Entrevista:O Estado inteligente

segunda-feira, abril 25, 2011

Síndrome de classe média JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO

O ESTADO DE SÃO PAULO - 25/04/11
O rico não sabe que é rico. Um em cada cinco pobres não se acha pobre.
Ambos sofrem da síndrome de classe média.
Apenas 1% dos que estão no topo da pirâmide social brasileira se
reconhece abastado. Praticamente dois terços desses que estão na mais
alta faixa de renda dizem que são classe média. O resto não aceita tal
régua e se diz "trabalhador".
A camada intermediária incha em toda pesquisa que pede para o
entrevistado dizer qual sua classe. Não é preciso ir à Sorbonne para
entender o porquê.
Como não dá para calcular sua posição na escala social sem se comparar
aos outros, seu lugar será sempre relativo. O mesmo 1,80 metro que
garante a posição de pivô no time de basquete dos pigmeus, é
insuficiente para ser armador na NBA.
Numa autoclassificação por renda, a maioria dos indivíduos olha para
um lado e vê que há gente mais rica do que ele; olha para o outro e
nota que há também mais pobres. Logo, seu lugar deve estar no meio.
Em pesquisa CNI/Ibope de 2008, 42% dos brasileiros se autoclassificam
como classe média ("alta", "baixa" ou sem adjetivos) e 19% como classe
trabalhadora/operária.
Ideologias à parte, os ditos trabalhadores/operários estão mais perto
do extrato superior do que do terço que se considera na classe
baixa/pobre. Comparando sua renda com a dos outros, pelo menos metade
deles seria classe média.
Desde que a pesquisa foi feita, há quase três anos, mais pessoas
emergiram economicamente. Mantido o crescimento do consumo, a classe
média será ainda mais majoritária em 2014.
Como resultado, se um candidato for à TV e pedir o voto de quem é da
classe média, ele terá boas chances de sair com mais eleitores do que
inimigos. Há um inconveniente, porém: não será o único político
fazendo esse apelo eleitoral.
PT e PSDB vêm buscando o voto da classe média há várias eleições.
Descobriram que há diferentes classes nessa média: os emergentes, os
decadentes e os estáveis; subdivididos em estudantes, estudados e sem
estudo; em crentes, agnósticos e não praticantes; além de ricos,
pobres e remediados.
Acertar o discurso para cada segmento é um problema, porque muitas
vezes os interesses são contraditórios. Os ricos reclamam dos impostos
altos, por exemplo, enquanto os pobres acham que eles são necessários
para garantir saúde e educação. É natural: estes usam muito os
serviços públicos, aqueles, pouco.
Os ricos têm dificuldades de se saberem ricos porque a dispersão da
renda é maior na ponta mais afluente da escala. Proporcionalmente, a
desigualdade é mais aguda entre os ricos do que entre os pobres.
Segundo a PNAD 2009, o rendimento do 1% mais rico é o triplo do que
ganham os 4% do degrau imediatamente anterior. Ou seja: a não ser que
seu nome seja Eike Batista, sempre haverá alguém ganhando muito mais
do que você e será fácil de notar pelo modelo do carro, pelo tamanho
da casa ou pela autonomia do jatinho.
Na frase entreouvida em um grupo de pesquisa qualitativa sobre a nova
classe média: "Rico é quem tem lancha". Com barcos financiados em 48
prestações no cartão de crédito, já há quem diga que rico é quem tem
vaga em marina.
Entre os ex-pobres, os signos da diferença social são mais prosaicos:
um celular inteligente, uma conexão rápida à internet no computador de
casa.
Como nota o pesquisador Maurício Moura, muitas novidades consumidas
pelos emergentes implicam mais acesso à informação, o que os torna
permeáveis, ou pelo menos acessíveis, ao discurso da oposição. Daí
talvez Fernando Henrique Cardoso descartar "as massas carentes e pouco
informadas".
Mas não basta ter acesso ao alvo. O discurso precisa acertar. Em
propaganda recente, o PSDB reclama das filas nos aeroportos. São filas
que incomodam o eleitor tradicional do partido, mas que foram formadas
pelo afluxo de novos passageiros, os mesmos emergentes que os tucanos
querem conquistar.
O PSDB tem mais um motivo para apurar o discurso. Dilma Rousseff está
com aprovação superior ao seu porcentual de votos no 2.º turno de
2010. Logo, uma parcela dos eleitores de José Serra em 2010 aprova o
governo da petista. Seriam eles de classe média? Podem não ser, mas
acham que são.

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