O ESTADO DE SÃO PAULO - 07/03/10
O mundo virtual do jogo de perde e ganha do mercado financeiro é muito diferente do mundo real do desenvolvimento econômico, da produção, do trabalho e do emprego. O primeiro é privativo de poucos - são os mais ricos, com dinheiro sobrando para arriscar apostas em ativos financeiros e com elas multiplicar sua renda. É dinheiro gerando dinheiro para quem já tem dinheiro. O segundo é real, concreto, vivido no cotidiano pelo homem comum, abrange ricos, pobres, a população inteira de um país, e seu bom ou seu mau desempenho trazem conforto ou privações, felicidade ou tristeza, bem-estar ou sofrimento, agem sobre o presente e determinam o futuro das pessoas.
O governo de um país precisa se preocupar com os dois. Afinal, se o mercado financeiro desaba, desencadeia efeitos perversos em toda a economia. Foi assim na recente crise global: a falência de grandes bancos levou destruição ao mundo real, fez ruir a produção, espalhou desemprego, disseminou a pobreza. Grécia e Espanha são as mais recentes vítimas.
Foi também o que ocorreu no Brasil em 2002, quando a chance de vitória eleitoral de Lula causou pânico no mercado financeiro. Seus agentes aproveitaram para especular e ganhar dinheiro, o dólar e o risco Brasil foram à lua e os estragos acabaram chegando à vida real dos brasileiros no ano seguinte, com recessão econômica, desemprego, pobreza e sofrimento. Portanto, são dois mundos interligados, mas distintos. Uma crise no primeiro mostra suas garras mais tarde no segundo.
Neste momento o Brasil vive um clima de euforia no mundo virtual, acompanhado de expansão da produção e do emprego, mas visto com relativa insegurança e desconfiança pelos investidores do mundo real. Ou seja, a euforia no ingresso de capitais estrangeiros para aplicação na Bovespa, renda fixa e outros ativos financeiros não se repete na entrada para aplicação em investimento direto produtivo.
O mesmo se dá com investidores nacionais, que olham o futuro com desconfiança, seja por insegurança em relação à garantia de continuidade de crescimento em 2011, seja porque preferem esperar o resultado das eleições para voltar a investir.
Os números do Produto Interno Bruto (PIB) apurados pelo IBGE no trimestre abril-junho de 2009 mostram que o Brasil saiu da crise, mas o investimento produtivo patina, não deslancha. No terceiro trimestre a taxa de investimento voltou a cair para 17,7% do PIB, bem abaixo dos 20,1% apurados no mesmo período de 2008. Na próxima quinta-feira o IBGE vai divulgar o PIB do ano fechado de 2009, e não há expectativa de mudança significativa.
Outro dado a confirmar esse diagnóstico: pesquisa da Organização das Nações Unidas (ONU) constata que em 2009 a queda do investimento estrangeiro no Brasil (49%) superou a média mundial (39%). Entre os quatro Brics (grupo formado por Brasil, Índia, China e Rússia), nosso país foi o que recebeu menor volume de investimento estrangeiro direto.
É preocupante a trajetória do déficit externo: importações em alta, exportações em queda, ingresso limitado de investimento direto e dependente de capital volátil para compensá-lo. A Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex) estima que o superávit comercial em 2010 cairá para US$ 8 bilhões, menos da metade do ano anterior. Segundo o Banco Central, em fevereiro o fluxo cambial (saldo entre ingresso e saída de dinheiro do País) foi negativo em US$ 399 milhões, interrompendo 11 meses seguidos de resultados positivos.
É verdade que o elevado nível das reservas cambiais (US$ 240 bilhões) protege o País do risco de crise cambial. Mas não evita outros problemas. O sinal de alerta já começa a ser disparado por analistas internacionais para investidores financeiros. A consultoria do economista Nouriel Roubini (conhecido como o Doutor Apocalipse por ter antevisto a crise global) elevou sua previsão para o déficit externo do Brasil de 1,55% para 3,1% do PIB. "Não há risco de problemas no balanço de pagamentos, mas a economia brasileira vai ficar muito mais sensível às condições de financiamento externo e ao apetite por risco global", afirmou Bertrand Delgado, economista-chefe da América Latina da empresa de Roubini. Ou seja, mesmo no mundo financeiro começa a ficar abalada a imagem de "queridinho" que o Brasil conquistou em 2009.
E no mundo da economia real o recuo e a indefinição sobre novos investimentos prejudicam a expansão da produção, e o crescimento de 5%, 6% em 2010 vai pressionar a inflação e gerar problemas adiante. Não para Lula, mas para o novo presidente que assumir.
Suely Caldas, jornalista, é professora de Comunicação da PUC-Rio (sucaldas@terra.com.br)
Entrevista:O Estado inteligente
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