Entrevista:O Estado inteligente

sábado, abril 11, 2009

Consumo de crise Miriam Leitão


O GLOBO

O consumidor já mudou seus hábitos e está comprando menos produtos de maior valor agregado.

As pessoas admitem cortar gastos, trocar marcas e estão mais pessimistas do que na crise de 2003. A queda dos perecíveis começou no ano passado, com a alta das commodities. Para se manter no gosto do consumidor — e no bolso — alguns setores vão precisar inovar.

Uma pesquisa da Nielsen mostra que o consumo no primeiro bimestre já desacelerou.

Em algumas categorias, como perecíveis, já havia caído em 2008, para 2007, e neste início de ano caiu mais um pouco. A pesquisa mostra que os consumidores estão mais cautelosos e vão reduzir gastos.

Pelos dados, 45% dos entrevistados vão cortar despesas com refeições fora de casa, 44% com telefonia celular — que está em desaceleração este ano —, 37% com produtos eletroeletrônicos, 30% com roupas e 17% vão cortar no abastecimento do lar.

— Para as empresas, não é bom parar de investir ou de inovar, porque depois é mais difícil recuperar a preferência do consumidor — diz o analista de mercado da Nielsen, Ricardo Alvarenga.

De 1994 a 2007, dobrou o volume de vendas no país nas categorias auditadas pela Nielsen. Em 2008, o aumento foi só de 0,5%. Este ano, a tendência é de queda e de mudança de hábito. As classes C, D e E, até o ano passado, dividiram suas despesas do dia a dia com prestações dos novos equipamentos das casas. Na classe C, foram mais 800 mil novos lares com máquinas de lavar e mais 1 milhão deles com micro-ondas. Nas classes D e E, foram mais 650 mil lares com TV colorida. No setor de bebidas, uma novidade ganhou espaço: as feitas à base de soja entraram em mais 2,2 milhões de novos lares em 2008, e o maior crescimento deste setor foi nas classes D e E, que passaram a consumir 32% mais.

Com o pessimismo em alta, o primeiro item a ser cortado é alimentação fora de casa, e o segundo são os gastos com telefonia celular, que nos últimos anos ganharam espaço no orçamento doméstico. Alguns produtos têm marca consolidada, como creme dental, e não devem ter muita migração. Já refrigerantes, cervejas, margarinas e chocolates têm marcas conhecidas, mas há espaço para inovações em embalagens.

Outros produtos da cesta de consumo, como papel higiênico, iogurtes, biscoito, amaciantes, shampoo, lâmina de barbear, café, as linhas de pós-shampoo e tinturas têm mais risco de mudança de marca, segundo avaliação dos especialistas.

O ano passado marcou a fronteira entre a abundância e a crise. Foi de crescimento acelerado nos três primeiros trimestres e despencou no último. E isso de certa forma se vê no consumo. Os números de 2008 ainda são de crescimento, mas foi no fim do ano que o consumidor começou a pisar no freio.

— A produção de laticínios teve uma queda de 7,5% no primeiro bimestre de 2009, mais ou menos a mesma queda do setor de bebidas.

As bebidas light, segmento que vinha crescendo, está em queda um pouco menor. Esses setores dependem de poder aquisitivo e o consumidor está mais seletivo — diz o diretor de economia da Associação Brasileira das Indústrias de Alimentação, Dênis Ribeiro.

A crise afeta a economia de forma diversa. O varejo sente os efeitos da crise. As empresas de cosméticos dizem não sentir queda nas vendas.

A Natura informou que está investindo em lançamentos de uma menor quantidade de produtos, mas com maior divulgação, e que acompanha o cenário com lupa.

— Estamos atentos ao que acontece na crise e flexíveis para reduzir ou ampliar o investimento. Até agora não fomos afetados, mas mês que vem podemos sentir os efeitos da crise. O nosso orçamento é quase mensal — conta o vice-presidente de negócios para o Brasil da empresa, José Vicente Mariano.

Outra indústria do setor, a Unilever, que também atua em alimentos, investe em divulgação e na manutenção de suas marcas principais no mercado.

— O consumidor não leva em conta só o custo. Se deixar de investir, perde participação de mercado e vai custar mais para recuperar depois. Tem de ter um portfólio, com marcas mais baratas e outras de valor agregado.

Até porque, se o consumidor já é fiel a uma marca, pode passar a ser fiel a outras marcas nossas — diz o vice-presidente de assuntos corporativos da empresa, Luiz Carlos Dutra.

Outros setores só conseguem manter o nível de vendas com promoções. Na quinta-feira, uma leitora da coluna nos contou que comprou óculos escuros depois de obter 40% de desconto e com parcelamento em seis vezes, tudo oferecido pela ótica e desta maneira: 30% do desconto eram da loja e os outros 10% eram da comissão da vendedora.

O presidente da Associação Brasileira de Lojistas de Calçados, Marconi Leonel dos Santos, disse que o mês de março deve ter uma queda de 2% no faturamento, depois de um primeiro bimestre em que o volume de vendas cresceu, mas, com as liquidações, os preços foram menores e o faturamento ficou estável.

— Para o segundo trimestre estamos cautelosos, mas abril começou melhor.

O consumo em época de crise varia mês a mês. O consumidor é mais arisco.

Fica no mercado quem sabe usar as velhas armas da qualidade e do preço.

Com Leonardo Zanelli

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