Nos grandes hiatos históricos, como começam a parecer estes cem dias marcados pelo estilo Dilma Rousseff, vem implícita a recomendação de deixar transcorrer o tempo, sem perder de vista como tudo estará depois (no caso, o carnaval). A marchinha de Lamartine Babo adotou o carnaval como referência nacional, pois nele o Brasil, em homenagem a Cabral, dá uma freada de arrumação e só recomeça na data do descobrimento, “dois meses depois do carnaval”. Em seguida, Perí e Ceci se beijaram, ao som do Guarani (de Carlos Gomes), surgiu a feijoada e mais tarde o parati. Fórmula infalível.
O velho princípio que recomenda ficar como está, para ver o que acontece, não deixa de ser o fim de um modo de ver que se repete com pequenas variações. Cansou. Deixar como está é um círculo vicioso que leva de volta ao ponto de partida. Já está demonstrado que melhor não fica. De que adiantaria apelar para a fórmula segundo a qual, por falta de melhor, é deixar como está para ver? Não se verá nada de novo.
Esse velho modo de hesitar padece de vista cansada. Como também não é o caso de Lula se aplicar ao prelúdio da reforma política, com a qual não quis perder tempo quando era presidente. Na condição de ex, não mostra maior interesse, exceto se puder esbanjar presença no noticiário. Ele guarda mágoa de não ter sido considerado previamente e, para não ter de se explicar, espera uma boa oportunidade? Quem sabe uma contra-reforma?
Com o bom conceito que faz do seu período, Lula se põe à disposição das contradições. Claro que, para um ex-presidente, ser exceção entre os antecessores não deixa de destoar. Com as estridências do carnaval, as considerações preliminares a respeito da reforma política ainda não parecem suficientes para garantir sustentabilidade à iniciativa. Pela frente, além do que falta cumprir da cota dos cem dias, acrescentam-se os 40 da Quaresma e a semana santa. Assim, se a iniciativa não arrefecer, será pela interferência presidencial, que paira acima de qualquer suspeita em relação ao antecessor e ao passado.
O bloco da reforma política pondera que, depois do carnaval, será preciso lidar com negociações acumuladas por suspeitas republicanas. Por outro lado, se for para erradicar privilégios que indispõem os eleitores contra políticos em geral, os ameaçados farão corpo mole para começo de conversa. Em último caso, meia dúzia de boatos bem concatenados e encaminhados ao conhecimento público farão o serviço. A contra-reforma entrará em cena. Já constou que o presidente Lula estava de língua passada com as centrais sindicais para enrolar a reforma e intimidar os figurões.
Falta à proposta de reforma política, antes de tudo, participação popular. No entanto, participação popular em dose cavalar mais complica do que simplifica. Trata-se de escolher uma ou outra: reforma ou revolução, e não misturá-las, porque aí excederia o conceito de reforma e não chegaria a ser revolução.
Os porta-vozes da reforma política sabem que a idéia de reforma acumulou com a República uma dívida superior à capacidade de administrá-la. Para desencaminhar a reforma, nada mais indicado do que multiplicar as divergências e deixá-la de molho.
Para começar o novo ciclo, o ex-presidente começaria, discreta e pronominalmente, por personalizar o nome do bloco que se baseia em motor de automóvel que só pega com um bom empurrão: Empurra que pega passaria a Me empurra que pego, no finzinho do Leblon, onde a escultura de Zózimo Barroso do Amaral espera pela pracinha com seu nome. É verdade que Lula injetaria substância popular na reforma política. Mas quem se dispõe a amarrar o guizo no pescoço do gato desconfiado?
FONTE: JORNAL DO BRASIL
Entrevista:O Estado inteligente
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