Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, abril 22, 2009

O FMI na contramão dos EUA Vinicius Torres Freire


 FOLHA DE S. PAULO

Homem do Tesouro de Obama revive otimismo do mercado sobre bancos, mas o FMI prevê perdas ainda mais tenebrosas

A LGUÉM ESTÁ muito errado a respeito da saúde dos bancos do G3 (EUA, Europa e Japão), da qual, em última análise, depende o fim da crise mundial, ainda que a China passe sebo nas canelas.

Ontem, o FMI revisou para cima suas estimativas de prejuízos para as instituições financeiras do G3.

Mas o secretário do Tesouro dos EUA, Timothy Geithner, disse também ontem que a "vasta maioria" dos 19 bancões ora auditados pelas agências reguladoras da finança vai passar no "teste de estresse" (a ser divulgado no dia 4 de maio).

Assim, oficialmente ou para inglês ver, estaria certificado que os bancos dispõem de capital bastante para enfrentar os calotes que a recessão ainda motivará nos próximos dois anos, dado um certo cenário econômico (tido como muito otimista ou já errado por economistas sensatos).

Geithner contou a suposta boa nova a uma comissão de supervisão do Congresso sobre a dinheirama que o governo despeja na finança privada.

O FMI divulgou os números num tenebroso "Relatório de Estabilidade Financeira Global". O fluxo de capitais para emergentes vai encolher ainda em 2009; mais de 60% dos bancos nos EUA e na eurozona ainda apertam o crédito; os "spreads" estão muito acima da média histórica; o valor das captações de curto prazo de empresas ("commercial papers") ainda estão 30% abaixo do verificado no início de 2007.

A crise na economia real continua a realimentar o ciclo de deterioração na finança. O FMI prevê que os bancos americanos devem dar como perdidos mais US$ 550 bilhões em 2009 e 2010 (de um total potencial de perdas de US$ 1,6 trilhão de 2007 a 2010). Preveem que os bancos precisariam de mais US$ 275 bilhões de capital, dada a estimativa "grosseira" de lucros retidos para o período e uma volta a um nível de alavancagem de 25 -isto é, essa seria a razão de ativos ("empréstimos") sobre capital ("dinheiro próprio"), anterior à crise. Para uma alavancagem de 17 (média de meados dos anos 90), precisariam de mais US$ 500 bilhões. Os europeus precisariam de US$ 600 bilhões (para uma alavancagem de 25 vezes o capital) ou US$ 1,2 trilhão (17 vezes). Os europeus têm menos disposição e menos dinheiro que os EUA para tapar tais rombos.

Dado o histórico do FMI, seria o caso de conceder o benefício da dúvida a Geithner. Porém, esse estudo do Fundo é dos mais técnicos -pode estar errado, mas não se trata das lambanças ideológicas das operações de "socorro" do FMI.

Numa carta ao comitê de supervisão do Congresso, Geithner disse que sobraram US$ 135 bilhões do pacote de socorro de US$ 700 bilhões (aprovado ainda no governo Bush, o "Tarp"). Pelas contas do FMI, Geithner vai ficar sem fundos. Precisará mesmo acreditar que o capital privado tapará parte do buraco, como disse ontem. Ou pedir mais um tutu ao Congresso, onde o clima não está para peixe. O FMI sugere que, em alguns casos, a estatização provisória de mais bancos deve estar nos planos das autoridades.

Os mercados, como de hábito, ignoraram o FMI. Ficaram felizes com as explicações de Geithner e voltaram a comprar ações, de bancos inclusive. Mesmo com mais balanços de boas empresas demonstrando a miséria previsível.

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