O novo presidente americano vai encontrar um cenário econômico desolador. A economia estará estagnada, o desemprego crescendo, as contas públicas terão um déficit explosivo, o setor bancário estará fragilizado. Com sorte, a inflação terá cedido pelo efeito do fraco consumo. Nenhum dos candidatos a presidente e vice, nas duas chapas, tem a economia como seu ponto forte.
Uma pesquisa feita pelo jornal “Wall Street Journal” com 51 economistas mostrou que a maioria traça esse cenário. “Problemas econômicos vão receber o presidente”, diz o título. Os economistas prevêem retração do consumo no terceiro trimestre, justamente o da eleição.
Essa é a primeira vez que isso ocorre em 17 anos. Segundo o “Journal”, mesmo na última recessão, para a surpresa dos economistas, o consumo não teve números negativos.
— Desemprego crescendo rapidamente, pacote de incentivos já esgotado, preços de casas caindo, preços de ações caindo, perda geral de confiança e condições de crédito mais apertadas.
Nada disso soa bem — disse um dos entrevistados, Paul Ashworth, da Capital Economics.
Com um quadro desses, o natural seria uma forte dianteira do candidato da oposição e uma sova no candidato do governo.
Eles estão embolados, faltando menos de oito semanas para as eleições, pela falta de respostas convincentes do Partido Democrata para as questões econômicas.
Nos debates das primárias, a candidata derrotada Hillary Clinton dava respostas mais bem informadas do que as de Barack Obama em economia. Já o candidato republicano, John McCain, salva-se do desastre da continuidade porque a atenção da imprensa e as questões levantadas pela oposição estão longe da economia.
Quanto mais longe estiverem, menos constrangimentos ele sofre pela falta de idéias.
John McCain quer cortar impostos das empresas no pressuposto de que, mais fortes, elas empregarão mais. Barack Obama quer reduzir impostos de quem ganha abaixo de US$ 250 mil por ano, para incentivar o consumo.
A timidez das propostas não garante a superação de uma crise cheia de complicadores.
“Não se pode resgatar o mercado financeiro e a economia real ao mesmo tempo”, disse um dos entrevistados da pesquisa do “Wall Street Journal”. A máquina de calcular confirma isso. Os Estados Unidos estão com um déficit orçamentário de quase US$ 500 bilhões, com tendência a crescer por efeito do socorro às instituições financeiras.
Na semana em que foi feito o mais espantoso pacote de socorro financeiro, para a Fannie Mae e a Freddie Mac, o debate da campanha eleitoral ficou dominado por pequenos escorregões dados por um ou outro candidato.
Os Estados Unidos se perdem nos seus descaminhos, ignorando que precisam encontrar uma maneira de sair da crise.
Ela não é trivial. Um alívio dos impostos dos ricos e das empresas, como propõe a receita republicana, ou uma redução dos impostos das famílias, como propõe a receita democrata, é o mais do mesmo. E essa crise é diferente das outras.
Os descaminhos americanos estão claros nos temas que capturaram a atenção da imprensa em geral nos últimos tempos.
Desde que Sarah Palin foi escolhida como vice de McCain, ela dominou o noticiário.
Houve um enorme destaque a suas opiniões conservadores, coisa que ela tem todo o direito de ter. Ela é contra o aborto, o casamento de homossexuais, o sexo antes do casamento, é membro da associação que defende as armas, gosta de matar alces no Alasca e é evangélica da linha fundamentalista.
Ela tem o direito de pensar e ser tudo isso; são escolhas privadas. Podemos pensar diferente. Por mais repulsivo que seja matar animais silvestres, lá é permitido.
Com tantas falsas questões, fica difícil ver o essencial.
Ela tentou censurar uma biblioteca pública, quer ensinar criacionismo nas escolas, atribui a desígnios de Deus certas decisões políticas tomadas por ela e pelo governo Bush, como o gasoduto no Alasca e a guerra do Iraque.
Isso é perigoso. É a velha mistura de Estado e religião, o que o Ocidente superou há 500 anos quando começou a construir instituições laicas. A convicção religiosa de cada político é questão privada, mas quando ele ou ela pensam em transformá-la em políticas públicas, passa a ser do interesse geral.
A crítica à sua falta de experiência em política externa também é desfocada, a despeito da sua desastrada declaração da guerra com a Rússia. George Bush nunca tinha saído do país e também não tinha experiência quando se candidatou e, mesmo assim, ganhou dois governos.
Mais importante que sua inexperiência é que, no tema mudança climática, Palin enterrou qualquer ilusão de que a chapa republicana, desta vez, teria uma posição mais atualizada da questão. John McCain parou de falar no tema e ela tem visão tosca sobre o assunto. A caça ao alce produz cenas chocantes, mas o pior mesmo é ter mais quatro anos de uma atitude irresponsável de Washington na questão climática.
Seria fundamental que o novo governo tivesse uma proposta para enfrentar a crise econômica e modernizar a postura americana na questão climática. Mas o que vai divertir os eleitores, ocupar as manchetes e ocupar o debate serão as notícias diárias sobre as escorregadas e declarações polêmicas de cada candidato.
Entrevista:O Estado inteligente
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