- O Estado de S.Paulo
A reunião dos quatro principais países da zona do euro - Alemanha, França, Itália e Espanha -, que buscavam uma saída para a crise financeira, deu praticamente em nada. Angela Merkel vetou novamente a criação dos eurobônus, uma solução indicada por todos os países do bloco e agora pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). Vetou também empréstimos diretos aos bancos espanhóis ou italianos, apesar do agravamento da crise. Sou chanceler da Alemanha e não sou responsável pela aplicação desses recursos, estimados em 130 bilhões, por enquanto. Empréstimo só aos governos para que os repasse aos bancos.
Até pode fazer sentido, mas isso aumenta a enorme dívida soberana desses governos e, simplesmente, afasta ainda mais os investidores. Eles não só cobram taxas insustentáveis para rolar a dívida, mas ainda estão saindo dos bancos espanhóis, gregos e italianos.
Assim, ficou tudo como estava em Roma até a próxima reunião, agora de todos os governos da zona do euro, no próximo dia 28. Também não se espera nada desse encontro porque a chanceler alemã foi categórica: não vai mudar e muito menos em uma semana. Ela exige que ou se pode intervir na administração financeira dos países socorridos, ou não tem dinheiro.
FMI endurece. A diretora-gerente do Fundo, Christine Lagarde, endureceu sua posição, criticou a intransigência alemã e exigiu mais ação dos países da zona do euro. O FMI defende que o Banco Central Europeu (BCE) compre títulos da dívida soberana, reduza os juros e acima de tudo, injete liquidez no mercado. Ou seja, emita euros. Nada de se concentrar apenas em austeridade fiscal que sozinha não só não resolve, mas agrava a situação. Como nada foi decidido, resta apenas o BCE seguir a política do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) que já injetou US$ 2,6 trilhões no mercado americano, de acordo com dados divulgados na sexta-feira.
O BCE ainda hesita, afirma que isso tiraria o "sentido retardado de urgência(?!)" para uma ação dos governos.
Alguma ajuda. Mesmo assim, como tudo se agrava, o BCE anunciou sexta-feira mais facilidades para que os bancos espanhóis e italianos recebam novos empréstimos do banco, além do 1 trilhão da linha que ofereceu aos países endividados.
Ajuda inconsistente. Talvez para salvar a face, os quatro países aprovaram proposta do presidente francês, François Hollande, para abrir um linha de credito de 130 bilhões ( US$ 156 bilhões) para obras de infraestrutura. Mas é pouco, apenas 1% do Produto Interno Bruto (PIB) da zona do euro, e não é novidade porque proposta idêntica já havia sido aprovada solenemente na última reunião, há alguns meses. Além disso, metade dos recursos viria do Banco Europeu de Investimento que simplesmente não tem recursos.
Brasil, mais urgência. Após a reunião improdutiva do G-20, a presidente Dilma Rousseff disse que, diante da posição da zona do euro, como um bloco, não havia mais nada a fazer para mudar esse cenário externo. Deu a entender que ela vai ter de aprender. Cabe ao Brasil agir com mais intensidade para impedir que a forte desaceleração e as tensões financeiras, que só aumentam, o afete ainda mais.
E pode? Sim. Tem condições para isso e o recuo do PIB no primeiro semestre deve ter ativado o sentido de urgência do governo. Os dados do Banco Central divulgados na sexta-feira mostram um quadro favorável.
As contas externas vão bem, com o balanço de pagamentos registrando superávit de US$ 1,1 bilhão, em maio; conta financeira com superávit de US$ 3,99 bilhões; investimentos líquidos estrangeiros, US$ 3,7 bilhões; déficit em transações correntes nos cinco primeiros meses do ano está em apenas 2,1%do PIB. É de US$ 21 bilhões, menor que os US$ 22,6 bilhões em igual período do ano passado. Mais importante, o ingresso líquido de investimentos diretos ficou em US$ 63 bilhões nos últimos 12 meses.
As reservas tiveram ligeiro recuo em maio, US$ 1,9 bilhão, mas aumentaram em relação ao ano anterior. Estão em US$ 372,4 bilhões.
Há ainda os recursos do compulsório e do Tesouro Nacional, que elevam as disponibilidades líquidas do governo para cerca de R$ 800 bilhões. Esse valor passa de R$ 1 trilhão se contar parte das reservas cambiais que podem ser convertidas em reais, como se fez na crise de 2008.
Inflação encolhe. O indicador mais significativo é o recuo da inflação que aponta para 4,5% este ano. Isso abre espaço para mais redução dos juros, mais investimentos de curto e médio prazos, crédito e consumo.
Há espaço também para novas emissões do Tesouro para financiar o crescimento, porque a dívida interna, sob controle, está em torno de 43%. Nos Estados Unidos e na zona do euro, passam de 100%.
Eles estão sufocados, sem muita saída. O Brasil, não. O governo tem os recursos, instrumentos fiscais e monetários para agir e evitar que o PIB fique em apenas 2% este ano.
Faltam ainda seis meses para se afastar da recessão que ameaça de novo a economia mundial.