Autor(es): Dani Rodrik |
Valor Econômico - 28/01/2010 |
A China ainda é um país pobre, mesmo assim projeta-se que sua economia ultrapasse a dos EUA em tamanho nas próximas duas décadas Trinta anos atrás, a China tinha uma presença minúscula na economia global e pouca influência fora das suas fronteiras, exceto por alguns países com os quais mantinha relações políticas e militares próximas. Hoje, o país é uma notável potência econômica: maior centro fabril do mundo, destacado investidor mundo afora, da África à América Latina, e, cada vez mais, uma importante fonte de pesquisa e desenvolvimento. O governo chinês está sentado sobre um nível espantoso de reservas cambiais, superior a US$ 2 trilhões. Não existe um único setor em algum lugar no mundo que já não tenha sentido o impacto da China, seja como um fornecedor de baixo custo, ou, de forma mais ameaçadora, como um concorrente formidável. A China ainda é um país pobre. Apesar de a renda média ter aumentado muito rapidamente nas décadas recentes, ela ainda se situa entre 1/7 e 1/8 dos níveis nos EUA, mais baixo que o da Turquia ou Colômbia. Enquanto a China litorânea e suas metrópoles mais importantes exibem riqueza formidável, extensas faixas da China Ocidental continuam atoladas na pobreza. Apesar disso, projeta-se que a economia da China ultrapasse a dos EUA em tamanho nas próximas duas décadas. Enquanto isso, os EUA, a única superpotência econômica do mundo até recentemente, permanecem um gigante diminuído. O país se vê humilhado por seus fiascos em política exterior e por uma descomunal crise financeira. Sua credibilidade depois da desastrosa invasão do Iraque está no seu nível histórico mais baixo, apesar da simpatia global pelo presidente Barack Obama, e seu modelo econômico está em pedaços. O outrora todo-poderoso dólar cambaleia à mercê da China e dos países ricos em petróleo. Todos esses elementos levam a perguntar se a China acabará substituindo os EUA como o poder hegemônico do mundo, o ditador e fiscalizador de regras do mundo. Num livro novo fascinante, intitulado de forma esclarecedora "When China Rules the World" (Quando a China dominar o mundo), o intelectual e jornalista britânico Martin Jacques é contundente: se você pensa que a China será integrada suavemente num sistema mundial liberal, capitalista e democrático, argumenta Jacques, prepare-se para uma grande surpresa. A China não só será a próxima superpotência econômica, como também a ordem mundial que ela construirá parecerá muito diferente daquela que tivemos sob a liderança dos EUA. Americanos e europeus presumem displicentemente que a China se tornará mais parecida com eles à medida que sua economia se desenvolver e sua população ficar mais rica. Isso é uma miragem, diz Jacques. Os chineses e seu governo estão ligados a um conceito diferente de sociedade e de regime: baseado em comunidade, em vez de individualista, centralizado no Estado, em vez de liberal, autoritário em lugar de democrático. A China tem 2 mil anos de história como uma civilização distinta, aos quais pode recorrer para se fortalecer. Ela não se curvará simplesmente aos valores e instituições do Ocidente. Uma ordem mundial centrada na China refletirá valores chineses em vez de ocidentais, argumenta Jacques. Pequim eclipsará Nova York, o renminbi substituirá o dólar, o mandarim assumirá o lugar do inglês, e os alunos em todo o mundo aprenderão sobre as viagens de descobrimento de Zheng He ao longo da costa Oriental da África, em vez de aprenderem sobre Vasco da Gama ou Cristóvão Colombo. Serão coisas do passado o evangelismo dos mercados e a democracia. É muito menos provável que a China interfira nos assuntos internos de Estados soberanos. Em troca, porém, ela exigirá que países menores e menos poderosos reconheçam explicitamente a primazia chinesa (exatamente como nos sistemas tributários de antigamente). Antes que algo dessa natureza venha a ocorrer, contudo, a China deverá continuar o seu veloz crescimento econômico e manter sua coesão social e união política. Nada disso está garantido. Por baixo do possante dínamo econômico da China encontram-se profundas tensões, desigualdades e rachaduras que poderão até arruinar uma progressão tranquila rumo à hegemonia global. Ao longo da sua longa história, forças centrífugas muitas vezes empurraram o país na direção da desordem e da desintegração. A estabilidade da China depende criticamente da capacidade do governo de distribuir ganhos econômicos contínuos à vasta maioria da população. A China é o único país do mundo onde qualquer coisa abaixo de 8% de crescimento ano após ano é considerado perigoso porque o fato poderia desencadear inquietação social. A maioria do resto do mundo apenas sonha com crescimento àquela taxa, o que deixa entrever muito sobre a fragilidade subjacente do sistema chinês. A natureza autoritária do regime político está no núcleo dessa fragilidade. Ele só permite a repressão quando o governo enfrenta protestos e oposição fora dos canais estabelecidos. O problema é que ficará cada vez mais difícil para a China manter o tipo de crescimento que experimentou nos anos recentes. O crescimento do país atualmente se apoia numa moeda subvalorizada e num enorme superávit na balança comercial. Isso é insustentável e, cedo ou tarde, precipitará um confronto de grandes proporções com os EUA (e a Europa). Não há formas fáceis de contornar esse dilema. A China provavelmente precisará se conformar com crescimento mais baixo. Se a China superar esses obstáculos e realmente acabar se tornando a potência econômica predominante do mundo, a globalização deverá, certamente, assumir as características chinesas. Assim, a democracia e os direitos humanos provavelmente perderão a sua atratividade como normas mundiais. Esse é o lado negativo. O lado positivo é que uma ordem global chinesa mostrará maior respeito por soberania nacional e mais tolerância por diversidade nacional. Haverá maior espaço para experimentação com diferentes modelos econômicos. |
Entrevista:O Estado inteligente
- Índice atual:www.indicedeartigosetc.blogspot.com.br/
- INDICE ANTERIOR a Setembro 28, 2008
quinta-feira, janeiro 28, 2010
A China dominará o mundo?
Arquivo do blog
-
▼
2010
(1998)
-
▼
janeiro
(183)
- CELSO MING - Eles vão mal das pernas
- CLÓVIS ROSSI Porto Alegre em Davos
- DANUZA LEÃO O preço a pagar
- Suely Caldas:Mistério na Petrobrás
- Fagulhas autoritárias Gaudêncio Torquato
- Sergio Fausto - Liderança à altura
- Maria Helena Rubinato :Não se pode bater o sino e ...
- Tudo azul na mídia oficial Miro Teixeira
- Merval Pereira: Um processo virtuoso
- Ferreira Gullar:Casos e acasos
- Rubens Ricupero:: Todo ano é Haiti
- VEJA Edição 2150. 3 de fevereiro de 2010
- Celso Ming - Fatiar os bancos
- Luiz Garcia - Aposentados em Brasília
- Merval Pereira - Anticlímax
- Depois da queda Luiz Felipe Lampreia
- Truques fiscais - Regina Alvarez
- Merval Pereira Como controlar?
- Celso Ming - Participação nos lucros
- A China dominará o mundo?
- Exageros no Haiti Editorial de O Globo
- MERVAL PEREIRA As culpas de Davos
- Míriam Leitão Chavez sempre sobreviveu, mas desta ...
- Arrogância e falta de medida Rubens Ricupero
- Mais Europa, não menos - Celso Ming
- Lula e Davos Merval Pereira
- O Brasil e a Conferência de Copenhague Rubens Barbosa
- Haiti: na capital devastada, as cenas macabras que...
- Nobel da paz critica Lula (Giulio Sanmartini)
- A salvo da lei- Ricardo Noblat
- O mundo atrapalhado - Carlos Alberto Sardenberg
- Lula - imagem estilhaçada- Carlos Alberto Di Franco
- A anistia de Lula Daniel Piza
- Uma mulher e tanto José Serra
- Chavismo em crise
- A nova classe Merval Pereira
- Cavalo de Troia Celso Ming
- Comitê central Dora Kramer
- FERREIRA GULLAR Uns mentem, outros deliram
- DANUZA LEÃO Ser escrava
- VINICIUS TORRES FREIRE A política menor do plano O...
- Guerrilha e redemocratização IVES GANDRA DA SILVA ...
- A falta de apelo e a apelação Editorial de O ESTAD...
- Dora Kramer Parceria de adversários
- Atentado ao futuro
- Merval Pereira Máquina politizada
- Carta ao Leitor
- Entrevista Peter Ward
- Claudio de Moura Castro
- Radar Lauro Jardim
- O Google enfrenta o governo chinês
- Manuscrito das memórias de Newton está na internet
- Novas descobertas sobre um povo antigo do Acre
- O novo número 1 do tabuleiro
- Maílson da Nóbrega
- O eleitor escolheu a direita
- O ex-senador John Edwards reconhece filha ilegítima
- Diogo Mainardi
- Invictus, uma história de Nelson Mandela
- Zumbilândia, uma comédia com mortos-vivos
- A Senhora do Jogo, de Sidney Sheldon, supostamente
- VEJA Recomenda e Os mais vendidos
- J. R. Guzzo
- Reinaldo Azevedo:O FALSÍSSIMO EM VERISSIMO. OU: A ...
- Merval Pereira Troca de chumbo
- Dora Kramer Desmonte exemplar
- MERVAL PEREIRA - Parcerias estratégicas
- O rombo vai aumentar - Celso Ming
- Comparação incomparável - Dora Kramer
- O Bonaparte ausente : Demétrio Magnoli
- O assalto ao poder, fase 2 : Rolf Kuntz*
- Desaquecimento chinês está próximo: Chris Oliver*
- 'Marolinha' foi vagalhão : Roberto Macedo
- CUT prepara greves em apoia à Dilma
- A DITADURA DE ESQUERDA CHEGANDO. VINGANÇA OU MALUQ...
- Merval Pereira -Forjando a união
- Dora Kramer - Banho de sol
- Celso Ming A população envelhece
- O fantasma da vingança espreita a eleição José Nê...
- O Chile e nós - Merval Pereira
- Míriam Leitão Desafios e riscos
- Heróis ou vilões? -/Rodrigo Constantino
- As novas bolhas Celso Ming
- Pernas curtas Dora Kramer
- Anistia é irreversível PAULO BROSSARD
- O Capoeirista-Mary Zaidan
- Um desumano Programa de Direitos Humanos PAULO RAB...
- Ricardo Noblat Serra vai bem, obrigado!
- Marco Antonio Rocha O plano para pôr a Ágora no poder
- Direitos humanos Denis Lerrer Rosenfield
- Direitos desumanos /Ives Granda Martins Filho
- A Venezuela e a maldição do petróleo Adriano Pires
- CELSO MING - "Quero o meu de volta"
- AUGUSTO NUNES:O Haiti não precisa de circo
- Amargo começo - Miriam Leitão
- Argentina: mandar todos embora, outra vez? JOAQUÍN...
- Demétrio Magnoli -Direitos humanos reciclavéis
- Dora Kramer Instituição questionada
- Merval Pereira:: O papel de cada um
- Surtos e sustos Gaudêncio Torquato
-
▼
janeiro
(183)
- Blog do Lampreia
- Caio Blinder
- Adriano Pires
- Democracia Politica e novo reformismo
- Blog do VILLA
- Augusto Nunes
- Reinaldo Azevedo
- Conteudo Livre
- Indice anterior a 4 dezembro de 2005
- Google News
- INDICE ATUALIZADO
- INDICE ATE4 DEZEMBRO 2005
- Blog Noblat
- e-agora
- CLIPPING DE NOTICIAS
- truthout
- BLOG JOSIAS DE SOUZA