Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, setembro 16, 2008

Na crise, tudo sempre pode piorar mais



Coluna - Angelo Pavini
Valor Econômico
16/9/2008

O Índice Bovespa foi engolfado ontem pela crise financeira americana, registrando uma queda de 7,59%, a maior desde os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001. Em um dia, o índice disse adeus a quase 4 mil pontos, desabando de 52.392 pontos na sexta-feira para 48.416 pontos ontem, o menor nível desde os 48.015 registrados em 16 de agosto do ano passado, outra data trágica para o mercado, quando explodiu a crise das hipotecas de risco americanas. Apenas para recordar, em setembro de 2001, o índice caiu 9,18%, até acionar o limite de queda, ou "circuit braker" da bolsa. Só que, naquela época, o Ibovespa estava em 10.827 pontos.

O pior de todo esse movimento é que os especialistas não esperam que a crise deflagrada pela concordata do centenário banco americano de investimentos Lehman Brothers acabe por aí. Apesar de o acordo de venda da Merrill Lynch para o Bank of America tirar um dos primeiros da lista de próximas vítimas, o mercado suspeita do tamanho do rombo que surgirá a partir dessa turbulência em outras instituições, lembra Antonio Milano, diretor da Fator Corretora. "A sensação é que a sede de sangue do mercado ainda não acabou e que o mercado pode piorar mais", diz ele. Até o fechamento desta edição, havia dúvidas sobre a sobrevivência da gigante dos seguros, AIG.

E novos corpos podem aparecer de onde menos se espera, especialmente levando-se em conta que as perdas que os investidores asiáticos e do Oriente Médio tiveram com bancos americanos podem reduzir o interesse desses aplicadores em socorrer essas instituições. Ontem, o Índice Standard & Poor"s 500 Financials, que reúne as ações das principais instituições financeiras americanas, apresentou queda de 10,40%. Por tudo isso, Milano acha que o investidor que tem dinheiro vai esperar para comprar na bacia das almas.

Por aqui, o mercado devolveu boa parte dos ganhos que tinha registrado na semana passada por conta da alta de Petrobras após a confirmação das reservas do pré-sal do poço de Iara e das esperanças vãs que o Lehman seria salvo. A queda concentrou-se nos papéis de primeira linha, os preferidos dos estrangeiros, numa média de 10%, confirmando o movimento de redução de risco que tomou conta dos investidores ao redor do mundo e onde o Brasil é mais atingido por ter maior liquidez. Com os estrangeiros saindo a qualquer preço, os investidores locais aproveitavam as distorções de preços para comprar um ou outro papel.

A maior queda ficou com a agora especulativa ação ordinária (ON, com voto) da BM&FBovespa, com 13,92%, seguida pela Petrobras ON, com 9,94%, Petrobras preferencial (PN, sem voto), com 9,86% e Vale PNA, com 9,68%. A seguir vieram Brasil Telecom e Oi, que dependem de crédito para concluir a fusão, com perdas em torno de 9,5%, e as siderúrgicas, com perdas entre 8% e 9%. Os bancos brasileiros foram menos contaminados pela crise financeira desta vez, mas mesmo assim o papel ON do Banco do Brasil perdeu 8,86% e a unit (certificado de ações) do Unibanco, sócio da AIG em seguros no Brasil, caiu 8,06%. Do Ibovespa, apenas a Comgás PNA conseguiu terminar o dia em alta, de 0,51%. Até mesmo setores vistos como mais defensivos, como o elétrico, terminaram em baixa.

Na prática, a crise até agora só afetou no Brasil as taxas de juros futuros, que subiram e podem impactar o crescimento local, diz Kelly Trentin, analista da SLW Corretora. "Mas ainda é cedo para revisar as estimativas", diz ela, que acha que as empresas estão sendo negociados por muito menos do que elas valem, mas que a questão é quando o investidor vai se sentir confortável para investir. Já Eduardo Kondo, da Corretora Concórdia, estima que os preços atuais indicam múltiplos bastante interessantes para o mercado. "Hoje o Ibovespa deve estar com uma relação Preço/Lucro (P/L) em torno de 8,5 vezes, sendo que já chegamos a 12 vezes", diz. Petrobras e Vale estariam com P/L projetados para 2009 em torno de 7 vezes. Quanto menor esse indicador, mais barata está a ação.

Bye bye, emergentes

A fuga do risco aparece nos números dos fundos internacionais que investem em mercados emergentes. Segundo a consultoria EPRF, as carteiras que compram ações de países emergentes perderam US$ 2,23 bilhões na semana encerrada dia 10 de setembro, elevando para US$ 28,6 bilhões os saques no ano, o equivalente a 5% do total de ativos. No mesmo período do ano passado, esses fundos tinham captado US$ 10,7 bilhões. Os fundos compostos por títulos de renda fixa de países emergentes perderam US$ 1,08 bilhão na semana. Esses números são confirmados pelo saldo de estrangeiros da Bovespa, que está negativo neste mês, até dia 11, em R$ 910 milhões, e em R$ 17,445 bilhões no ano.

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