O Estado de S. Paulo - 21/01/2010
O rombo nas contas externas do Brasil em 2009 foi maior do que o esperado e vai crescer substancialmente tanto em 2010 como em 2011.
Em princípio, nada há de errado nisso, desde que a qualidade do financiamento desse déficit seja adequada. Mas, para avaliar melhor as consequências, isso tem de ser trocado em miúdos.
Primeiramente, o conceito. Contas Correntes do Balanço de Pagamentos de uma economia é o pedaço da contabilidade externa de um país que registra pagamentos e recebimentos com o resto do mundo. Englobam os resultados de três subcontas: o comércio (exportações e importações), os serviços (juros, transportes, seguros, royalties, turismo, etc.) e as transferências unilaterais (que são, por exemplo, aquele dinheiro que as famílias recebem ou mandam de ou para parentes que estão no exterior).
Quando são negativas, ou seja, quando tem mais dinheiro saindo do que entrando, as Contas Correntes refletem mais consumo do que capacidade de poupança. É isso que está acontecendo agora. O gráfico mostra o comportamento das Contas Correntes durante o governo Lula.
No ano passado, o déficit em Contas Correntes foi de US$ 24,3 bilhões (1,6% do PIB), menor do que o de 2008, que foi de US$ 28,2 bilhões (1,7% do PIB). Mas foi mais alto do que o esperado. Para 2010 está previsto um novo salto nessas Contas. O Banco Central (BC) projeta um déficit de US$ 40 bilhões e o mercado (Pesquisa Focus) conta com um déficit de US$ 45,6 bilhões (alguma coisa em torno de 2,5% do PIB).
Os alarmistas já estão perdendo o sono porque se lembram dos tempos em que o Brasil quebrou. Não é o caso de agora. Um rombo nas Contas Correntes não é ruim em si mesmo. Depende de como é coberto. Se fosse financiado com recursos de curto prazo, o risco seria grande porque capitais dessa natureza são bichos espantados que fogem ao primeiro ruído. Mas, se for coberto com entrada de recursos de longo prazo, especialmente por Investimento Estrangeiro Direto (IED), que vem para ficar, certamente não deve levantar preocupações imediatas. Lá na frente, quando esses recursos produzirem resultados, estarão dando origem a novas despesas do País, com remessas de lucros. No entanto, se a economia continuar equilibrada e previsível (o que vai depender do comportamento das contas públicas), esses investimentos continuarão crescendo.
Em 2008, o IED foi de US$ 45,1 bilhões. Em 2009, caiu para US$ 25,9 bilhões por causa da crise global. Mas em 2010 deverá crescer para US$ 45 bilhões, conforme apontam as projeções do BC. (Veja o gráfico no Confira.)
Também não foi desprezível a aplicação estrangeira em ações de empresas brasileiras. Em 2009, atingiu US$ 37,1 bilhões, volume que poderá aumentar em 2010, porque o Brasil é uma das poucas economias relevantes que apresentará crescimento superior a 5% ao ano.
Para fechar essa equação com mais segurança seria preciso controlar duas variáveis. A primeira tem a ver com o desempenho da economia mundial. Uma recaída na crise, por exemplo, poderia azedar o jogo econômico.
A outra é o risco eleitoral. Ninguém sabe o que os principais candidatos estão aprontando para a política econômica. Está aí um campo minado no qual não pode haver pisada em falso.
Confira
É o mercado interno - O investimento estrangeiro procura oportunidades no mercado interno. Como é difícil levar a fábrica embora, esse tipo de investimento não sai do País apenas porque alguma coisa está errada nas contas externas.
Entrevista:O Estado inteligente
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