O Globo |
23/9/2008 |
"O Fórum Econômico Mundial de Davos, presidido por Klaus Schwab, encerrou ontem cinco dias de encontro com um banquete ao ar livre. Para a elite empresarial do mundo, o clima é mesmo de festa. Ao contrário de anos anteriores, quando os debates foram pautados por ameaças - crise russa, atentados de 11 de setembro, quebra da Argentina... -, a expectativa é de que 2007 será um ano fantástico para a economia mundial, sem choques no horizonte. A ponto de o moderador do debate econômico, Martin Wolf, do jornal "Financial Times", ter desabafado: "Todo mundo está contente com a situação econômica. E, para um economista, isso é muito deprimente."" Era assim que começava a reportagem publicada no GLOBO de 29 de janeiro de 2007, apenas um ano e dez meses atrás. Cito o trecho porque, diante da crise econômica sem precedentes que os EUA e, por conseqüência, o mundo vivem, o que mais me interessa é a capacidade de previsão do ser humano. Desde que a ciência se firmou como o único norte a ser seguido, todos nós nos tornamos presas da ilusão de que tudo, ou quase tudo, pode ser previsto. Esta é mesmo a base da ciência: diante de um determinado fenômeno, constroem-se hipóteses cujo grau de acerto se afere justamente por sua capacidade de prevê-lo. Calma, não sou um obscurantista, e é claro que aceito a proposição como um axioma. Mas, quando estamos no campo das ciências humanas, o grau de previsibilidade cai muitíssimo, e uma dose de humildade deveria existir em abundância. Não existe. Reli reportagens de vários jornais, com previsões e análises feitas por economistas mundo afora. O grau de certeza com que fazem os prognósticos beira o de uma pitonisa dos tempos antigos. Ler, retrospectivamente, o que disseram chega a ser constrangedor (creio que um mal-estar tomou conta dos leitores ao ler o primeiro parágrafo deste artigo). Apenas sete meses depois do rega-bofe com que o encontro de Davos terminou em 2007, eclodiu a crise do subprime, em que papéis lastreados em hipotecas feitas por tomadores com capacidade de pagamento duvidosa despencaram quando os mesmos tomadores, diante da alta dos juros e da queda no valor dos imóveis, honraram o rótulo e deixaram de pagar as prestações. Foi o início de tudo o que vivemos hoje, mas, mesmo assim, os economistas continuaram a descrever o futuro sem que o futuro lhes desse razão. É verdade que, no relatório anual divulgado em junho de 2007, o BIS, o banco central dos bancos centrais, alertou, solitariamente, para fraquezas e riscos do sistema bancário internacional, mas de uma maneira muito genérica e sem prever, nem de longe, uma crise e muito menos uma catástrofe. E, antes de fazer suas ressalvas, começou o relatório registrando que o consenso das previsões econômicas era que a excelente performance global continuaria. Haverá quem diga que isso é o máximo que um organismo como o BIS pode fazer. E talvez seja mesmo. Para ser justo, Noriel Roubini, professor da New York University, anteviu a crise do subprime em 2004 e, em 2006, diante de uma platéia de economistas num seminário do Fundo Monetário Internacional, previu uma crise com um desenrolar trágico, que levaria à destruição de fundos de hedge, de bancos de investimentos e de duas instituições gigantes, Freddie Mac e Fannie Mae (citadas nominalmente por ele), enfim, tudo a que assistimos na semana passada. Seus críticos, porém, desdenham as previsões, dizendo que o professor, um outsider, sempre se caracterizou por suas análises catastrofistas, repetidas por ele ao longo de anos e anos. Anirvan Banerji, um diretor de pesquisa de um respeitável think tank americano, que teve o azar de contestá-lo ao vivo e em cores na reunião de 2006, diz hoje que as previsões de Roubini não passam de uma infeliz coincidência: "Até mesmo um relógio parado acerta as horas duas vezes a cada dia." A favor de Banerji, diga-se que Roubini, por anos a fio, disse que os EUA entrariam logo numa recessão pesada e duradoura, e foi sucessivamente desmentido pelos fatos. Não sou capaz de dizer se Roubini é um eterno pessimista, que acerta quando o pior chega porque prevê sempre o pior, ou se ele é um gênio solitário. Não posso acreditar, porém, que a economia seja uma ciência tão rudimentar a ponto de existir, entre os seus, apenas um capaz de enxergar os fenômenos com certa clareza. Seja como for, um estudo citado pelo "New York Times" analisou o que disseram os economistas antes de recessões que atingiram 60 países durante a década de 90: em 97% dos casos, os economistas falharam em prevê-las com um ano de antecedência. Nas raras ocasiões em que foram capazes de prevê-las, os economistas subestimaram sua gravidade. E, pior, muitos foram incapazes de prever recessões que aconteceriam dali a dois míseros meses. Prever o futuro é mesmo complicado. Não cobro aqui que economistas sejam sempre capazes de prever crises ou catástrofes: por definição, se fosse possível prevê-las, elas simplesmente seriam evitadas ou antecipadas. Registro apenas que os economistas têm sido muito peremptórios em previsões que simplesmente não se realizam e cegos diante de fenômenos que estão prestes a acontecer. Deviam ser mais cautelosos num caso e mais perspicazes no outro. Por que escrevo tudo isso? É para me tranqüilizar e tranqüilizar os leitores. Diante do inferno que estamos vivendo, já li previsões para todos os gostos. Gente daqui e de fora até já puseram no papel que o capitalismo e o liberalismo estão ameaçados. A estes, eu digo: menos, por favor, menos. |
Entrevista:O Estado inteligente
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