Talvez por gostar de viver ao ar livre, o carioca escancara seus costumes.
Assim, a pesquisa publicada no domingo pela Revista O GLOBO, feita junto a usuários de drogas ilegais, trata de um tema que não é desconhecido, mas coloca sobre a mesa informações novas que podem ajudar na reflexão sobre formas mais eficazes — logo, mais inteligentes — de a sociedade e o poder público manejarem a questão.
Feita pela Retrato Consultoria e Marketing, a pesquisa abordou freqüentadores da noite em bares, festas, casas de show, restaurantes, etc.: 35% das pessoas se declararam usuárias de alguma droga, principalmente maconha. Têm escolaridade elevada, distribuem-se na faixa de 15 a 40 anos de idade, e a grande maioria usufrui de uma renda mensal acima de dez salários mínimos. É o motor propulsor desse mercado.
A pesquisa coincide com o levantamento de sugestões, no mundo inteiro, para que a ONU, em março do ano que vem, apresente uma nova política para as drogas. A atual, com dez anos de vigência, não funcionou, o que é indiscutível — a produção, o consumo e a violência aumentaram. Para coordenar o trabalho no continente, foi criada a Comissão Latino-Americana Sobre Drogas e Democracia, dirigida por ex-presidentes da região, entre eles Fernando Henrique Cardoso.
Nas discussões estimuladas pela comissão, são feitas críticas à política da ONU a ser substituída. Considerase que a idéia de uma sociedade “livre de drogas”, e que elas devem ser combatidas preferencialmente pelas armas, são conceitos equivocados. Cristaliza-se o pensamento de que a ONU deveria dar suporte a uma visão segundo a qual a prioridade é tratar o usuário, e assumir, sem medo, o debate sobre a legalização.
Mesmo que haja pouca esperança de que isso aconteça, pela influência americana nas Nações Unidas — os EUA advogam o enfoque belicista da droga —, o assunto está em pauta e precisa ser enfrentado.
E por todos, pois só fará sentido a liberalização se ela vier de uma ação mundial. Um país como o Brasil não poderia agir isoladamente, sob o risco de se converter num paraíso do tráfico. O Brasil avançou na legislação, ao dar tratamento mais adequado ao usuário, sem criminalizálo. Mas é pouco, com o agravante de que, no país, ao contrário de em outros, o tráfico tem o domínio territorial de áreas em grandes cidades. Sem se tratar da liberalização, para que haja controle da droga, e o usuário seja protegido, ela continuará a ser enfrentada como caso exclusivo de polícia.
E os maus resultados são tão visíveis quanto as drogas nas ruas.
Entrevista:O Estado inteligente
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