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Ortega y Gasset cunhou a máxima de que o homem não é um ser isolado: é ele e sua circunstância. E é como tal que tem de ser avaliado. Em política, isso é ainda mais verdadeiro. Nenhum líder fala e age apenas por si. Expressa sua circunstância.
Portanto, a presidente Dilma Rousseff não pode ser avaliada apenas como indivíduo, pessoalmente honesta e empenhada em acertar. Há a sua circunstância – e aí reside sua tragédia.
É ela – sua circunstância – que a obriga a comprometer seu patrimônio moral e pessoal, avalizando transações tenebrosas como a compra da refinaria de Pasadena, ora objeto de CPI, ou fazendo vista grossa aos "malfeitos" de sua caótica base parlamentar.
De um lado, o PT, com suas facções, empenhadas em eternizar-se no poder, fazendo caixa com dinheiro público, aparelhando o Estado. De outro, os aliados fisiológicos, PMDB à frente, indiferentes ao projeto de poder dessas facções, desde que lhes caiba um naco nutritivo do aparelho do Estado.
Dilma, a rigor, não simpatiza, nem é simpatizada por nenhuma dessas alas. É vista no PT como uma arrivista, já que não fez parte de sua gênese, oriunda que é do PDT brizolista. Não fosse o apadrinhamento de Lula e jamais chegaria aonde está. Furou a fila, o que, em política, custa caro, gera inimigos.
Com relação aos fisiológicos, teve sempre grandes dificuldades, pois tal convívio impõe negociações constantes, concessões, o que lhe contraria a índole autoritária de neófita em política. Experiência não se improvisa.
Daí as frequentes tensões com os aliados, que resultaram na recente dissidência do PMDB, liderada pelo líder na Câmara, Eduardo Cunha, personagem pelo qual Dilma nutre particular e notória aversão – que, diga-se, é recíproca.
A perda de apoio na base coincide com a difusão mais ampla dos escândalos da Petrobras, que pode desembocar numa CPI mista, desastrosa às suas pretensões reeletivas, para dizer o mínimo. O espírito autofágico da política induz parte dos aliados do PT – os que sonham com a volta de Lula – a torcer intimamente pelo colapso eleitoral da presidente.
Dilma, pois, está exposta ao fogo amigo, que frequentemente é mais impiedoso e destrutivo que o da oposição. Na melhor das hipóteses, a CPI joga ao lixo a imagem que lhe foi construída de gerentona; na pior, pode até lhe levar ao impeachment, o que, embora improvável, não é impossível. Sempre que se fala em CPI, tem-se em mente o axioma de que se sabe como começa, porém nunca como acaba.
Para agravar a circunstância da presidente, a economia vai mal. E economia, como se sabe, não é ciência exata. Reflete o ambiente psicossocial. Prova disso é que a queda da presidente nas pesquisas e a iminência da CPI da Petrobras, em vez de gerar pessimismo junto aos agentes econômicos, produziram o inverso. As ações da Petrobras, por exemplo, subiram.
Não há como dissociar essa mudança da expectativa que a crise criou de mudança a partir das eleições de outubro. Dilma deixou de ser vista como fatalidade eleitoral – e com ela a manutenção do status quo petista. E isso começa a ser celebrado em setores que até aqui deram sustentação pragmática ao petismo, sobretudo empresários do setor financeiro.
Como coroamento desse quadro, há o silêncio de Lula. A pergunta que não quer calar é: o que estará pensando disso tudo? É beneficiário da crise ou provável co-réu da CPI? Afinal, tudo se deu em seu governo. 2014 promete ser (já está sendo) um ano de muitas, muitas emoções.
Ruy Fabiano é jornalista.
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