O ESTADO DE SÃO PAULO - 0703/10
O presidente Luiz Inácio da Silva já sabe como tirar o deputado Ciro Gomes do caminho de sua candidata a presidente, Dilma Rousseff, mas o PT ainda não descobriu como se livrar da possibilidade de ter Ciro como candidato ao governo de São Paulo.
Não por implicância ou mal querer, mas por um misto de autoestima e instinto de sobrevivência. O sentimento é mais agudo, claro, entre os petistas de São Paulo.
Na última vez em que estiveram reunidos com o deputado do PSB, em 24 de fevereiro, dirigentes do PT paulista receberam-no com todas as honras. Ciro ouviu os elogios, agradeceu muito e disse que continuava candidato a presidente.
Em seguida enumerou suas qualidades como candidato, discorreu sobre sua aptidão para tocar o barco do Brasil, admitiu disputar o governo de São Paulo "se nosso comandante quiser" e deixou nos presentes a nítida impressão de que a escolha de Lula se deve à inexistência de nome melhor no PT para concorrer.
Humilhados, mas obedientes às ordens do chefe, os petistas fizeram-se de desentendidos. Inclusive porque, ao final, metade havia entendido que Ciro será candidato a presidente e metade tinha certeza de que ele será candidato a governador.
Internamente o PT torce para que não seja nenhum dos dois. Em relação a Dilma, o temor ? e verdadeira razão pela qual Lula o convenceu a mudar o domicílio eleitoral do Ceará para São Paulo ? vai além dos pontos porcentuais que o deputado pode tirar da candidata nas pesquisas.
Trabalha-se no mundo petista com a hipótese nada remota de que Ciro acabe por ajudar a oposição.
Pelo seguinte: como é candidato da ala governista, vai disputar espaço com Dilma para se consolidar como o candidato preferido pelo eleitorado de Lula.
Acredita-se que ele acabe por bater em Dilma ? preservando Lula, óbvio ? com base na conversa do próprio Ciro, que não esconde que se considera muito mais qualificado que ela para a tarefa de representar a continuidade do atual governo.
Mas não é só o jeito de Ciro Gomes o que deixa o PT paulista bem ressabiado. É a falta de discurso adequado e convincente para apresentá-lo ao eleitorado de um Estado onde o partido é hoje a segunda força política depois do PSDB e seria a principal alternativa para quando e se o paulista resolver quebrar a hegemonia tucana.
São os seguintes os números do PT de São Paulo em matéria de eleição para governador: em 1994 o partido obteve entre 14% e 16% dos votos, com José Dirceu; em 1998 foi para 21% com Marta Suplicy; fez 28% dos votos em 2002 com José Genoino e em 2006 alcançou 32% com Aloísio Mercadante. Isso apesar do escândalo dos "aloprados".
Como tem repetido Ciro Gomes para sustentar que o melhor para o PSB é tê-lo como candidato a presidente, "time que não joga não forma torcida".
Pois é exatamente o que argumenta o PT em suas lamentações sobre a prioridade absoluta que o presidente dá à eleição presidencial em detrimento da disputa de São Paulo: a candidatura de Ciro pode, na visão dos petistas, travar o crescimento do partido no Estado.
O presidente Lula, dizem, não leva em conta as dificuldades regionais.
A possibilidade de o PT ficar no mesmo lugar se não tiver candidato é o melhor cenário, porque as projeções apontam para perda de bancadas na Assembleia Legislativa e no Congresso.
Queixas à parte, sentimentos de humilhação também, o PT nem de longe cogita se rebelar contra decisões de Lula. Obedecerá pelo mais objetivo dos motivos: medo e reverência aos 80% de popularidade.
"Se nem os adversários enfrentam o Lula, nós mesmos é que não vamos contestar", diz um petista com assento na direção estadual.
Resta ao partido aguardar. E pelo que disse Ciro Gomes na última reunião, a espera vai até depois do dia 2 de abril. Só a partir daí ele decidirá se mantém a candidatura presidencial ou vira candidato a governador.
Há uma reunião entre ele e Lula marcada para o próximo dia 15, mas o PT aposta que dela não sairá decisão alguma, porque Ciro dirá que precisa ter as cartas do processo todas na mesa para poder se decidir.
Uma antecipação da cena feita por ele aos dirigentes petistas na reunião de 10 dias atrás dava conta de uma mudança radical no panorama.
Ciro disse ao PT que o governador José Serra não será candidato a presidente, que o governador Aécio Neves entrará no lugar e que isso vai obrigar o PT a mudar toda sua estratégia eleitoral. Isso foi antes da última pesquisa mostrando um quase empate entre Serra e Dilma.
Ainda assim, ficou entre os participantes daquele encontro a sensação de que Ciro Gomes nutria, ou nutre, a esperança de vir a ser o ungido por Lula na hipótese da virada.
Com todo o respeito devido pelos petistas a Ciro, tida como delirante.
Entrevista:O Estado inteligente
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