O Estado de S.Paulo - 08/03/11
O carregamento das reservas brasileiras, hoje de US$ 309,4 bilhões, custa caro (cerca de R$ 40 bilhões por ano) e quanto mais crescem, mais dólares atraem. Por que, então, não usar parte dessas reservas para investir em infraestrutura? Não teriam retorno bem maior do que o rendimento dos títulos em que estão aplicadas, na medida em que reduziriam os custos de produção do Brasil, perguntam leitores desta Coluna.
Essa proposta não é nova. Nos anos 80, o ex-ministro Delfim Netto chegou a sugerir a utilização de reservas "para construção de estradas".
Naquela época não fazia muito sentido porque o Brasil tinha baixo nível de reservas e era preciso ter dinheiro em caixa para enfrentar fugas de capital, tão frequentes diante de tantas crises.
No entanto, hoje as reservas não cumprem mais a função de blindar o País contra crises, uma vez que há mais do que o suficiente para isso. Por que não aceitar essa sugestão?
É que eventual utilização de reservas para investimentos em infraestrutura teria de ser gasta em dólares e não em reais. Se tivessem de ser gastas em moeda nacional, para pagamento de salários e materiais, exigiriam conversão em reais. E, se um pedaço das reservas fosse reconvertido em reais, estaria acentuando a valorização do real por meio de aumento da oferta de moeda estrangeira no mercado. E essa valorização é o que o governo está pretendendo evitar com o aumento das reservas.
Mas se fossem utilizadas para pagar lá fora equipamentos e serviços destinados a ampliação de infraestrutura sem ter de passar pelo câmbio interno, as reservas em dólares estariam aumentando ou as importações ou as despesas com serviços. Nessas condições, estariam elevando o déficit em Conta Corrente (contas externas), que neste ano deverá saltar para alguma coisa em torno dos 2,9% do PIB (algo entre US$ 65 bilhões ou US$ 70 bilhões), pelas últimas projeções do Banco Central.
Outra opção seria o uso de parte das reservas pelo Tesouro com o objetivo de aumentar o capital de empresas estatais, como Banco do Brasil, Petrobrás e BNDES. Como a maioria dessas empresas tem obrigatoriamente despesas em dólares, esses recursos nem teriam de passar pelo câmbio interno.
Independentemente de qualquer outra consideração, se o Tesouro adiantasse a uma empresa estatal um volume de moeda estrangeira das reservas nacionais que necessariamente devessem ser gastas lá fora, fica claro que deixaria de ser feita a operação de compra de dólares que essas estatais teriam de realizar para se abastecer e da qual agora ficariam dispensadas. Ou seja, mais uma vez, ficaria reduzida a procura por moeda estrangeira, justamente o que o governo quer ampliar.
Se pudesse ser feita, a utilização de reservas para ampliação e modernização da infraestrutura no Brasil talvez resolvesse o problema do alto custo de carregamento e da baixa rentabilidade dos títulos em que estão aplicadas, mas não resolveria outros. Especialmente, não resolveria o problema da enorme oferta de moeda estrangeira no câmbio interno, fator que está provocando a valorização do real diante do dólar.
Entrevista:O Estado inteligente
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