Os contratos de terceirização têm sido os mais variados. Há bons e ruins. Há empresas contratantes que zelam pela proteção dos empregados das empresas contratadas por meio de checagem criteriosa da sua reputação e monitoria constante durante a execução do contrato. Mas há também as que ignoram tudo isso.
É aí que ocorre a precarização. Em muitos contratos, a contratada descumpre a legislação e a contratante fecha os olhos. Em outros casos, esta só vem a saber disso quando a contratada quebra ou desaparece na hora de pagar as verbas rescisórias, deixando seus empregados na mão. Eles só receberão tais verbas se a contratante for compreensível ou se tiverem êxito nas demoradas ações trabalhistas.
Há, ainda, os contratos que mantêm os empregados da contratada em condições desumanas. Já vi trabalhadores terceirizados tomando refeições sob sol a pino e sentados numa sarjeta de rua, enquanto os empregados da contratante saboreavam um almoço gostoso em restaurante com ar condicionado.
A terceirização é regida pelo Enunciado nº 331, do Tribunal Superior do Trabalho, que proíbe a contratação de serviços ligados à atividade-fim da empresa contratante. Ao Enunciado pouco importa se a refeição é tomada na sarjeta, se as necessidades fisiológicas são feitas em latrinas imundas ou se os terceirizados são expostos a riscos de vida e a doenças profissionais.
O Enunciado deixa de focar o que é essencial - a proteção dos trabalhadores - para se dedicar ao secundário - a distinção entre fim e meio, que, aliás, não estão definidos em nenhum lugar, o que gera grande insegurança jurídica para as empresas. Muitas são autuadas e processadas porque o auditor fiscal e o juiz "acharam" que determinada atividade dizia respeito ao fim e não ao meio.
Esclareça-se, porém, que a definição clara de fim e meio se tornou dispensável, porque as empresas da atualidade trabalham em redes de produção e, por isso, precisam contratar de tudo. O importante é que contratem de forma correta e respeitosa.
Se há desproteção, a terceirização nada tem a ver com isso. O Brasil se ressente da falta de mecanismos eficientes para coibir os abusos.
O importante não é impedir a terceirização ou fazer esgrima para descobrir o que é fim e o que é meio. É premente estabelecer regras claras para dar segurança a todos os participantes dessa nova divisão do trabalho, que, aliás, veio para ficar. O Enunciado nº 331 não tem esse alcance. O atual vácuo legal precisa ser preenchido urgentemente.
Vários projetos tramitam no Congresso Nacional há mais de dez anos, mas nenhum contempla os objetivos mencionados. Falta a eles visão pragmática do processo. Terceirização implica parceria entre contratantes e contratados. Uma lei inteligente teria de usar essa parceria para dividir responsabilidades entre as empresas. As contratadas precisam aprender a respeitar a lei e as contratantes precisam monitorar a execução dos contratos do começo ao fim.
Muitos empresários acham que esse envolvimento tornaria a terceirização muito cara. Ledo engano. São inúmeros os casos em que os passivos trabalhistas decorrentes da insegurança jurídica comprometeram a própria sobrevivência das empresas. Isso, sim, é caro.
Para os trabalhadores, a boa terceirização traria uma vantagem adicional. Estudos recentes têm mostrado que, em regime de parceria, as exigências técnicas das contratantes levam os trabalhadores da contratada a adquirirem novos conhecimentos e a se aperfeiçoarem na profissão, o que lhes traz maiores oportunidades de trabalho e de renda (Gary Gerrefi, The New Offshoring of Jobs and Global Development, OIT, Genebra, 2005).
Com criatividade e boa vontade pode-se chegar a uma fórmula que atenda aos interesses dos dois lados. Está na hora de fazer uma lei de boa qualidade para acabar com o mito segundo o qual todo contrato de terceirização deságua, necessariamente, em precarização dos trabalhadores.