Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, abril 19, 2011

Como se faz oposição : Rodrigo Constantino

O Globo - 19/04/2011


A oposição brasileira finalmente esboça alguma reação, ainda que
bastante atrasada. O senador Aécio Neves fez um discurso mais duro no
Senado, atacando os abusos do governo atual. E o ex-presidente FHC
escreveu um artigo propondo mais foco da oposição, que deveria,
segundo ele, aproximar-se da classe média, hoje abandonada pelo
governo. Ainda que iniciativas louváveis, estas são reações muito
tímidas.

Os políticos que discordam dos rumos atuais do país deveriam aprender
com o jovem americano Paul Ryan, do Partido Republicano. Responsável
por apresentar um orçamento alternativo ao Congresso, Ryan teve a
coragem de enfrentar os verdadeiros problemas do país e colocar o dedo
na ferida. Seu plano fiscal, chamado "O caminho para a prosperidade",
apresenta uma visão bastante diferente do futuro da nação americana e
do papel do governo.

Deixando o excessivo pragmatismo de lado, Paul Ryan pretendeu resgatar
valores hoje perdidos naquela que já foi a "terra da liberdade". Seu
objetivo é limitar novamente as funções do governo àquilo prescrito na
Constituição. A igualdade perante as leis, por exemplo, voltaria a ser
um princípio básico respeitado pelo governo, que atualmente vem
concentrando poder arbitrário e exagerado. Ryan compartilha do ideal
dos "pais fundadores" dos Estados Unidos, que defendiam um país com
ampla liberdade individual, meritocracia e governo limitado.

Além disso, ele apresentou propostas concretas para a redução drástica
do déficit público. O governo americano tem sido irresponsável há
anos, gastando mais do que arrecada. As guerras mundo afora, os
resgates bilionários de empresas e bancos falidos, estímulos
keynesianos e um estado de bem-estar social cada vez mais inchado
comprometeram as finanças públicas do país. O déficit fiscal este ano
será novamente superior a US$1 trilhão.

Não obstante, o presidente Obama, com tom extremamente populista,
defende um governo ainda mais ativo. O governo pretende criar uma
espécie de SUS no país, como se isso fosse realmente desejável para os
mais pobres. A grande bandeira política de Obama foi sua reforma do
sistema de saúde pública. Os crescentes rombos fiscais, cujos maiores
drenos são justamente os gastos com saúde e previdência, parecem não
incomodar os democratas no poder. Sua visão de nação reflete uma fé
inabalável na capacidade de o governo prover bons serviços a preços
baixos, o que a história sempre demonstrou ser uma grande ingenuidade.

Paul Ryan apresentou uma visão alternativa, onde indivíduos decidem
como gastar seu próprio dinheiro, sem a tutela ineficiente do governo.
Seu plano prevê um código tributário mais simples e menores impostos
em relação ao que os democratas desejam. Com o foco no longo prazo,
Ryan mostrou que há a necessidade de escolha entre dois futuros muito
diferentes. De um lado, Washington continua decidindo onde gastar os
recursos criados pela iniciativa privada, com seus projetos corruptos
e incompetentes. Do outro, o governo adota uma política de forte
redução dos gastos, deixando o caminho livre para que indivíduos e
empresas possam novamente colocar a economia na trilha da
prosperidade.


Sem apelar para discurso demagógico, Ryan reconhece que os ajustes
necessários seriam também dolorosos no primeiro momento. Afinal,
trata-se de corrigir o rumo atual, que tem sido de total
irresponsabilidade. Não dá mais para viver além dos meios existentes,
e, quanto mais tempo levar para os americanos aceitarem este fato da
realidade, maior será o sofrimento. A complacência de hoje será paga
com o suor dobrado de amanhã. E Ryan teve a coragem de não ignorar o
enorme elefante na sala, que todos fingem não existir.

Se sua iniciativa vai ou não surtir efeito prático, ainda parece cedo
para dizer. A escolha, em última instância, caberá aos eleitores
americanos. Mas o presidente Obama já teve de vir a público reagir, e
anunciou um projeto de corte de US$4 trilhões nos gastos públicos nos
próximos 12 anos. Muitas incertezas ainda pairam no ar, e seu discurso
foi carregado de demagogia. Obama atacou os mais ricos, como se mais
impostos para ricos não prejudicassem justamente os mais pobres. Mas o
pêndulo pode ter começado a virar. Os americanos agora contam com uma
liderança que tem a coragem de defender uma opção diferente para o
país.

Voltando ao Brasil, vemos que a reação da oposição é bem-vinda, mas
que ainda é muito tímida. Falta uma liderança que conteste o modelo
atual de estado, que concentra poder demais e arrecada impostos
demais. Onde está o Paul Ryan brasileiro?

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