iêmen e ao Barein, aliados dos Estados Unidos, a festa no petismo corria solta. Agora que chacoalham adversários dos Estados Unidos, volta a campo a retórica das "soluções negociadas".

Sonoro, mas é apenas um jeito limpinho de tentar ajudar Bashar Assad a preservar o pescoço.

Sem contar que a retórica das "soluções negociadas" será convenientemente esquecida em setembro, quando o Brasil apoiará o unilateralismo palestino na Assembleia Geral da ONU.

Arquivo do blog