Entrevista:O Estado inteligente

sábado, março 28, 2009

Diogo Mainardi O elogio do atraso


"Nossa maior glória, de acordo com a reportagem da revista The Economist, foi ter permanecido lá atrás.
No estatismo. No assistencialismo. No empreguismo.
Na agiotagem. Nas negociatas"

O elogio do atraso. Quanto mais atrasado, melhor. Há algumas semanas, a revista The Economist analisou o atual estado da economia brasileira. Nossa maior glória, de acordo com a reportagem, foi ter permanecido lá atrás. No estatismo. No assistencialismo. No empreguismo. Na agiotagem. Nas negociatas patrimonialistas do BNDES. Agora tudo isso poderá nos proteger do rombo da economia mundial, causado por aquela "gente branca, loira e de olhos azuis", segundo Lula.

A reportagem da The Economist é ilustrada com a imagem de um homem de bermuda, tirando uma soneca num muro de pedra, diante de uma igreja. Os historiadores sempre associaram nosso atraso ao catolicismo ibérico. Como nosso trunfo é o atraso, a gente tem de ir mais à igreja. A gente tem de resgatar o Tribunal do Santo Ofício. A gente tem de dormir mais. Nosso lugar, como o de Macunaíma, é numa aldeia à margem do Uraricoera. The Economist recuperou o mito modernista do herói indolente e sem caráter, celebrando Mário de Andrade com oitenta anos de atraso. Quanto mais atrasado, melhor. Especialmente no caso de Mário de Andrade.

Coreia, Coreia, Coreia. Nos últimos anos, aconselharam-nos sem parar a imitar a Coreia. Que pegou um monte de dinheiro e o despejou todinho na escola. O único caminho para o progresso, repetia-se tediosamente, era o estudo. Os coreanos fizeram isso mesmo: estudaram. Deu certo por algum tempo. Até a economia mundial desabar. Quando desabou, a da Coreia desabou mais ainda. E o modelo brasileiro, baseado no torpor físico e moral, passou a ser comemorado nas páginas da The Economist. Quem mandou estudar tanto? A Coreia, hoje, tem uma indústria de ponta que compete com a dos países mais ricos, com produtos que ninguém se interessa em comprar. A gente, muito mais folgadamente, recolhe farelo de soja e minério de ferro e sai arrecadando uns trocados por aí. Conselho: estude menos e durma mais.

Há outras áreas em que o imobilismo e o atraso podem nos beneficiar. Neste período de empobrecimento generalizado, em que há maior chance de tumulto social, ter um povo domesticado e acovardado, como o nosso, representa uma grande vantagem. Outra área da qual temos de tirar proveito é o ambiente. Os Estados Unidos se preparam para torrar 150 bilhões de dólares em energia limpa e ineficaz, num prazo de dez anos. Ao mesmo tempo, planejam aumentar todos os impostos sobre as fontes de energia mais poluentes e eficazes. Nós, por outro lado, continuaremos a produzir como sempre fizemos, de maneira porca e barata: ateando fogo no mato e soltando o gado.

Daqui a dez anos, se a economia mundial continuar a se atrofiar, estaremos ainda melhor, colhendo os frutos de nosso atraso. The Economist dedicará mais uma página ao Brasil, numa reportagem altamente elogiosa a respeito de nossas queimadas, ilustrada com a imagem de um homem de bermuda, tirando uma soneca num muro de pedra, diante de uma igreja. E com enfisema pulmonar.

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