21/08/10
Nenhum crítico ou inimigo da Petrobrás conseguiu, em mais de meio século, prejudicar tanto a imagem da empresa quanto o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com suas trapalhadas em torno da exploração do pré-sal. Em busca de recursos para o mais ambicioso de seus projetos, a maior estatal brasileira perde espaço no mercado de capitais, em vez de mobilizar investidores para um empreendimento de proporções extraordinárias. Cerca de um quarto do valor de suas ações se evaporou desde o começo do ano. A perda chega a 30%, aproximadamente, se for contada a partir do último pico, em 1.º de dezembro do ano passado. O Fundo Soros, seu maior acionista privado até há pouco tempo, vendeu todos os papéis da estatal. Já não tinha nenhum em 30 de junho, segundo informou nesta semana à Security Exchange Comission, reguladora do mercado de ações dos Estados Unidos. A explicação da venda é óbvia: quem pode estar seguro, diante da imensa confusão criada pelas autoridades brasileiras em torno da capitalização da empresa? O megainvestidor George Soros não está sozinho. Na semana passada, o Banco UBS recomendou a seus clientes a venda de papéis da Petrobrás.
A União, controladora da empresa, deve participar de sua capitalização fornecendo-lhe 5 bilhões de barris de petróleo do pré-sal, um ativo ainda escondido no Atlântico, a milhares de metros de profundidade. Esse foi o caminho definido há meses pelo governo, mas ainda não há acordo sobre o preço de cada barril. Avaliações encomendadas pela Petrobrás e pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) indicaram valores muito diferentes - entre US$ 5 e US$ 6, num caso, e entre US$ 10 e US$ 12, no outro. Se prevalecer um preço considerado alto pelo mercado, os acionistas particulares poderão ser desestimulados, porque será difícil manter sua participação no capital ou, pelo menos, evitar uma redução muito grande.
Mais que um impasse entre a empresa e a ANP, a disputa sobre o valor daqueles barris é um fator de insegurança para os investidores. Além de tornar o quadro muito confuso, o desentendimento reforça o temor do viés político nas decisões sobre o pré-sal e sobre o papel da Petrobrás. Esse viés tem sido perceptível desde o início das discussões, em Brasília, sobre a exploração dos enormes depósitos de petróleo e gás descobertos em águas brasileiras.
Uma assembleia de acionistas aprovou a emissão de papéis para captação de até US$ 150 bilhões. A operação foi adiada de julho para setembro e já há dúvidas sobre o cumprimento do novo prazo. O presidente Lula, segundo fontes próximas da Presidência da República, poderá optar pelo adiamento de qualquer decisão, para evitar um debate complicado às vésperas das eleições. Ele teme, segundo as fontes, criar problemas para a candidata Dilma Rousseff. Esse risco seria menor, se o governo houvesse tratado a questão do pré-sal com mais objetividade e menos ideologia.
A questão ideológica jogou para segundo plano a questão essencial: a exploração eficiente, segura e lucrativa da riqueza do pré-sal. Ao ressuscitar bandeiras dos anos 50, o governo simplesmente desviou o foco do planejamento e dificultou a mobilização de capitais.
Mas a confusão de objetivos se tornou mais perigosa quando o governo resolveu converter a Petrobrás num instrumento de política industrial. Ao forçar a nacionalização de uma porcentagem dos bens e equipamentos destinados à pesquisa e produção no pré-sal, Brasília acrescentou um peso econômico e um problema tecnológico a um empreendimento já muito caro e complicado. A Petrobrás até defendeu essa política, mas em pouco tempo anunciou a impossibilidade de cumpri-la integralmente.
O governo e a ANP insistem, no entanto, em misturar o projeto do pré-sal com sua nova e improvisada política industrial. A participação dos produtos nacionais poderá ser mais modesta na fase de exploração, mas não na etapa de produção. A meta de conteúdo local deverá constar, informa-se em Brasília, do contrato de capitalização. Essa mistura seria mais uma prova de incompetência gerencial e de absoluta desorientação na fixação de objetivos estratégicos.
Entrevista:O Estado inteligente
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