São eles, os senadores, que dizem: as desventuras que desabam em série sobre a Casa têm origem nas sequelas da disputa entre PT e PMDB pela presidência do Senado. Os correligionários da candidatura Tião Viana, inconformados com a derrota e decididos a atazanar a vida de José Sarney e companhia até, quem sabe, o desgaste fatal, seriam, na versão dos adversários, os sujeitos ocultos por trás das denúncias das irregularidades administrativas do Senado.
Explícito, Viana dispensou intermediários: responsabilizou direta e pessoalmente Sarney pela divulgação da informação de que tentara espetar na conta do respeitável público a fatura do telefone celular funcional usado pela filha em viagem ao México.
Consta que Viana estaria disposto a contar muito mais sobre o grupo oponente, que, em retaliação, prometia revelar detalhes sobre a participação do senador petista no episódio da quebra de sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa, testemunha ocular das andanças do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci na casa de lobby montada pela chamada República de Ribeirão Preto em Brasília.
Um charivari de proporções amazônicas. Potencialmente só comparado em impacto a outro tumulto entre parceiros de coalizão governista: aquele que fez o então deputado Roberto Jefferson, presidente do PTB, denunciar o mensalão para se vingar do PT, que, afirmou Jefferson, na figura do à época ministro da Casa Civil José Dirceu, tentava atribuir aos petebistas toda a culpa pelo esquema de corrupção operado a partir do loteamento partidário dos Correios.
O estrago quase custa ao presidente Luiz Inácio da Silva a reeleição. Não fosse o então ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos sair a campo levando a oposição a pesar, medir e concluir pela impropriedade política de um pedido de impeachment, Lula poderia ter aberto mão do segundo mandato.
Depois de tão traumática experiência, natural que ao Palácio do Planalto não apeteça correr novos riscos por causa de desavenças em sua base parlamentar. Enquanto as disputas de poder não produzem consequências para além das fronteiras do Congresso Nacional, tudo é suportável.
Enquanto as denúncias de irregularidades ficam circunscritas ao terreno do Parlamento, o Palácio assiste de camarote ao aprofundamento da desmoralização sem grandes desconfortos. Antes uma boa crise na política que um desagradável debate na economia em tempos de crise.
Mas, quando as coisas começam a tomar o rumo do imponderável, aí a situação requer providências.
Depois de 15 dias de intenso tiroteio, entrou em ação a turma do deixa-disso. O ministro das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, e o senador Aloizio Mercadante começaram a “negociar uma trégua” entre PT e PMDB, o senador Tião Viana subiu à tribuna exclusivamente para se defender, não repetiu as acusações do dia anterior e criticou a “onda de denúncias”.
Se a esses movimentos se seguir a estiagem nas revelações, estará comprovado não só que foram produtos de encomendas, mas que os contendores se acertaram em nome de um objetivo comum: impedir que haja desdobramentos e, de preferência, que nada se altere substancialmente.
Evidente, alguma coisa mudará. Serão extintas as diretorias mais absurdas, os funcionários passarão a ter suas entradas e saídas controladas por meio de ponto eletrônico, as barbaridades sofrerão os efeitos de um freio de arrumação.
Vantagem nenhuma, mérito algum, apenas um roçar de leve naquilo que seria mera obrigação: a administração, senão austera – seria pedir demais – pelo menos razoavelmente correta do Congresso Nacional. O chumbo trocado entre PT e PMDB não doerá de imediato na pele de nenhum dos dois. Também impedirá o “constrangimento geral” invocado pelo senador Heráclito Fortes como algo a ser evitado.
Mas a conta do abafa fica em aberto para, mais adiante, voltar a ser cobrada na forma de novos escândalos na vulnerável instituição do Parlamento.
Face oculta
Os publicitários responsáveis pela propaganda institucional do PMDB alegam que o partido não exibe seus políticos nas peças por objeção ao “culto à personalidade”. Na verdade, é por falta de personalidades que possam ser cultuadas. Como os de boa fama e imagem razoável constituem exceção no PMDB e, em geral, são dissidentes, optou-se por não mostrar ninguém.
Símbolo
O deputado Edmar Moreira reapareceu no Congresso mudo, escondendo-se atrás dos seguranças.
Muito diferente do ser desenvolto que durante a primeira entrevista do recém-eleito presidente da Câmara, Michel Temer, exigiu do locutor o registro de sua presença no recinto, aproveitando o ensejo para defender a já notória tese do “vício insanável da amizade”.