FOLHA DE SÃO PAULO - 04/09/10
O Estado do Rio, ao introduzir as UPPs (unidades de polícia pacificadora) em algumas favelas, estimulou convergências de opinião. Afinal, a dualidade de Estado na área de justiça e segurança e a ruptura do monopólio do uso da força, pilar do Estado de Direito, são inadmissíveis.
O ano eleitoral terminou servindo de palco para que as UPPs servissem de estandarte para a própria eleição presidencial. Por isso mesmo é necessária uma análise mais cuidadosa -não dos méritos, mas do alcance da iniciativa.
Aqui se destacam dois pontos: o objeto e a expansão. O objeto das UPPs não é combater o tráfico de drogas no varejo das favelas, mas levar os traficantes a abandonarem algumas dessas áreas, retomando, assim, o monopólio estatal do uso da força.
As próprias autoridades chamam a atenção para isso ao destacar que as comunidades foram ocupadas sem a troca de um tiro. Do ponto de vista da região metropolitana do Rio, houve um deslocamento deles para outras comunidades, aumentando, nestas, a ostensividade dos traficantes.
A expansão do programa deve ser analisada com base nas ocupações ocorridas até aqui nas favelas da zona sul do Rio, onde o tempo de permanência é maior. São favelas de porte médio-pequeno, com 4.000 a 5.000 habitantes. A ocupação é feita com efetivo de 150 policiais militares, numa relação de uns 30 habitantes por policial.
No caso dos bairros, essa relação é de 1.000 habitantes por policial. Um batalhão tem 400 policiais militares para 400 mil habitantes. Na zona norte, a mais violenta da capital, essa relação é de 2.120 habitantes por policial. Aquela relação de 30 impediria a universalização do programa, pois o efetivo da PM teria que ser triplicado. Portanto, a expansão depende de ir alterando a escala, para que não fique apenas nos bairros de renda mais alta.
O episódio recente na Rocinha/São Conrado é bem elucidativo. Todas as favelas da zona sul com UPPs eram controladas pelo Comando Vermelho. As maiores (Rocinha e Vidigal) são pela ADA (Amigos dos Amigos). Com isso a ADA passou a ter o monopólio da venda de drogas no atraente mercado da zona sul. E assim seu poder financeiro e bélico aumentou muito.
Os efetivos filmados no episódio constituíam um batalhão uniformizado de preto. Lá, o "exército" armado e uniformizado já tem 400 homens. As elogiáveis UPPs devem ser entendidas como um vetor de intervenção, e nunca como política de segurança pública.
E assim mesmo deve-se planejar a escala para que não seja só laboratório para divulgação. Afinal, elas entraram numa região da cidade onde a taxa de homicídios, de 8 por 100 mil habitantes, é apenas 20% da média da capital.
Entrevista:O Estado inteligente
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