É preciso consciência sobre a ameaça da implosão da família
CARLOS ALBERTO DI FRANCO
Com a pretensão de legalizar “novos arranjos e composições familiares que se materializaram sem que a lei tivesse tempo de prever e proteger seus direitos”, o “Estatuto das Famílias” é um tiro de morte na família tradicional.
Preparado pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), o projeto de lei nº 2.285/2007, em silenciosa tramitação no Congresso Nacional, é uma agressão à Constituição e uma bofetada nas raízes culturais do Brasil. Impressionoume negativamente a leitura atenta do projeto. Por isso, é importante que a sociedade tome consciência do estrago que se avizinha: a implosão da família.
Sobre a importância social da família há volumes alentados, análises e estudos muito ponderáveis. Eu desejaria hoje, concretamente, frisar apenas uma das razões que, a meu ver, evidenciam o nexo de causalidade existente entre família sadia e sociedade civilizada e democrática.
Refiro-me ao fato de que, na sociedade, não há nenhum âmbito de crescimento humano e ético, nenhum ambiente educativo, nenhum “coletivo” tão propício e eficaz para o cultivo das virtudes como a família bem estruturada. E isso é de suma importância, levando em consideração que, no mundo atual, cada vez parece mais evidente que a sociedade precisa do oxigênio vital das virtudes. Decadência social e ignorância ou desprezo pelas virtudes são a mesma coisa.
A não ser que hoje ainda se considerem vigentes as afirmações feitas pelo poeta Paul Valéry, num famoso discurso à Academia Francesa: “Virtude, senhores, a palavra ‘virtude’, já morreu ou, pelo menos, está em vias de extinção (...). Receio que não exista jornal algum que a imprima ou se atreva a imprimila com outro sentido que não seja o do ridículo.
Chegou-se a tal extremo, que as palavras ‘virtude’ e ‘virtuoso’ só podem ser encontradas no catecismo, na farsa, na Academia e na opereta.” Seria de desejar que atitudes desse tipo tivessem ficado enterradas no passado. Quando Valéry falava, virtude sugeria limite, enquadramento, barreira obsoleta, num ambiente ébrio do vinho novo da liberdade. A centralidade da virtude na formação do ser humano havia cedido espaço à liberdade sem limites, numa eufórica erupção de individualismo egocêntrico (que, paradoxalmente, na primeira metade do século XX descambou nas duas maiores tiranias da História). A sociedade atual, com suas mazelas, com os preocupantes desvios de comportamento (basta pensar na escalada da violência, na epidemia da corrupção e no inferno das drogas) é de molde a reacender uma autêntica “saudade das virtudes”.
Pode ser bom mergulhar um pouco na sabedoria dos antigos. Remontemos a 2.500 anos atrás e ouçamos Confúcio dizer: “Para governar deliberadamente um reino é necessário dedicar-se primeiramente a estabelecer a família e o ordenamento que lhe convém. Uma família que responda às exigências humanas e pratique o amor bastará para infundir no reino essas mesmas virtudes.” Muito nos pode dizer também a sabedoria dos gregos. Qualquer estudioso da antigüidade clássica sabe que, entre os poetas e filósofos gregos — e, posteriormente, entre seus discípulos latinos — a grandeza do ser humano estava indissociavelmente vinculada à “aretê”, conceito de rico conteúdo cuja tradução mais aproximada, na linguagem moderna, é precisamente a de “virtude”.
O homem vulgar — recorda Werner Jaeger na sua famosa “Paideia” — não tem “aretê”. E, nas pegadas de Sócrates, Platão reiterará que a virtude, a “aretê”, é a que torna a alma bela, nobre e bem formada, a que abrange e eleva o “humano” em sua totalidade e irradia depois como glória na vida da comunidade.
A família, sim, a família já foi e deveria ser agora o caldo de cultura mais propício para a prática das virtudes. Estamos numa encruzilhada. Não duvidemos. A futura sociedade brasileira encaminhase para uma dessas duas possibilidades, apontadas pelo jurista Pedro J. Viladrich: ou ser uma “constelação de famílias”, dessas células primárias, vitais, naturais, sadias, que constituem o bom tecido social; ou ser um “aglomerado de indivíduos”, preso cada um deles ao interesse particular e ligado aos demais pelo que Gustave Thibon chamava um “egoísmo compartilhado”.
CARLOS ALBERTO DI FRANCO é diretor do Master em Jornalismo.
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