Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, fevereiro 09, 2012

Mandem a conta para Lula- Carlos Alberto Sardenberg


O Globo - 09/02/2012

Há um interessante debate sobre a privatização dos aeroportos feita pelo governo Dilma, mas há também o entendimento de que a mudança é positiva.
E desde já, se a coisa funcionar mais ou menos, fica assim: o governo ganha dinheiro com os aeroportos, ao vender as concessões (R$ 26 bilhões numa tacada inicial!) e receber participação nos lucros e ainda consegue turbinar os investimentos nessa área crucial de infraestrutura.
Ou seja, se tivesse feito isso há mais tempo, o governo poderia ter utilizado em outros setores carentes, saúde, por exemplo, o dinheiro que gastou em aeroportos e o que teria recebido nas privatizações.
E o público estaria mais bem servido.
Por que não se fez antes? Porque o então presidente Lula não deixou.
A conversa sobre privatização dos aeroportos não é nova, sobretudo no mundo privado.
No governo FHC, tratouse disso no segundo mandato, quando o presidente já estava desgastado e privatizar era pior do que qualquer outra coisa.
Em suas duas campanhas vitoriosas, Lula voltou a demonizar a privatização, com tal força que os próprios tucanos fugiram dela como diabo da cruz.
Mas no segundo governo Lula, a partir de 2007, o tema voltou, quando a administração lidava com o caos aéreo que explodira no final de 2006.
Foi quando as autoridades finalmente admitiram que todo o sistema aéreo era, literalmente, uma permanente ameaça de desastre: recursos mal administrados; os aeroportos sem estrutura adequada; falta de pessoal especializado, como os controladores de tráfego aéreo; radares com zonas cegas; falhas nas comunicações via rádio.
Feitas as contas, estava na cara que os recursos necessários para atacar todos esses problemas estavam muito acima da capacidade do governo federal.
Conclusão óbvia: era preciso trazer dinheiro, empresas e gente nova para o setor.
Vender concessões era a óbvia saída.
Pelo menos três ministros do governo Lula disseram a este colunista que a privatização era inevitável.
A necessidade venceria as resistências ideológicas.
Modelos foram analisados pelos técnicos da administração federal, alguns chegaram a ser anunciados.
Por exemplo: em julho de 2007, o então ministro da Defesa, Nelson Jobim, deu prazo de 90 dias para que a Agência Nacional de Aviação Civil, Anac, e a Infraero apresentassem o projeto para o terceiro aeroporto de São Paulo.
Ficou pelo caminho.
A coisa simplesmente morreu, não se falou mais nisso.
Já havia então um projeto preparado por um grupo de empresas privadas para a construção desse aeroporto na região de Araucária.
Aliás, o projeto continua de pé, e voltou a ser lembrado agora que o governo fez três concessões privadas de aeroportos já existentes.
Por que não autorizar a construção de um outro, inteiramente e desde o início privado? Resumindo: a presidente Dilma e seu pessoal celebraram os leilões de Guarulhos, Viracopos e Brasília.
Disseram, corretamente, que se inicia uma nova era, com mais investimentos e mais eficiência.
Por que não fizeram antes se todos estavam no governo Lula? Porque Lula disse que tudo se resolveria com o PAC, no qual destinou uns R$ 5 bilhões à Infraero, para os 12 aeroportos da Copa.
Reparem como não fazia sentido além da propaganda.
Só para a privatização de Guarulhos, o governo exigiu da nova concessionária compromisso de investimentos de...
R$ 5 bilhões.
Para Brasília, mais de R$ 8 bilhões.
Resumo da ópera: Lula é responsável por um atraso de cinco anos nessa privatização.
GREVE DE POLICIAIS Tem ainda uma outra conta para o ex-presidente, a falta de legislação regulando greves de funcionários e de policiais, como essa que assombra a Bahia.
Entre o final de 2006 e o início de 2007, houve uma sequência de greves de servidores públicos da educação, previdência, meio ambiente e também da polícia.
O impacto foi tão negativo que até o presidente Lula reclamou.
Lembramse? Disse que funcionário público em greve parecia, na verdade, estar em férias, pois não tinha desconto dos dias parados.
Encarregou o então ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, de preparar um projeto regulamentando o tema.
O ministro chegou a anunciar os princípios da nova legislação.
Por exemplo: servidor armado não pode fazer greve; greves têm de ser aprovadas em assembleias com pelo menos dois terços da categoria (a greve dos PMs da Bahia seria ilegal nos dois quesitos); e servidor em greve não recebe salário.
Onde está o projeto? Sumiu.
Os sindicatos de funcionários não gostaram, Lula esqueceu.
É sempre difícil saber como as coisas teriam se passado se outras providências tivessem sido tomadas.
Mas o olhar em retrospectiva mostra, sim, o que deixou de ser feito.

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