O encontro serviu pelo menos para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fazer mais uma peroração sobre como a crise surgiu nos mercados mal policiados do Primeiro Mundo e sobre a incapacidade do G-7, composto pelas maiores economias desenvolvidas, para cuidar sozinho da boa ordem financeira internacional. Dito isto, o presidente brasileiro voou para Roma com numerosa comitiva, onde cumprirá uma agenda que inclui visita ao papa, antes de participar, em Washington, no próximo fim de semana, do encontro de chefes de governo do mesmo G-20, convidados pelo presidente George W. Bush.
O comunicado reproduz o escasso consenso alcançado entre ministros do mundo rico e os do mundo emergente. Os ministros defendem maior controle dos mercados, maior participação do G-20 nas deliberações sobre as finanças globais, políticas fiscais expansionistas para conter a crise, um papel mais importante para o Fundo Monetário Internacional (FMI) na supervisão dos mercados e maior peso para os emergentes nas instituições multilaterais.
Todas essas idéias foram discutidas amplamente desde a assembléia do FMI, em outubro. O diretor-gerente da instituição, Dominique Strauss-Kahn, já foi além das poucas idéias enunciadas no documento de São Paulo e promete apresentar propostas concretas na reunião de Washington. No dia 6, antes de embarcar para a capital paulista, ele mandou uma carta aos chefes de governo do G-20, adiantando alguns pontos. Advertiu sobre a possível necessidade de mais dinheiro para ajudar os países atingidos pela crise. Antecipou idéias sobre a montagem de um sistema internacional de acompanhamento dos mercados e de sua articulação com as autoridades nacionais - as únicas que podem impor normas ao mercado. Com realismo, propôs a formação de um grupo representativo de formuladores de política para estabelecer um esquema de supervisão em níveis nacional e multilateral. A reunião de Washington, segundo ele, poderá servir para a formação de grupos de trabalho, orientados para a apresentação de resultados no próximo ano. Para as questões de médio prazo, essa perspectiva é realista. O problema de curto prazo resolve-se com as políticas já adotadas por vários governos - socorro a bancos, estímulo ao crédito e maiores gastos -, tanto mais eficientes quanto mais coordenadas.
As conversações em São Paulo não avançaram em nenhuma dessas áreas. Ficaram nas generalidades, como a defesa da redistribuição de votos no FMI. Mas essa reforma já começou, com a compra de maiores cotas pelos países emergentes. O princípio de proporcionalidade entre as participações no capital e no total de votos não foi essencialmente alterado. Quem paga mais manda mais, observou, com irretocável sensatez, a ministra da Economia da França, Christine Lagarde. Ela já havia discordado do presidente Lula, quando este propôs a conclusão da Rodada Doha de negociações comerciais como um dos passos para a solução da crise. Já há difíceis problemas imediatos para resolver, comentou a ministra. O presidente Lula pode ter razão quanto à conveniência de se concluir a rodada. Essa seria uma forma de combater a tentação do protecionismo, que sempre ganha força nos momentos de crise. Mas não foi para isso que os ministros do G-20 se reuniram em São Paulo. Aqui, eles deveriam ter produzido novas idéias para enfrentar o desafio imediato: a superação da crise de crédito na economia internacional. Os chefes de governo que se reúnem em Washington terão de se virar sem elas.