O ESTADO DE SÃO PAULO - 19 de março de 2010
À falta de melhor, o presidente Lula usou uma palavra - "mágica" - que resume a futilidade e a inconsequência das suas pretensões de mediar o conflito entre israelenses e palestinos. Numa entrevista em Ramallah, sede do governo da Autoridade Palestina (AP), ele afirmou que o presente atrito entre Israel e os Estados Unidos, "que parecia impossível de ocorrer", quem sabe seja "a coisa mágica que faltava" para se chegar a um acordo de paz na região. A isso se chama "pensamento mágico" ? a crença numa relação de causa e efeito entre acontecimentos que nada têm em comum, ou no poder de transformar os fatos pela mera expressão de uma vontade.
O governo americano, como se sabe, reagiu com excepcional dureza à provocação israelense de anunciar, em plena visita do vice-presidente Joe Biden, a construção de 1.600 moradias em Jerusalém Oriental, onde os palestinos querem instalar a capital do Estado a que aspiram. Considerado por Washington um "insulto" e uma "afronta", o ato escancarou o desinteresse do governo ultranacionalista do primeiro-ministro Binyamin Netanyahu pelas iniciativas do presidente Barack Obama para reabrir as negociações entre as partes, congeladas desde a ofensiva israelense na Faixa de Gaza, controlada pelos extremistas do Hamas, em fins de 2008.
A realidade é que Israel deu as costas ao projeto de paz baseado na coexistência de dois Estados. Daí a expansão dos assentamentos na Cisjordânia que a direita israelense denomina, significativamente, Judeia e Samaria. Mas a correlação de forças em Washington e a escassa simpatia dos israelenses por Obama tornam improvável, até onde a vista alcança, que ele reúna os meios de pressionar Israel ? destinatário de US$ 28,9 bilhões de ajuda americana na última década ? a ponto de produzir a mágica dos devaneios de Lula. Ou da sua frustração com o previsível fracasso de seus planos de ser acolhido por árabes e judeus como o arquiteto da paz entre eles.
Nisso consistiu, por assim dizer, a sua mágica. Ele conseguiu ser criticado dos dois lados do muro que separa Israel e os territórios palestinos por sua aproximação com o Irã e pelo disparate de incluir a República Islâmica entre os países interessados na solução pacífica do problema israelense-palestino. No Parlamento de Israel, Lula ouviu de governistas e oposicionistas críticas contundentes à ideia de que o presidente Mahmoud Ahmadinejad, que prega a destruição do Estado judeu, possa ser induzido a desempenhar um papel construtivo no Oriente Médio. Nenhuma surpresa até aí. Se alguma unanimidade existe em Israel, é a de que Teerã representa uma "ameaça existencial".
Desmoralizadora mesmo foi a reação palestina ao oferecimento de Lula de ajudar a fazer as pazes ? eventualmente em território brasileiro ? entre o movimento secular Fatah, cujos quadros formam o governo da Autoridade Palestina, e o Hamas fundamentalista, que os expulsou a bala de Gaza. Diante do presidente Mahmoud Abbas, Lula soltou o verbo. Pôs-se a ensinar ao interlocutor, como se disso ele não soubesse, que os palestinos precisam falar com uma só voz na mesa de negociação, do contrário "vão continuar a ser um povo sem fronteiras, e Israel continuará a se sentir ameaçado". Seria mais apropriado, respondeu-lhe o paciente Abbas, se Lula dissesse a Ahmadinejad que o apoio iraniano ao Hamas é o maior obstáculo à unidade palestina.
Abbas insistiu nesse ponto na entrevista que concedeu à enviada especial do Estado, Denise Chrispim Marins, publicada na edição de ontem. "Atores influentes da região", declarou, "dificultam a reconciliação nacional, particularmente o Irã, que não se mostra interessado no diálogo palestino com base numa agenda palestina." Ele confirmou ter pedido a Lula "que inclua o tema palestino no seu diálogo com o Irã". Para quem foi recebido calorosamente pelos palestinos, o descontentamento de Abbas deveria instilar um mínimo de sobriedade no desvario da diplomacia lulista. Uma coisa é o Brasil fazer-se ouvir em defesa da paz e segurança para israelenses e palestinos, outra é se fazer de protagonista central nesse processo ? e ainda por cima cortejar um governo que busca exatamente o oposto.
Entrevista:O Estado inteligente
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