O Estado de S. Paulo - 13/09/2010
Os prognósticos são de uma vitória avassaladora da aliança governamental, capitaneada pelo PT e pelo PMDB. A eleição presidencial está praticamente decidida, salvo se houver algum fato novo que prejudique seriamente a candidatura Dilma. O episódio da Receita Federal, embora grave do ponto de vista da cidadania, não terá efeito eleitoral forte se não atingir um grão-petista diretamente envolvido na campanha presidencial. Não parece ser esse o caso mais provável.
No que diz respeito à representação parlamentar, as oposições certamente perderão posições. O caso mais emblemático é o do Senado, onde lideranças oposicionistas encontram dificuldades para a reeleição, disputando, acirradamente, a segunda posição. Se esses prognósticos se confirmarem, torna-se evidente o enfraquecimento das oposições. Poder-se-ia dizer que elas estariam arrasadas, colocando o problema de uma revisão de suas posições e, mais concretamente, de uma eventual reconfiguração partidária.
O PT e a base aliada, capitaneados por Lula, estão dando um espetáculo de competência. É bem verdade que o atual presidente agiu para lá do que seria recomendável a alguém no exercício de seu mandato, não tendo conseguido representar o papel de estadista. A questão, no entanto, não está aí, mas na incompetência das oposições, que sucumbem a seus próprios erros e concepções.
Uma oposição que procura colocar-se como herdeira da situação exibe sua própria falta de ideias. Serra, em sua propaganda eleitoral, esconde o ex-presidente Fernando Henrique e exibe Lula em imagens televisivas. Se o eleitor prefere Lula, é evidente que votará em Dilma, que é a sua candidata. O ex-presidente Fernando Henrique, por sua vez, é tratado como se tivesse uma doença contagiosa, quando ele é, também, o responsável por vários empreendimentos bem-sucedidos do atual governo, como a política macroeconômica, o Bolsa-Família, a Lei de Responsabilidade Fiscal e o saneamento dos bancos. O PT, sem reconhecê-lo, adotou uma política "neoliberal".
Acontece que o próprio ex-presidente não escondeu sua satisfação quando Lula lhe sucedeu. Para além das questões pessoais, estava em jogo uma questão de cunho, digamos, doutrinário, como se o poder, enfim, estivesse passando de uma esquerda "social-democrata" para uma esquerda "sindical", que, progressivamente, se "social-democratizaria", aliando-se à sua predecessora no poder. A aliança não ocorreu, tendo o PT feito um governo pragmático em várias áreas, apesar de não ter efetuado nenhuma revisão de suas concepções. Com efeito, o atual governo loteou partes do Estado para as tendências mais radicais do partido e os ditos movimentos sociais, que são verdadeiras organizações revolucionárias. É o caso do Ministério do Desenvolvimento Agrário, do Incra, da Funai, do Itamaraty, de partes dos Ministérios da Educação e do Desenvolvimento Social.
Outro resultado desse processo foi o não surgimento de uma direita moderna, defensora do Estado de Direito, da economia de mercado, da livre-iniciativa, do direito de propriedade, dos contribuintes e da democracia representativa. Os democratas (DEM) chegaram a trilhar esse caminho, mas terminaram pondo-se a reboque do PSDB. Para se viabilizarem eleitoralmente deveriam ter tido candidato próprio nesta eleição, uma cara nova, que criaria uma alternativa e teria um recall para as próximas eleições.
Os tucanos não estão em situação muito melhor, apesar de poderem conquistar Estados importantes, como São Paulo, Minas Gerais e Paraná. Acharam, anteriormente, que deter Estados importantes seria uma sólida alavanca para as eleições presidenciais. O prognóstico não se confirmou, entre outras razões, porque o PSDB segue sendo um partido basicamente paulista, sem visão e inserção nacionais.
Logo, não deveria surpreender que o atual pleito presidencial tenha três candidatos petistas e um tucano, todos se reivindicando da esquerda. Dilma é PT, Marina foi PT até ontem, Plínio de Arruda Sampaio reivindica-se das bandeiras históricas do PT e Serra é, também, fruto desse mesmo imaginário político-social. Ademais, o PT cooptou a direita mais oligárquica, fisiológica, como os grandes caciques do Nordeste e do Norte do País. A "direita" está dentro da aliança governamental de "esquerda". Quem não se espelha nessa concepção não tem em quem votar!
Criou-se, assim, uma grande preocupação no que diz respeito ao projeto hegemônico do PT, como se a democracia estivesse efetivamente ameaçada em nosso país. É bem verdade que existe uma ameaça real quando um partido se apodera de postos-chave do Estado, aparelhando-o e reduzindo as oposições a posição subalterna. Convém, porém, salientar que as próprias oposições são igualmente responsáveis por essa situação.
O PT, por sua vez, não pode ser tratado ideologicamente como um bloco, abrigando tanto tendências reformistas e democráticas quanto revolucionárias e antidemocráticas. É forçoso reconhecer que o partido seguiu todas as regras democrático-representativas, apesar de procurar enfraquecê-las, por exemplo, com o "controle social da mídia", a democracia dita "participativa", os ataques ao direito de propriedade e a leniência com os ditos "movimentos sociais", chegando a financiá-los. O desfecho dessa luta interna em muito dependerá de nossas instituições e do papel que a oposição vier a desempenhar.
Por último, a vitória do PT não é só do PT, mas da aliança governamental, sobretudo do PMDB. Embora este seja uma soma de partidos regionais de nítidos interesses fisiológicos, seu projeto não consiste na abolição da democracia representativa. Mesmo para a conservação do seu pior lado, a democracia representativa deve ser preservada. Quero dizer com isso que o PMDB poderá vir a exercer importante papel de moderação no próximo governo, compondo com o PT e com as oposições. E da renovação destas últimas dependerá a consolidação da democracia no País.
Entrevista:O Estado inteligente
- Índice atual:www.indicedeartigosetc.blogspot.com.br/
- INDICE ANTERIOR a Setembro 28, 2008
Arquivo do blog
-
▼
2010
(1998)
-
▼
setembro
(283)
- Lulambança CARLOS ALBERTO SARDENBERG
- No foco, o câmbio Celso Ming
- De Pomona a Marte Demétrio Magnoli
- O último debate Miriam Leitão
- Do alto do salto Dora Kramer
- Diferenças e tendências Merval Pereira
- De Severino a Tiririca DORA KRAMER
- Mudança de vento Merval Pereira
- O tom do recado Míriam Leitão
- Marolinha vermelha Marco Antonio Villa
- Últimas semanas:: Wilson Figueiredo
- A via sindical para o poder Leôncio Martins Rodrigues
- Por que os escândalos não tiram Dilma do topo José...
- Mais controle de capitais Celso Ming
- A derrota de Chávez EDITORIAL O Estado de S. Paulo
- O papel do STF Luiz Garcia
- O Brasil em primeiro lugar Rubens Barbosa
- Guerra cambial Celso Ming
- O corte inglês Miriam Leitão
- Os mundos e fundos do BNDES Vinicius Torres Freire
- As boquinhas fechadas Arnaldo Jabor
- Sinais de fumaça e planos para segunda-feira:: Ray...
- Faroeste :: Eliane Cantanhêde
- Mais indecisos e "marola verde" :: Fernando de Bar...
- Em marcha à ré :: Dora Kramer
- Marina contra Dilma:: Merval Pereira
- Fabricando fantasmas Paulo Guedes
- Qual oposição? DENIS LERRER ROSENFIELD
- Capitalização e política O Estado de S. Paulo Edit...
- O eleitorado traído Autor(es): Carlos Alberto Sard...
- Como foi mesmo esse maior negócio do mundo? Marco...
- Mary Zaidan - caras-de-pau
- OS SEGREDOS DO LOBISTA DIEGO ESCOSTEGUY E RODRIGO ...
- E agora, Petrobrás? -Celso Ming
- Alerta contra a anestesia crítica:: Carlos Guilher...
- Em passo de ganso e à margem da lei :: Wilson Figu...
- Às vésperas do pleito:: Ferreira Gullar
- A Previdência e os candidatos Suely Caldas
- Todo poder tem limite EDITORIAL FOLHA DE SÃO PAULO
- Forças e fraquezas Miriam Leitão
- Metamorfoses Merval Pereira
- A CONSPIRAÇÃO DA IMPRENSA João Ubaldo Ribeiro
- A posse das coisas DANUZA LEÃO
- A semente da resistência REVISTA VEJA
- LYA LUFT Liberdade e honra
- O gosto da surpresa BETTY MILAN
- Dora Kramer - Lógica de palanque
- Gaudêncio Torquato -O voto, dever ou direito?
- Que esquerda é esta? Luiz Sérgio Henriques
- O mal a evitar-Editorial O Estado de S Paulo
- MARIANO GRONDONA Urge descifrar el insólito ADN de...
- JOAQUÍN MORALES SOLÁ El último recurso de los Kirc...
- A musculatura do PT Ruy Fabiano
- Miriam Leitão Vantagens e limites
- Merval Pereira: "Lula poderá ser um poder paralelo''
- A política em estado de sofrimento :: Marco Auréli...
- ANTES QUE SEJA TARDE MAURO CHAVES
- A imprensa no pós-Lula EDITORIAL O ESTADO DE SÃO P...
- Limites Merval Pereira
- Os segredos do lobista-VEJA
- A concentração anormal-Maria Helena Rubinato
- Sandro Vaia - O juiz da imprensa
- Contas vermelhas Miriam Leitão
- Porões e salões :: Luiz Garcia
- FÁBULA DA FEIJOADA FERNANDO DE BARROS E SILVA
- Margem de incerteza EDITORIAL FOLHA DE SÃO PAULO
- Razões Merval Pereira
- E o câmbio continua matando! Luiz Aubert Neto
- Um passo além do peleguismo O Estado de S. Paulo E...
- As dúvidas acerca do uso do FSB se acumulam- O Est...
- Anatomia de um aparelho lulopetista Editorial O Globo
- Lógica de palanque- Dora Kramer
- Inconsistências no câmbio - Celso Ming
- O resultado da capitalização da Petrobrás : Adrian...
- CARLOS ALBERTO SARDENBERG A falta que nos faz o li...
- Liberdade até para os estúpidos-Ronald de Carvalho
- MÍRIAM LEITÃO Câmbio errado
- O efeito Erenice :: Eliane Cantanhêde
- Tempos petistas:Merval Pereira
- O sucesso do modelo da telefonia O Globo Editorial
- O desmanche da democracia O Estado de S. Paulo Edi...
- Ato insensato - Dora Kramer
- Afrouxar ou não afrouxar- Celso Ming
- A decadência dos EUA - Alberto Tamer
- A cara do cara:: Marco Antonio Villa
- Entrevista:: Fernando Henrique Cardoso.
- Peso da corrupção Miriam Leitão
- Uma eleição sem regras ROBERTO DaMATTA
- Perdendo as estribeiras Zuenir Ventura
- FERNANDO DE BARROS E SILVA A boa palavra de FHC
- MERVAL PEREIRA Prenúncios
- O Fundo Soberano e o dólar O Estado de S. Paulo Ed...
- As contas externas serão o maior problema em 2011 ...
- E no câmbio, quem manda?- Celso Ming
- Autocombustão - Dora Kramer
- Traços em relevo Miriam Leitão
- MERVAL PEREIRA A democracia de Lula
- A ELITE QUE LULA NÃO SUPORTA EDITORIAL O ESTADO DE...
- ELIANE CANTANHÊDE Paulada na imprensa
- ARNALDO JABOR Lula é um fenômeno religioso
-
▼
setembro
(283)
- Blog do Lampreia
- Caio Blinder
- Adriano Pires
- Democracia Politica e novo reformismo
- Blog do VILLA
- Augusto Nunes
- Reinaldo Azevedo
- Conteudo Livre
- Indice anterior a 4 dezembro de 2005
- Google News
- INDICE ATUALIZADO
- INDICE ATE4 DEZEMBRO 2005
- Blog Noblat
- e-agora
- CLIPPING DE NOTICIAS
- truthout
- BLOG JOSIAS DE SOUZA