Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, julho 29, 2009

PAULO RABELLO DE CASTRO O novo cenário WWW

FOLHA DE S PAULO


Marolas sucessivas surgem da superonda do crédito chinês, capaz de produzir minibolhas dos EUA ao Brasil

UMA DAS linguagens mais bem-sucedidas na interpretação da evolução da crise global é a simbologia do "alfabeto da recuperação econômica". Sabemos que a retomada não aconteceu em V, passando rapidamente do mergulho na crise para o rebrote da primavera, como se chegou a anunciar em março, na entrada da nova estação no hemisfério Norte. Tampouco parecemos condenados ao colapso em L, ou seja, cair e ficar no fundo do poço por um longo período. Então, tudo indica que nossa sorte é na forma de U, com direito à estagnação um pouco mais demorada, antes da brotação da primavera econômica.
Pessoalmente, gosto mais da letra W. Além de mais complexa, traduz melhor o jeito ciclotímico do mundo em que vivemos. Pelas manchetes recentes, a crise acabou, principalmente no Brasil. Os propagandistas da recuperação a galope saíram de suas tocas hibernais. E não falta noticiário positivo, na China, na Índia e, especialmente, no Brasil, que deixou de ser o campeão mundial do juro básico (não deixou de sê-lo no juro bancário!) para oferecer o primeiro lugar a Pequim. Os efeitos da recuperação da crise são especialmente fortes no Brasil pelo efeito conjugado do juro básico em queda com a apreciação significativa do real.
Nossa moeda, pelo índice do Big Mac, ficou mais valorizada que o dólar e supera todas as moedas emergentes em apreciação relativa. Ponha na lista a China, a Rússia, o México, a Argentina e, é claro, a maioria dos países europeus. Tal valorização do real produz efeitos imediatos altamente reconfortantes em termos de manutenção de poder de compra da população e também faz muito bem à saúde política do governo, mesmo enfrentando escândalos espantosos em sua base aliada.
Os sinais mais claros dessa onda de bem-estar e otimismo vêm -não por acaso- das Bolsas e dos mercados de commodities.
Desde o fundo de poço, a cotação do petróleo já subiu quase 100%. E a corretora norte-americana Goldman Sachs acha que o óleo ainda está barato, conforme seu último boletim divulgado aos clientes. Aliás, essa sensação é generalizada: quase todas as commodities agrícolas e minerais estariam em ponto de compra, segundo aquela fonte. Não espanta que um passageiro conversador de ponte aérea me tenha confidenciado, com a espontaneidade dos crentes, que a nossa Bolsa de Valores haverá de chegar aos 100 mil pontos até dezembro. Está por volta de 54 mil e já subiu 45%.
Os otimistas não deixam de ter sua razão. Estamos embarcados numa superonda mundial de expansão monetária e de crédito, criada pelos governos do mundo justamente para não deixar fenecer o entusiasmo do mundo da bolha.
Os chineses, por exemplo, expandirão o crédito local em 40% do PIB neste ano, cerca de US$ 1,5 trilhão.
Equivale a três vezes o crédito brasileiro total em reais, em números absolutos. A potência anabolizante dessa gigantesca injeção de recursos foi capaz de produzir os 8% de crescimento chinês em 2009 e certamente ajudou o governo brasileiro a baixar juros e apreciar o real. Fecharemos o ano de 2009 com o PIB em território positivo.
Se essa política é financeiramente sustentável, é perguntar demais. O máximo que se pode dizer, com certeza provisória, é que a superonda do crédito chinês hoje produz minibolhas para todos os lados, nos EUA, na Ásia e no Brasil.
É um cenário de marolas sucessivas. Lula, nosso pressagiador, estava correto. Estamos mais para um WWW, um cenário de internet, no alfabeto moderno da crise.

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