Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, setembro 02, 2011

Certo ou errado, foi esquisito VINICIUS TORRES FREIRE


FOLHA DE SP - 02/09/11

Mesmo que se considerem novas ideias a respeito de juros e controle de preços, decisão do BC é estranha

O MAIS ESQUISITO nessa decisão do Banco Central de talhar a taxa de juros em meio ponto percentual foi o momento: anteontem. Isto é, mês e meio depois de tê-la aumentado; pelo menos mês e meio antes de ser possível saber algo sobre a rapidez do naufrágio da economia mundial.

Mais importante ainda: com ou sem naufrágio, cortar meio ponto agora ou na próxima reunião do BC, em 19 de outubro, não faz grande diferença para a economia. Aliás, nem pequena diferença.

Mesmo que, como se alardeava histericamente ontem, o BC tenha feito picadinho do sistema de metas de inflação, que tenha agora uma meta de crescimento acertada com o governo, que tenha vendido sua autonomia por um prato de lentilhas decimais de crescimento do PIB, a decisão de ontem continua a não fazer muito sentido.

Com a lambuja do meio ponto talhado ontem, quanto crescimento extra, mesmo de curto prazo, o BC poderia entregar para sua suposta nova soberana, Dilma Rousseff, mãe de todas as Rússias, Bulgárias e políticas monetárias? Décimos, se tanto, a depender dos humores do Imponderável de Almeida. Logo, tal motivo não parece muito crível.

Deve-se então acreditar na exposição de motivos de anteontem, a que justificou a decisão do BC? Isto é, que o Copom passou o facão na Selic por acreditar em colapso iminente do crescimento mundial, com impactos imediatos no Brasil?

Tal justificativa parece meio doida também, pois: 1) É preciso haver o colapso mundial (ainda incerto); 2) O choque deve ser iminente (incerteza ao quadrado); 3) O colapso precisa contaminar o Brasil de pronto (incerteza ao cubo); 4) Enfim, seria preciso verificar se, em caso de contágio mortal, a ação preventiva deveria ser mesmo o corte imediato dos juros. Pode não ser o caso.

Pode ser que o BC acredite que a inflação murche abruptamente a partir de, digamos, outubro. Não haveria colapso, mas influência decisiva da estagnação mundial, da contenção de gastos federais e de medidas monetárias do primeiro semestre na baixa da inflação.

Não é a opinião dos economistas mais certeiros e ponderados do mercado. Mas, como o mercado também diz e faz besteiras enormes, a gente pode dar o benefício da dúvida ao BC. Um benefício cedido assim a contragosto. Por quê?

Ainda que o nível de emprego levasse um tombo tal como na crise de 2008 (hipótese ainda bem remota), hoje no Brasil há muito mais colchão para amortecer a queda da atividade econômica. Por exemplo, há gastos mais altos com salário mínimo, mais crédito oficial subsidiado (do que em 2008) e mais dinheiro de benefícios sociais.

Ainda que o governo tenha dito que vá ajudar a reduzir a pressão inflacionária contendo gastos, o Orçamento de 2012 prevê pé no acelerador da despesa. O gasto federal neste ano cresceu até agora uns 4% (sobre 2010). Para 2012, a alta prevista pela lei orçamentária é de 9%.

Suponha-se, enfim, que o pessoal do BC acredite que, em caso de recidiva da inflação, o pessoal da Fazenda e do Planejamento pudesse dar uma mãozinha de urgência, reduzindo os gastos públicos rapidamente. Dilma Rousseff não vai encrencar com um crescimento de menos de 4% em 2011 ou em 2012?

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