DURANTE HORAS, ficou mais caro fazer seguro contra o calote da dívida de curto prazo do governo americano do que se precaver contra a inadimplência do governo brasileiro. Parece piada. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, não perdeu a oportunidade de fazer a piada. Mas se trata, na prática, de piada.
Mantega observara que o custo dos CDS (Credit Default Swaps) para papéis americanos de um ano chegou a ficar centésimos de porcentagem superior ao dos CDS para títulos brasileiros. Grosso modo, ao comprar um CDS, adquire-se o direito de receber um pagamento caso um devedor fique inadimplente; o custo do "seguro" são os pagamentos feitos ao "segurador", a taxa ao qual o ministro se referiu.
Em tese, essa taxa é uma medida de risco de investir num determinado título de dívida. Quanto maior a taxa, mais caro o "seguro", maior, em tese, o risco percebido de haver calote ou "ocorrência de crédito".
Mas o CDS não é um seguro nem é regulamentado como são os seguros (ou regulado oficialmente de qualquer outro modo, aliás). Um investidor pode comprar um CDS mesmo que não seja credor da dívida em questão, a dívida "segurada". Isto é, tanto quem vende como quem compra um CDS pode especular sobre a possibilidade de um devedor dar um calote ou não, mesmo que não tenha "emprestado" o dinheiro.
De fato, a maior parte dos contratos é feita por investidores que não têm negócio direto com o devedor.
Em suma, a negociação de CDS é um balcão de apostas nos moribundos do mercado (ou na capacidade de alguns deles recuperarem o crédito). Como podem servir para estruturar um mundo de operações especulativas, os CDS foram um canal largo de expansão de contágio na crise financeira de 2007-2009.
Tais apostas, óbvio, levam em conta condições de mercado e a situação econômica de empresas ou governos objeto do jogo. Como em toda a piada, o risco americano de um ano ser maior que o brasileiro diz algo sobre fatos e preconceitos da vida. No caso, o fato é que o governo dos Estados Unidos está na inédita situação de, pelo menos por um dia, não ter como fazer dívida nova e, assim, pagar suas contas.
O governo americano chegou a seu limite legal de endividamento. Parlamentares republicanos chantageiam Barack Obama: se o presidente e os democratas não aceitarem cortes maiores de gastos, não aprovam novo teto para a dívida.
Trata-se de uma irresponsabilidade demente e selvagem dos republicanos. Parece impossível o governo dos EUA não pagar suas contas. Mas a possibilidade de haver mínimo desarranjo na oferta de títulos do governo no mercado já deixa bancos nervosos. Especular com CDS de curto prazo, ainda mais de baixa liquidez, pode, pois, render uns trocados (nos CDS de prazo maior, o risco Brasil é maior).
Mas, por favor, considere-se: 1) o mundo guarda seu dinheiro em títulos dos EUA; 2) os títulos da dívida de curto e médio prazo dos EUA têm rendimento real negativo (se a gente compra dívida americana e deixa o dinheiro parado por um, dois ou cinco anos, perde dinheiro, descontada a inflação); 3) o governo do Brasil paga a maior taxa de juros real do mundo, em pequena parte porque há um prêmio pelas esquisitices da economia e da história brasileiras, entre elas um passado de calotes.
Em tese, essa taxa é uma medida de risco de investir num determinado título de dívida. Quanto maior a taxa, mais caro o "seguro", maior, em tese, o risco percebido de haver calote ou "ocorrência de crédito".
Mas o CDS não é um seguro nem é regulamentado como são os seguros (ou regulado oficialmente de qualquer outro modo, aliás). Um investidor pode comprar um CDS mesmo que não seja credor da dívida em questão, a dívida "segurada". Isto é, tanto quem vende como quem compra um CDS pode especular sobre a possibilidade de um devedor dar um calote ou não, mesmo que não tenha "emprestado" o dinheiro.
De fato, a maior parte dos contratos é feita por investidores que não têm negócio direto com o devedor.
Em suma, a negociação de CDS é um balcão de apostas nos moribundos do mercado (ou na capacidade de alguns deles recuperarem o crédito). Como podem servir para estruturar um mundo de operações especulativas, os CDS foram um canal largo de expansão de contágio na crise financeira de 2007-2009.
Tais apostas, óbvio, levam em conta condições de mercado e a situação econômica de empresas ou governos objeto do jogo. Como em toda a piada, o risco americano de um ano ser maior que o brasileiro diz algo sobre fatos e preconceitos da vida. No caso, o fato é que o governo dos Estados Unidos está na inédita situação de, pelo menos por um dia, não ter como fazer dívida nova e, assim, pagar suas contas.
O governo americano chegou a seu limite legal de endividamento. Parlamentares republicanos chantageiam Barack Obama: se o presidente e os democratas não aceitarem cortes maiores de gastos, não aprovam novo teto para a dívida.
Trata-se de uma irresponsabilidade demente e selvagem dos republicanos. Parece impossível o governo dos EUA não pagar suas contas. Mas a possibilidade de haver mínimo desarranjo na oferta de títulos do governo no mercado já deixa bancos nervosos. Especular com CDS de curto prazo, ainda mais de baixa liquidez, pode, pois, render uns trocados (nos CDS de prazo maior, o risco Brasil é maior).
Mas, por favor, considere-se: 1) o mundo guarda seu dinheiro em títulos dos EUA; 2) os títulos da dívida de curto e médio prazo dos EUA têm rendimento real negativo (se a gente compra dívida americana e deixa o dinheiro parado por um, dois ou cinco anos, perde dinheiro, descontada a inflação); 3) o governo do Brasil paga a maior taxa de juros real do mundo, em pequena parte porque há um prêmio pelas esquisitices da economia e da história brasileiras, entre elas um passado de calotes.