O GLOBO - 03/06
A proximidade do julgamento do mensalão parece estar desestabilizando emocionalmente o ex-presidente Lula, que se tem esmerado nos últimos dias em explicitar uma truculência política que antes era dissimulada em público, ou maquiada.
Nessa fase em que trabalha em dois projetos que se cruzam e parecem vitais para seu futuro, tamanha a intensidade com que se dedica a eles, Lula não tem tido cuidados com as aparências, e arrisca-se além do que sua experiência recomendaria.
A pressão sobre ministros do STF, a convocação da CPI do Cachoeira, com direito a cartilha de procedimentos com os alvos preferenciais identificados (STF, imprensa, oposição) e as atitudes messiânicas, sempre colocando-se como o centro do universo político, revelam a alma autoritária deste ex-presidente ansioso pela ribalta política.
A eleição de Fernando Haddad para a Prefeitura de São Paulo e a obsessão em desmoralizar o julgamento do mensalão (já que não conseguiu adiá-lo para que seus resultados não interferissem na eleição municipal e, além disso, a prescrição das penas resolvesse grande parte dos problemas judiciais do PT) pareciam as duas grandes tarefas do ex-presidente Lula neste momento.
Mas ele, de voz própria, revelou seu verdadeiro objetivo político no programa do Ratinho: não permitir que um tucano volte a governar o país.
Nunca antes nesse país viu-se um político assumir tão abertamente uma postura despótica, quase ditatorial, quanto a de Lula nessa cruzada nacional contra os tucanos, que tem na disputa pela capital paulista seu ponto decisivo.
O PT, aliás, tem seguido a mesma batida de Lula, e se revela a cada instante um partido que não tem como objetivo programas de governo ou projetos nacionais para o país. A luta política pelo poder escancara posturas ditatoriais em todos os níveis, e para mantê-lo vale tudo. Desde rasgar a legislação eleitoral e fazer propaganda ilegal em emissora de televisão na tentativa de desatolar uma candidatura que até agora não demonstra capacidade de competição, até intervenções em diretórios que não obedecem à orientação nacional, como aconteceu agora mesmo em Recife. Vale também mobilizar um esquema policial de uma prefeitura petista, como a de Mauá em São Paulo, para apreender uma revista que apresenta reportagens contrárias aos interesses do PT.
A truculência com que foi impedida a distribuição gratuita da revista "Free São Paulo", que trazia uma reportagem de capa sobre o assassinato do prefeito petista de Santo André Celso Daniel, é exemplar do que o PT e seus seguidores consideram "liberdade de imprensa".
Os petistas acusam a revista de ser financiada pelo PSDB, o que ainda é preciso provar, mas, mesmo que seja, seria no mínimo incoerente criticarem tal estratégia, já que são estatais de diversos calibres e governos petistas que financiam uma verdadeira rede de blogs chapas-brancas e revistas para defenderem as ações governistas e demonizar seus adversários, em qualquer nível.
Da mesma forma, parece ironia que líderes petistas se mostrem indignados com financiamentos eleitorais de caixa 2 de políticos tucanos, como se esse crime fosse uma afronta ao Estado de Direito e não, como disse o ex-presidente Lula tentando minimizar o caso do mensalão, coisa corriqueira no sistema eleitoral brasileiro.
O recurso ao caixa 2 e a verbas não contabilizadas é evidentemente uma distorção do nosso sistema eleitoral que tem que ser combatida com rigor, mas o PT há muito perdeu a possibilidade de indignar-se diante deste e de outros malfeitos políticos.
Acaba de ser publicado em edição eletrônica (e-book) e deve sair na segunda semana de junho em edição impressa o relatório do Clube de Roma com o título de "2052, previsões globais para os próximos 40 anos", coordenado pelo professor Jorgen Randers da BI Norwegian Business School, especialista em questões climáticas e planejamento de cenários que servirá de base para a programação do Clube de Roma durante a reunião Rio + 20.
Randers já esteve no Brasil no início de maio, depois de lançar o relatório, para depoimento no Congresso em preparação para a Rio + 20.
Trata-se de um estudo feito por 30 pensadores nos mais variados campos e tem o objetivo de atualizar o famoso estudo do Clube de Roma de quarenta anos atrás intitulado "Os limites do crescimento", que já questionava o modelo de crescimento permanente.
Desta vez, o diagnóstico é conclusivo: a Humanidade vem se excedendo no uso dos recursos da Terra. A maneira atual de vida não pode ser mantida por gerações, e está a exigir modificações significativas para evitar colapsos locais antes de 2052.
O estudo admite que o processo de adaptação da Humanidade às limitações do planeta já começou, mas a resposta talvez seja lenta demais. A China é considerada um exemplo de país que sabe agir na direção certa, e por isso chegará a 2052 bem preparado.
O estudo alerta que continuamos a emitir todos os anos duas vezes mais gases do efeito estufa do que os oceanos e florestas podem absorver. Em consequência, as concentrações de CO2 na atmosfera continuarão aumentando, fazendo com que a temperatura aumente em dois graus em 2052.
Se esse processo não for controlado, em 2080 as temperaturas terão aumentado em 2,8 graus centígrados - nível suficiente para iniciar um aquecimento global autossustentado.
Segundo o relatório, a principal causa da incapacidade de resolver hoje problemas futuros é o modelo imediatista, com foco político e econômico no curto prazo.
Randers defende um sistema de governança de mais longo prazo. No entanto, é pessimista quanto aos resultados, pois não acredita que os governos adotem uma regulamentação que obrigue os mercados a investir em soluções climaticamente corretas, e, segundo ele, não devemos acreditar que os mercados trabalharão em benefício da Humanidade.
As previsões do documento do Clube de Roma sobre a economia global também não são nada animadoras. As atuais economias dominantes, especialmente os Estados Unidos, entrarão em estagnação, e países como os que formam os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) terão progressos, mas o PIB mundial crescerá muito mais lentamente, devido à redução do crescimento da produtividade em economias mais maduras.
Em 2052, ainda haverá 3 bilhões de pobres no mundo.