Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, abril 10, 2009

Diogo Mainardi O Lula shakespeariano


"O Brasil representa o elemento de comicidade
nesses encontros internacionais, a taberna suja
e barulhenta que contrasta com o rigor puritano
do Castelo de Westminster"

Lula e Barack Obama confraternizaram no G-20 como Falstaff e o Príncipe de Gales no H-4 – ou Henrique IV.

Ato I, cena II:

FALSTAFF – Que horas são, rapaz?

PRÍNCIPE – Embruteceste de tal modo, à força de beber xerez, de desabotoar-te depois da ceia e de dormir à tarde sobre os bancos, que esqueces de perguntar o que realmente mais importa saberes. Que diabo tens tu que ver com o tempo?

Falstaff – o Falstaff shakespeariano – é obeso, barbado, embriagado, ocioso, medroso, mulherengo, traidor, desonesto. Ele anima as noitadas do Príncipe de Gales com seus planos para roubar as bolsas dos peregrinos. O Príncipe de Gales só se aborrece quando Falstaff é infiel à sua imagem de fanfarronice, como na passagem em que pergunta, distraidamente, as horas.

Lula – isso mesmo, o Lula shakespeariano – animou as noitadas de Barack Obama durante o G-20. Quando perguntou as horas, ninguém respondeu. O Brasil representa o elemento de comicidade nesses encontros internacionais, a taberna suja e barulhenta que contrasta com o rigor puritano do Castelo de Westminster. A trama que "realmente mais importa", na qual se decide o destino da Inglaterra, se desenrola em outras cenas, em outros ambientes, com outros protagonistas.

Concretamente, em números, como as horas no mostrador de um relógio: Barack Obama, para tentar restabelecer a economia dos Estados Unidos, está aumentando o déficit público, num prazo de dez anos, em cerca de 6 500 000 000 000 de dólares (com todos os zeros); Lula, para tentar restabelecer a economia do Brasil, cortou o IPI de alguns produtos por um prazo de três meses, reduzindo o custo do saco de 25 quilos de cimento em cerca de 40 centavos (com todos os zeros).

Os majestosos pacotes fiscais de Barack Obama prometem enterrar os Estados Unidos, financiando uma série de indústrias falidas. No Brasil, ao contrário, o corte do IPI do cimento ajudará, indiretamente, uma indústria próspera: a do comércio de drogas. Em primeiro lugar, estimulando o crescimento das favelas. Encasteladas nos morros, elas correspondem, para os traficantes, às fortalezas medievais: Comando Vermelho e William Shakespeare. Em segundo lugar, subsidiando a cocaína. Algumas semanas atrás, o Globo mostrou que os traficantes da Rocinha (o rei do tráfico – o Henrique IV da Rocinha – é conhecido como Nem) misturam cimento à cocaína. O que fez o governo? Zerou o IPI da cocaína por três meses, garantindo uma economia de 40 centavos a cada 25 quilos. Isso sim é uma medida anticíclica. O Globo mostrou também que, em nossa taberna falstaffiana, suja e barulhenta, adolescentes com pouco mais de 25 quilos de peso se prostituem por 1,99 real. Sem IPI.

Em Henrique IV, o Príncipe de Gales, depois de assumir o trono, repudia Falstaff. Ei, Lula: agora são 11h53.


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