Mas nada indica que o ajuste esteja perto do fim. O passivo derretido do Lehman Brothers alcançava US$ 613 bilhões e mais instituições financeiras podem ter sido avariadas com o desfecho tramado pelas autoridades dos Estados Unidos.
A paisagem de Wall Street está mudada. Dois dos cinco maiores e mais tradicionais bancos de investimento americanos (o Bear Stearns e o Lehman) estão sendo riscados do mapa.
O episódio deixa questões colossais sem resposta. Por que, por exemplo, instituições que pareciam carregar as mesmas mazelas mereceram tratamento melhor? Enfim, por que os ativos do Bear tiveram socorro oficial e os do Lehman não? E não estamos falando das megaagências hipotecárias Fannie Mae e Freddie Mac, que são Government-Sponsored Enterprises (GSE) e têm assistência oficial garantida.
A decisão de abandonar o Lehman à própria sorte muda o padrão adotado até agora. Mas qual é a linha divisória para a diferença de tratamento? Quando devem ser usados recursos do contribuinte para salvar instituições quebradas e quando não devem?
Responder que o critério nessa hora é evitar crise sistêmica (quebra em cascata) é miseravelmente escapista. Por que, então, a quebra do Bear levaria a isso e a do Lehman, não? Responder que é preciso, em alguma medida, respeitar o princípio do risco e do que a ele se segue (castigo ou recompensa) pouco esclarece.
Desde tempos imemoriais, é parte da cultura ocidental a idéia de que, sempre que há tensão entre o céu e a terra, uma vítima importante deve ser sacrificada. Assim foi feito. Pouparam o novilho do Bear, mas queimaram o do Lehman no altar de Moloque. Mas por quê?
As autoridades argumentam que em março, quando do episódio do Bear, o mercado não estava preparado para o que ocorreria e, então, foi preciso fazer o que se fez. Agora, dizem, é diferente: quem se preparou se preparou, e quem não, que assuma as conseqüências. Vá saber...
Uma das conseqüências da quebra do Lehman é o estrangulamento ainda maior do crédito mundial. Os bancos globais, que já estavam fechados sobre si mesmos, redobrarão suas prioridades para o cuidado com as próprias feridas.
O Brasil está no meio do incêndio, mas em condições muito melhores do que há alguns anos. Poderá ser atingido de três formas: pela queda das exportações, que se seguirá a novas quedas de preços das commodities; pelo aumento das remessas de lucros por parte das filiais estrangeiras; e pelo estancamento do crédito.
Por um bom tempo os investidores contarão até cem antes de empurrar mais dinheiro para capitalizar empresas brasileiras. Elas terão de acorrer ao crédito bancário daqui e do exterior. E não vai sobrar para todas. Muitos investimentos que estavam no forno talvez sejam adiados.
Este poderá vir a ser o principal canal de desaceleração do crescimento. Talvez não saia barato, mas, no fim do processo, o País estará melhor.
CONFIRA
É hoje - O Comitê de Política Monetária (Fomc, na sigla em inglês), do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), se reúne em plena crise para decidir o que fazer com os juros, hoje de 2,0% ao ano.
Até a quebra do Lehman, ninguém apostava em novo corte dos juros, que já são negativos. Agora, esta é uma hipótese com que o mercado financeiro passou a trabalhar.
Falta saber que efeito teria outro corte, de 0,25 ponto ou de 0,5 ponto. Talvez não fizesse diferença em termos "físicos". Mas poderia ser dado como recado de que o Fed continua disposto a apagar incêndios.