O Estado de S. Paulo - 03/07/2009 |
Ontem foi a vez do presidente do Banco Central Europeu, Jean-Claude Trichet, tentar aplacar temores de que a inflação possa voltar a galope na zona do euro. Após a decisão sobre os juros (que foram mantidos em 1% ao ano), tomada ontem, Trichet deu sua costumeira entrevista. E, apesar da expressiva queda da inflação (de 0,1% em junho), explicou que, na hora apropriada, os grandes bancos centrais estarão provendo o enxugamento ordenado da enorme liquidez que inunda hoje os mercados. Dia 3 de junho fora a vez de Ben Bernanke, o presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), de assegurar em depoimento dado no Congresso americano de que "o Fed não está monetizando a dívida do Tesouro americano". Há meses, chefes de Estado e analistas de prestígio vêm denunciando o enorme potencial inflacionário do despejo de ao menos US$ 18 trilhões pelos bancos e pelos Tesouros dos países centrais (dados da ONU). Um dos dados mais preocupantes que pipocam nos computadores dos analistas é a rápida elevação do rendimento (yield) dos títulos públicos de longo prazo nos Estados Unidos. Nos últimos seis meses, por exemplo, o rendimento dos títulos de dez anos do Tesouro americano aumentaram de 2,23% ao ano registrados ao final de dezembro para 3,52% ao final de junho. Em março, o Fed decidira recomprar US$ 300 bilhões desses títulos e outro US$ 1 trilhão em ativos amarrados a hipotecas, com objetivo de neutralizar essa alta. O principal problema do momento é o de que uma esticada do rendimento dos títulos de longo prazo tende a ser repassada para os juros cobrados nos contratos habitacionais (hipotecas) e afundar ainda mais os preços dos imóveis. Essa alta dos rendimentos reflete certa rejeição dos ativos públicos, fato que derruba seus preços de revenda no mercado. A queda do seu preço, ou seja, a necessidade de gastar menos dólares para tê-los em carteira, aumenta a proporção dos juros previstos em contrato em relação ao capital investido. Duas são as explicações para essa alta da remuneração dos títulos de longo prazo. A primeira é a de que os investidores estão prevendo uma inflação futura em proporção tal que desvalorize em termos reais o retorno dos títulos de dívida. A alta bem menos acentuada dos títulos com correção pela inflação parece reforçar essa hipótese. A segunda é a de que os investidores estejam prevendo enorme despejo de títulos públicos nos próximos dez anos destinado a financiar o déficit orçamentário dos Estados Unidos (previsto em quase US$ 2 trilhões por ano), em volume superior à demanda que possa haver nesse período. Apesar das reiteradas declarações de cunho tranquilizador passadas por Bernanke e por Trichet, o mercado não parece seguro, aparentemente porque não entendeu ainda como será possível retirar tantos trilhões de dólares no mercado sem provocar novo colapso no crédito ou outros solavancos no mercado financeiro global. E há, também, a questão da coordenação dessa operação. A derrubada da atividade econômica está bem mais acentuada na Europa do que nos Estados Unidos. E a situação dos bancos europeus, que enfrentam forte calote, também está mais complicada. Confira Ladrão do século - A imprensa europeia insiste em chamar de "ladrão do século" a Ronald Biggs, famoso por ter assaltado em agosto de 1963 o trem pagador de Glasgow, Inglaterra. Ele conseguiu levar o equivalente hoje a US$ 4,2 milhões. Comparado aos deste século, Biggs é um ladrão de galinhas. Bernard Madoff, por exemplo, sumiu com nada menos que US$ 65 bilhões. E Allen Stanford, com US$ 7 bilhões. Biggs alardeava que ele e os 14 que assaltaram o trem não dispararam um único tiro. Madoff e Stanford nem arma carregavam. Fizeram quase tudo só com cliques de computador. |
Entrevista:O Estado inteligente
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