Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, março 04, 2011

VINICIUS TORRES FREIRE O jeitinho do PIB brasileirinho

FOLHA DE SÃO PAULO - 04/03/11
PIBão oculta o fato de que modelo de crescimento visto desde 2005 impede voos maiores da economia

A GENTE pode discutir esse ou aquele décimo de porcentagem do PIB que subiu ou desceu. Mas não se vai muito longe nesse caminho, ainda mais se considerados os números das contas nacionais (PIB) divulgados ontem, que não apresentaram grande novidade -nem pequena. Os resultados foram mais ou menos os previstos faz meses.
Mais interessante talvez seja observar o padrão de crescimento que se desenha mais ou menos desde 2006, quando o país saiu de um atoleiro de quase um quarto de século.
Além disso, caberia lembrar que a evolução recente da economia brasileira, apesar de animar os sobreviventes da grande estagnação (1980-2005), não tirou o país do seu lugar no ranking mundial da renda per capita dos últimos 40 anos, ali pelo meio da distribuição de um grupo de 150 países para os quais há dados mais ou menos confiáveis. O crescimento médio, de Lula para cá, também ficou pela mediana mundial, ou um pouco abaixo.
A economia do país tem crescido graças à boa sorte das melhorias nos "termos de troca", como diz o jargão econômico. Isto é, o preço dos nossos produtos de exportação subiu mais que os de importação. As mudanças realizadas nos anos FHC e Lula ajudaram, mas por si só não segurariam a nossa peteca.
Como já se cansou de saber, a taxa de investimento é baixa e o consumo é alto e crescente. Consumo privado, despesas de investimento e gastos do governo têm crescido a uma velocidade muito maior que a do PIB, desde a retomada de 2005 -uns 50% mais. Dependemos de dinheiros externos para cobrir esses nossos excessos.
Talvez fosse impossível ser de outro modo -evitar tais excessos. O Brasil é um país pobre e de horrenda desigualdade. A coisa era ainda pior faz dez anos, é verdade, e insuportável faz pouco mais de 20 anos, quando foi aprovada a Constituição de 1988 e a economia vivia colapso crônico. Num país democrático (com eleições livres, ao menos) e urbanizado, não aumentar o consumo e a despesa social provavelmente daria em tumulto político. Enfim, o dinheiro público que não foi gasto em aumento de benefícios sociais foi apropriado pelos suspeitos de sempre -alta burocracia, subsídios a grandes empresas e a ricos.
Não é de espantar que cresçamos com deficit público e externo crescentes, juros altos, baixo investimento e câmbio valorizado. Sim, temos ainda outros problemas -como baixa taxa de inovação, aumento lento da produtividade e péssima educação para o trabalho.
Sob certo aspecto, somos o oposto do modelo chinês, de moeda fraca, taxa brutal de investimento e crescimento puxado por exportações, coisas que demandam repressão de salários e benefícios sociais.
Podemos crescer por volta de uns 4%, 5%, enquanto China, Índia & cia. puderem e quiserem incorporar seus centenas de milhões de miseráveis rurais, crescendo rápido, "para fora", consumindo menos do que podem, mas ainda assim beneficiando o preço dos nossos produtos.
Mas o país não irá muito mais rápido do que isso, ao menos enquanto se prender ao padrão de crescimento sinodependente "cum" gastos do Estado de Bem-Estar Tropical e escasso incentivo ao aumento da produtividade e da inovação. Sim, já fomos muito piores. Mas, pelo jeito, não seremos muito melhores.

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