Entrevista:O Estado inteligente

domingo, janeiro 25, 2009

AUGUSTO NUNES SETE DIAS


O nocaute dos farsantes



Por que o silêncio que endossou a deportação dos pugilistas Erislandy Lara e Guillermo Rigondeaux, perguntam os que não se renderam ao cinismo, tirou para dançar esse berreiro que avaliza a promoção a "refugiado político" do terrorista em recesso Cesare Battisti? Por que não foram estendidas aos fugitivos da ditadura cubana as mãos que afagam o foragido da democracia italiana?, perguntam brasileiros honrados aos jornalistas que se tornaram cúmplices, por ação ou omissão, das duas abjeções consumadas pelo ministro Tarso Genro com o apoio explícito do presidente da República. Jornalistas que têm compromisso com a independência intelectual aprendem muito cedo que a misericórdia seletiva é um dos sintomas que identificam portadores de esquizofrenia conveniente. A disfunção se manifesta em 10 a cada 10 colunistas federais, mas nenhum se curva ao que é evidente. Preferem costurar fantasias e gaguejar desmentidos que só reafirmam uma lição antiga como o mundo: a esperteza, quando é muita, fica grande e come o dono. "De acordo com o noticiário da época", escreveu um integrante da tribo, os boxeadores que desertaram da delegação enviada por Cuba aos Jogos Pan-Americanos do Rio renunciaram espontaneamente à liberdade que os aguardava na Alemanha. Acharam melhor voltar ao marco zero da fuga "por naturais razões familiares". "Noticiário da época" deve ser o novo codinome de Tarso Genro, pai da versão que reduz dois passageiros do medo a marujos sem juízo nem rumo, enganados por empresários gananciosos, mas socorridos a tempo por policiais brasileiros e enfim resgatados da criancice pela saudade do lar abandonado alguns dias antes. Bonito, isso. E tão verossímil como uma cédula de três reais, tão consistente como um prédio de Sérgio Naya. A versão já nasceu grogue. Foi nocauteada pela segunda, e desta vez solitária e bem-sucedida, escapada de Erislandy Lara. Escaldado, percorreu a rota que evita a perigosa escala no Brasil e o risco da derrapagem em "naturais razões familiares". Enfim na Alemanha, durante a entrevista que não houve no Brasil por ordem dos carcereiros, Erislandy traduziu para língua de gente a expressão misteriosa. Enquanto permaneceram confinados na Polícia Federal, à espera do avião cedido a Fidel Castro pelo companheiro Hugo Chávez, os cubanos foram proibidos de conversar com jornalistas e advogados. Só não perderam completamente o contato com o mundo exterior porque pressurosos policiais apareciam a cada 15 minutos com notícias recém-chegadas de Cuba. Souberam, primeiro, que foram declarados "traidores" por Fidel, que alguns parentes já haviam perdido o emprego e que os amigos não paravam de ouvir ameaças por telefone. Mas em seguida souberam que seriam perdoados pelo ditador caso voltassem imediatamente. Confusos, assustados, embarcaram sem barulho. Já no aeroporto de Havana souberam que nunca mais voltariam a lutar. Todos haviam mentido. Só Fidel admite sem constrangimentos ter feito o que fez. Os outros continuam mentindo.



Temporão luta contra o rebaixamento

O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, declarou guerra à Unicef no começo da semana, inconformado com a agressão oficializada pelo relatório Situação mundial da infância
2009. Divulgado anualmente, o
documento reúne informações, colhidas nos 12 meses anteriores, que mostram como andaram as coisas em 2007. Temporão exige a remontagem do ranking que mede as taxas de mortalidade infantil no universo das crianças com até 5 anos. O Brasil aparece na 107ª colocação entre 197 países, com 22 mortos para cada mil nascidos vivos. A comparação com os dados de 2006 informa que o país perdeu seis posições. Temporão engoliu sem queixas o índice que não deixa o país bem no retrato. O que o incomoda é a queda. O relatório informa que, em um ano, a taxa subiu de 20 para 22 mortes. Estudos feitos pelo próprio ministério garantem que a taxa de 2006 foi de 23,1 para cada mil nascidos vivos. O Brasil, portanto, subiu no ranking. "Nossos critérios são mais confiáveis", diz Temporão. "Já me reuni com representantes, e até eles concordam". Os autores do estudo não emitiram nenhum sinal de que pretendem alterar a classificação divulgada há dias. Nem Temporão parece disposto a esquecer a posição no campeonato e concentrar-se na redução da mortandade ultrajante. A História do Brasil republicano informa que é mais difícil montar o pior que o melhor ministério desde 1889. O governo Lula ainda vai chegar lá.

O milagreiro de Minas Gerais
O ex-governador de Minas Newton Cardoso está bravo com a revista Veja: jura que seu patrimônio foi subestimado pela reportagem publicada na edição desta semana. E está bravo com a deputada federal Maria Lúcia Cardoso: jura que seu patrimônio foi superestimado pela ex-mulher, que reclama na Justiça metade da fortuna. "Tenho duas ou três empresas de reflorestamento, praia na Bahia, mais de 150 automóveis, 145 fazendas com declaração, documentos e taxas do Incra. É fazenda pra chuchu", garante. "Não tenho hotel em Paris. Tenho só seis quartos, recebidos como pagamento da dívida que uma empresa européia tinha com uma das minhas usinas de ferro-gusa". Tudo somado, qual o valor dessas imensidões? "A revista diz que descobriu R$ 150 milhões, mas só no Banco do Brasil tenho R$ 200 milhões aplicados", desconversa. "Como é que eu posso ter essa merda de dinheiro só?". Depois de discorrer com ironia sobre outras cifras divulgadas pela reportagem, avisa que vai ficar ainda mais rico com a bolada que espera juntar ao fim do processo que promete mover contra a revista. Também encara com otimismo a disputa judicial. Acha que Maria Lúcia não vai levar um único centavo. "Tenho pena dela e dos meus filhos", capricha na voz. Não é esclarecimento. É confissão. Agora é só a Justiça apurar o tamanho exato do patrimônio e descobrir como se faz para transformar em bilionário um pobretão de nascença.

Faltou imaginação
ao bandido nativo
Fernandinho Beira-Mar agora sabe que perdeu em 2001 a chance de trocar o uniforme de prisioneiro pela fantasia de revolucionário comunista e entrar para a história como o Cesare Battisti brasileiro. Bastaria jurar que pousara na Colômbia para entender-se com as Farc ­ e traficar armas e drogas em paz ­ mas acabou entendendo que não haverá salvação para o mundo sem a destruição do capitalismo explorador. Continuava na bandidagem não para embolsar os lucros, mas para financiar a guerrilha. Os dois ou três que matara no mês anterior eram contra-revolucionários. Se o ministro da Justiça fosse Tarso Genro, Beira-Mar hoje desfilaria na ala dos anistiados à espera da indenização.


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