09/09/10
Ao aparecer no programa eleitoral de Dilma Rousseff, na noite de terça, como se fizesse um pronunciamento oficial na condição de presidente da República, Lula apenas foi coerente com a postura que assumiu desde o momento em que resolveu eleger a sua pouco conhecida ministra-chefe da Casa Civil.
Sem se preocupar com limites legais, com nada, Lula tem sido um trator a serviço de Dilma, sem atentar para a confusão de papéis entre o chefe partidário e o representante do Poder Executivo.
Se o adversário José Serra se equivocou ao tentar cassar a candidatura de Dilma na Justiça eleitoral, devido ao já comprovado escândalo de invasão criminosa do sigilo fiscal de tucanos e da filha dele, Verônica, terça foi a vez de Lula extrapolar, ao exercitar no programa eleitoral uma velha tática petista: vitimizar-se, quando, na verdade, a vítima está do outro lado. Ou seja, o direito de reclamar é de Serra, da filha e demais tucanos cujos arquivos sob a guarda da Receita Federal foram violados, a partir da ação de pelo menos dois filiados ao PT.
O pronunciamento dissimulado e evasivo do presidente só fez aumentar o temor de quem é obrigado a ter sob a guarda do Estado dados pessoais, protegidos pela Constituição. Hoje se vê, uma proteção frágil, diante da atuação de aparelhos partidários e sindicais dentro da máquina burocrática, de que resulta o uso de instrumentos do Estado com fins políticos privados.
Sem falar, como admitiu o próprio ministro da Fazenda, Guido Mantega, chefe supremo da Receita, dos incontáveis vazamentos de informações dos computadores da repartição, onde, tudo leva a crer, funcionam balcões de venda de dados a quem interessar: empresas de mala-direta, assaltantes de residências, sequestradores etc. Infelizmente, prática que parece disseminada em vários órgãos públicos, como demonstra a facilidade com que se compra esse tipo de informações privadas nas ruas do Centro velho de São Paulo, conforme revelou reportagem do GLOBO.
Enquanto a Receita claramente retarda a sindicância interna, como deseja o PT, o presidente acusa os atingidos pela criminosa quebra de sigilo de partirem para a “baixaria” (!?).
O cidadão comum, portanto, tem toda razão em se sentir vulnerável, desprotegido, sem qualquer ajuda do Executivo.
Resta-lhe esperar pela atuação do Ministério Público — fortalecido pela Constituição de 1988 com a missão de estar ao lado da sociedade — e da Justiça.
O mesmo recurso da vitimização é aplicado quando a imprensa independente, profissional, chamada de “grande mídia”, divulga fatos objetivos contrários aos interesses do PT. Imediatamente, ela passa a ser acusada de “golpista”. Assim, o partido se converte em vítima de supostas tenebrosas conspirações, e se exime de explicar as malfeitorias.
Foi assim no mensalão, minimizado por Lula — o partido apenas copiara os demais ao comprar com dinheiro sujo apoio parlamentar —, sem impedir, no entanto, a cassação de José Dirceu e a abertura de um processo no STF contra a “organização criminosa”, chefiada, no entender da Procuradoria Geral da República, pelo próprio titular da Casa Civil de Lula. Agora, o partido e sua candidata são vítimas de quem se indigna por ter informações privadas surrupiadas por iniciativa de filiados ao PT. É demais.
Artifício é aplicado para evitar explicação dos desvios
Entrevista:O Estado inteligente
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