Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, setembro 11, 2009

Cenas obscenas NELSON MOTTA


O Globo - 11/09/2009

Só não é uma comédia de erros porque é dramático e constrangedor demais para todos os protagonistas e para os que acompanham o caso do italiano acusado de beijar na boca a filha de 8 anos, na piscina de um hotel de Fortaleza.


Por que o molestador, que vivia com a menina, procuraria um lugar público e cheio de gente para perpetrar seus crimes horrendos? Só se fosse também um exibicionista patológico. A ironia é que foi justamente um casal de funcionários de Brasília, onde as cenas obscenas de políticos com a ética e o dinheiro público são explícitas, que, indignado, o denunciou.

Como a criança era morena como a mãe e o pai branquelo como um europeu, a conclusão dos denunciantes foi imediata e definitiva — era evidente a exploração sexual de uma brasileirinha pobre, escura e indefesa, por um estrangeiro tarado e racista.

Pior, só se fosse um americano.

Assim como a beleza, a maldade quase sempre está nos olhos de quem vê. Em Nova York, onde a idiotice politicamente correta e a hipocrisia sexual americana levam ao paroxismo os conflitos entre expressões de afeto e abuso sexual, sofri com minhas filhas inúmeros olhares peçonhentos, e perversamente invejosos.

Sempre fomos muito carinhosos entre nós, nos beijamos e abraçamos com afeto e naturalidade, com alegria e inocência, e não iríamos mudar só porque vivíamos em Nova York. Pelo contrário, resolvemos nos divertir.

Nos restaurantes sempre alguns olhavam com suspeita para aquele cinquentão grisalho que entrava abraçado e dando beijinhos em uma bela garota de 17 anos. Eu e minha filha Nina nos sentávamos e continuávamos à vontade, rindo e cochichando, próximos e carinhosos. Um bom exercício para uma estudante de arte dramática. Vocês precisavam ver as caras indignadas que se fechavam enquanto nos divertíamos e eles bebiam seu próprio veneno. Golpe final: Nina pedia a conta. O garçom trazia, ela sacava do seu cartão de crédito (pago por mim, naturalmente) e assinava, enquanto os maliciosos e perversos espumavam de ódio e frustração: “E ela ainda paga a conta!” Eu agradecia com um selinho e saíamos às gargalhadas.

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