O Estado de S. Paulo - 13/06/2011 |
Fernando Henrique Cardoso completa 80 anos no próximo dia 18. Eis aqui minha opinião sobre como ele mudou o Brasil. Pode-se dizer que ele caiu de paraquedas no Ministério da Fazenda do governo Itamar Franco, em 19 de maio de 1993. FHC era chanceler desde 1992, estava satisfeito no cargo e foi surpreendido pela decisão de Itamar, que acabava de perder seu terceiro ministro da Fazenda. FHC não é economista nem era especialmente entusiasmado pelo tema. Meio de brincadeira, meio a sério, sempre deixava escapar aqui e ali suas ironias a respeito do, digamos, excesso de confiança dos economistas. E foi assim que liderou talvez a maior virada econômica da história brasileira. Nada foi por acaso. Ao contrário, foi um caso exemplar em que um líder político enxerga um caminho, reúne colaboradores para apoiá-lo tecnicamente e constrói a sustentação política para tocar o projeto. FHC definiu o objetivo central: eliminar a inflação, devolver ao País uma moeda confiável. Cercou-se de economistas que ainda não tinham a fórmula pronta, mas eram acadêmicos que trabalhavam numa determinada linha de pensamento - o pessoal da PUC-Rio, mais ortodoxo. Deixou de lado, assim, uma turma paulista que sempre o acompanhara, mas que, na visão (acertada) de FHC, não tinha propostas firmes para enfrentar a inflação brasileira. Muitos economistas convidados por FHC já tinham passado pelo governo. Haviam trabalhado no fracassado Plano Cruzado (1986-1987) e traziam dessa experiência uma impressão negativa do ambiente político brasileiro. Achavam difícil viabilizar um plano de estabilização, dadas as enormes mudanças que seriam necessárias em praticamente todos os setores da vida econômica. Por exemplo: na ocasião, até como herança do regime militar, era tudo estatal (mineração, siderúrgicas, telecomunicações, bancos estaduais) e tudo ineficiente. Os políticos da democracia haviam gostado muito desse monte de vagas a ocupar. Como dizer a eles que seria preciso um amplo programa de privatização? Só o prestígio pessoal e a liderança de FHC poderiam reunir, num fraco governo Itamar, os talentosos economistas chamados para a enorme tarefa de refazer a moeda brasileira. A história da URV/real já é bastante conhecida. Menos conhecida é a arquitetura política desenhada por FHC para conseguir que o plano fosse aprovado dentro do governo, no Congresso e na sociedade. Mesmo o sucesso imediato do real não tornou fácil aprovar as complementações, especialmente a reforma da Previdência, a Lei de Responsabilidade Fiscal, as privatizações, a quebra do monopólio da Petrobrás. Já como presidente, FHC certamente tinha mais poder, mas ainda assim precisou gastar muito capital político na votação das reformas constitucionais. A oposição a essas medidas não vinha apenas do PT, mas dos próprios aliados de FHC, de seus amigos da academia e de amplos setores da sociedade, todos ainda com a cabeça antes da queda do Muro de Berlim. FHC foi um dos raros políticos de seu tempo a entender o novo mundo. E soube como realizar essa agenda que mudou o Brasil de forma duradoura. Certamente houve equívocos e acidentes de percurso. Mas eis o que importa: ficamos com uma moeda de verdade e todo um arcabouço institucional que preserva a estabilidade macroeconômica. Um outro país. Custo Brasil. Não vamos entrar no mérito da decisão do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) sobre a fusão Perdigão-Sadia, que resultou na Brasil Foods. Mas digamos que o Conselho, em sua reunião da próxima quarta-feira, determine que a fusão seja desfeita. A decisão terá sido dada mais de dois anos depois de o negócio ter sido fechado e a nova empresa, posta em movimento. E, principalmente, há acionistas minoritários que compraram as ações da nova companhia na maior boa-fé, já que os papéis circulavam com autorização das autoridades reguladoras. Passam-se os meses e aparece outra autoridade reguladora dizendo que aquela empresa não poderia estar funcionando. É evidente que o processo está errado. Se considerarmos que fusões são um importante instrumento da economia contemporânea - com frequência um caminho para ganhos de eficiência -, está claro que a regulação atual é mais um capítulo do custo Brasil. Ninguém está propondo que as fusões sejam carimbadas pelas autoridades reguladoras sem maiores análises. Mas apenas que o processo seja mais eficiente e menos custoso. Se não pode, é bom que se diga logo. É exatamente a mesma situação das licenças ambientais. A concessão ou a negativa demoram demais - representando um custo enorme para as empresas e, sobretudo, para o País. E um atraso no crescimento. Os projetos ficam empacados nos órgãos ambientais - e, enquanto se espera, não vale a pena tentar alternativas. Não faz sentido econômico desenhar uma nova rodovia enquanto se espera (ou se luta) pela licença do projeto já encaminhado aos órgãos reguladores. Negada a licença, começa tudo de novo, tempo perdido duas vezes. Além disso, essa situação leva a interferências políticas. Foram notórias as pressões de Lula, como presidente e ex, para o licenciamento de Belo Monte, por exemplo. Isso termina por arruinar o processo. Na falta de uma boa legislação e de órgãos reguladores eficientes e realmente independentes, ficamos entre o custo do atraso e o custo da interferência política. |
Entrevista:O Estado inteligente
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