Os goleiros estão
na maior torcida
O presidente da Fifa quer punir a paradinha na hora de bater o pênalti. O truque que Pelé inventou virou praga nos gramados
Duda Teixeira
Andy Rain/Corbis/Latinstock |
EM MEIO SEGUNDO Robin van Persie, do Arsenal, acerta pênalti, em maio: as chances estão do lado do batedor. Para o goleiro, é a oportunidade de virar herói |
VEJA TAMBÉM |
• Gráfico: |
O pênalti é um momento decisivo do futebol. "Coisa tão séria que deveria ser batido pelo presidente do clube", na frase atribuída ao lendário Neném Prancha, "filósofo da bola" e roupeiro do Botafogo. Em meio segundo - tempo médio que a bola leva para percorrer os 11 metros que a separam da linha do gol -, pode-se definir o resultado de uma disputa de 90 minutos. Para o cobrador do pênalti, as chances de gol são, em teoria, de 50%. Ou ele acerta, ou o goleiro pega. A tensão sobre o jogador é enorme. Tudo pode influir: o cansaço, o nervosismo, o vento, as irregularidades do campo, o modo como o pé bate na bola. Se chutar para fora, o jogador pode sair do campo sob vaia. "No momento de cobrar o pênalti, as pernas tremem, o gol diminui e o goleiro cresce", disse Pelé em 1989, já na sua fase de comentarista esportivo. Na prática, mostram as estatísticas, o goleiro está em nítida desvantagem. O gol é grande demais para ser inteiramente defendido. O goleiro deve permanecer na linha do gol, entre as traves, olhando para o batedor até que a bola seja chutada. Ele só tem tempo para uma manobra. Se pular para um lado e o atacante chutar do outro, não tem como impedir o gol. O resultado: quatro de cada cinco cobranças de pênalti terminam sacudindo as redes (veja os estudos e estatísticas sobre pênaltis nos quadros destas páginas).
Por causa das chances escassas dadas ao goleiro, a regra da penalidade máxima pode ser revista. Na semana que vem, o International Board, o colegiado responsável pelas regras do futebol, se reúne em Zurique, na Suíça. Na pauta está o destino da paradinha, tática de cobrança cuja invenção é creditada a Pelé. Em termos gerais, trata-se do seguinte: o jogador corre para a bola, mas não a chuta de imediato. Espera o goleiro jogar-se para um lado e, só então, mira no lado oposto. A chance de defesa é zero. Por isso, Joseph Blatter, presidente da Fifa, quer que esse recurso seja banido. Na opinião dele, "a paradinha é irregular. É uma forma de o jogador ludibriar o goleiro. Isso tem de ter punição". O cartola suíço propõe que a paradinha seja punida com o cartão amarelo e, no caso de reincidência, com o vermelho. Se depender de Blatter, a nova regra começará a vigorar nas competições do ano que vem.
A rejeição à paradinha é quase unânime entre goleiros e juízes. Atacantes costumam ficar em cima do muro, mas até entre eles há insatisfeitos. "A bola está parada. É só ficar tranquilo que a possibilidade de errar um pênalti é mínima", disse a VEJA o atacante Djalma Feitosa Dias, o Djalminha, que só errou dois pênaltis em quinze anos de carreira no Brasil, na Espanha e em outros países. "Se, além de todas as vantagens, o batedor usar a paradinha, aí já é covardia", completa. Pelé não pode ser responsabilizado pela farra atual. Em seu tempo de jogador, ao ouvir o apito do juiz autorizando a cobrança, o rei corria com velocidade, mas desacelerava ao se aproximar da bola, para só então chutá-la. Um curto-circuito de confusão atingia a mente do goleiro, fazendo que pulasse com atraso. O que se está vendo atualmente nos campos de futebol de todo o mundo é uma versão em que o jogador para inteiramente. Um exemplo do excesso foi dado pelo atacante Maicosuel num jogo entre Botafogo e Fluminense, em março. O pé do então botafoguense passou por cima da bola, voltou e chutou. "A meta do jogador não deve ser eliminar qualquer chance do adversário, e sim superá-lo, assim como fazia Pelé", diz o físico Ronald Ranvaud, do Laboratório de Fisiologia do Comportamento da Universidade de São Paulo (USP). O trabalho árduo, caso a proibição vingue, será encontrar uma fórmula efetiva para distinguir a paradinha leal da desleal. Os goleiros estão na maior torcida.