O ESTADO DE S. PAULO e Democracia Política e novo Reformismo
Nos últimos dias o presidente Lula declarou seu apoio incondicional e elogiou o presidente do Senado, José Sarney, chamando-o de "pessoa especial". Na quarta-feira, em Alagoas, abraçou Fernando Collor e agradeceu a ele e ao senador Renan Calheiros o apoio ao seu governo.
Nenhuma manifestação da outrora aguerrida, combativa e irreverente União Nacional dos Estudantes (UNE), que há 17 anos comandou os caras-pintadas pelas ruas do País, protestando contra a corrupção no governo e pedindo o impeachment de Collor. No governo Lula a UNE calou diante do mensalão e de tantos outros atos de corrupção, chegou a defender Calheiros no episódio da pensão paga por uma empreiteira a sua ex-namorada, paralisou diante dos inúmeros escândalos envolvendo Sarney e família e silenciou ante a imagem do efusivo abraço entre Lula e Collor.
Afinal, o que aconteceu com a UNE e os estudantes?
Na quinta-feira a direção da UNE recebeu Lula como principal orador da abertura de seu 51º Congresso Nacional. O presidente lembrou de seus idos de sindicalista radical e disse ter passado o tempo em que "encostar-se no governo significava cooptação". A UNE não encostou, grudou no governo Lula. Tem recebido generosidades e retribuído com aplausos, adesão e apoio político, mesmo quando Lula perdoa corruptos e diz que assina um cheque em branco para o ex-deputado cassado Roberto Jefferson. Não é cooptação? Vamos aos fatos. Em 2004 o governo repassou R$ 199 mil de verbas federais para a UNE e, a partir de 2005, mais R$ 10 milhões - dos quais R$ 7 milhões entre janeiro de 2008 e fevereiro de 2009. Além disso, a Petrobrás, com R$ 100 mil, e a Caixa Econômica Federal, com R$ 30 mil, patrocinaram a Bienal da Cultura da UNE, em Salvador, que ainda levou R$ 2,5 milhões dos cofres públicos.
"Nos anos de Fernando Henrique tínhamos muitas dificuldades de diálogo", explicou a presidente da UNE, Lúcia Stumpf, em entrevista publicada no Estadão em 5 de março, ao comparar a relação da entidade com os dois governos.
Além dos R$ 10 milhões, Lula e as estatais doaram para esse 51º Congresso mais R$ 920 mil, dos quais a Petrobrás - com sua esquisita e sem critérios política de patrocínios - participou com R$ 100 mil. Agradecida, a direção da UNE tratou de retribuir: saiu em defesa da estatal e condenou a investigação, pela CPI, de suspeita de desvios de dinheiro na Petrobrás. Condenar a apuração de fraudes com dinheiro público é algo inédito na história da UNE (como diria Lula, nunca antes neste país) que contribui para afastar cada vez mais os estudantes que deveria representar.
Com a popularidade pessoal em alta, Lula extrapola ao sair por aí vinculando sua imagem ao que há de mais atrasado no País, elogiando as oligarquias que ele tanto combateu e denunciou, abraçando Collor e ignorando o movimento que se espalhou pelo País pedindo seu impeachment, humilhando os senadores do PT ao obrigá-los a defender Sarney e assumirem o papel de coniventes com os escândalos de que o senador é acusado. Para Lula tudo vale para atrair o que há de pior no PMDB e garantir seu projeto de eleger Dilma Rousseff e continuar no poder. Os senadores petistas até pararam de justificar a defesa de Sarney com o argumento da governabilidade. Diante da enxurrada de denúncias indefensáveis o argumento se esvai. Afinal, complacência com o desvio de dinheiro público não pode servir de apoio a nenhuma governabilidade.
Lula arrisca perder popularidade política, mas se acontecer ele recua rapidinho. A UNE é que corre riscos mais graves. Sua imagem, hoje, entre os estudantes é de uma entidade pelega, financiada e dependente do governo Lula, que ignora as carências estudantis e, quando se envolve na luta política do País, escolhe o lado errado, da corrupção, dos oligarcas que exploram o Estado há décadas. No auge da pressão popular para tirar Renan Calheiros da presidência do Senado os universitários do Rio de Janeiro organizaram uma passeata. Não tiveram o apoio e ainda foram reprovados pela UNE, que saiu em defesa de Calheiros.
Sem lideranças respeitadas e reconhecidas, os estudantes tendem a não se interessar e fugir da luta política numa fase da vida em que a contestação é útil para a formação e a inserção do jovem na sociedade no futuro. Mas esse é o jeito Lula de governar. Ele, que tanto combateu o peleguismo no passado, hoje usa o dinheiro público para comprar o apoio de parlamentares (o mensalão, as emendas), de sindicalistas (as centrais sindicais acabam de ser contempladas) e da UNE.
Entrevista:O Estado inteligente
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