O Globo - 08/06/2011
O cenário para a inflação melhorou desde a última reunião do Copom. O IPCA divulgado ontem foi de 0,47% e o IGP-DI, zero. Lá fora, o índice que mede preços de commodities caiu 5,6% desde a última reunião, e o petróleo, 7,6%. Aqui, os preços por atacado caíram 0,63%. A hora não é de baixar a guarda, é de olhar para as outras pressões.
Com números bons do IPCA e do IGP-DI sobre a mesa, o Copom se reúne para decidir os juros. A aposta geral é de novo aumento, mas pequeno, de 0,25%. No comunicado deve haver alguma vírgula ou ênfase que indique se os juros vão subir mais 0,25% na próxima reunião; mais adiante; ou não vão mais subir.
Esta é a fase do ano em que normalmente a inflação cai por causa das safras dos alimentos. Desta vez a queda foi ajudada por bons e maus motivos. O bom é que alguns preços começam a ceder pelo resultado do esforço do BC de evitar o excesso de demanda. O mau é que a economia americana que parecia que decolaria no começo do ano engasgou: menos consumo americano, menos demanda mundial, preço mais baixo.
Mesmo assim, os juros devem subir hoje. Nos próximos três meses o IPCA vai ficar baixo, bem baixo, mas no acumulado de 12 meses o índice continuará subindo (vejam no gráfico). Essa dissonância precisa ser entendida. A Fazenda pode e deve comemorar os índices mensais baixos, mas o BC tem compromisso com a inflação em 12 meses, que está subindo.
Contradição semelhante se vê nas expectativas. Nas últimas cinco semanas, o Focus vem reduzindo projeções de inflação deste ano. A taxa ficará acima do teto da meta por uns meses, mas depois cairá. A última projeção foi de 6,22%. Mas para 2012 as apostas estão acima do que o BC promete. É preciso "ancorar" expectativas, como dizem os economistas, ou seja, não deixar que as pessoas pensem que a inflação futura será mais alta. O aumento de 0,25% será o quarto do ano e levará os juros a 12,25%, altíssimos em qualquer comparação internacional. O objetivo deve ser buscar estruturalmente juros baixos.
Há dúvidas sobre o que acontecerá depois da alta de hoje. O HSBC, por exemplo, acredita que haverá parada técnica em julho e agosto. Há quem aposte em nova alta na próxima reunião. A conferir.
O cenário externo não está nada bom. Os EUA e a Europa estavam em recuperação e perderam fôlego. Nos EUA, o crescimento econômico não gera emprego. As empresas aumentam a produtividade, mas não abrem vagas. Na Europa, a crise na Grécia aumenta as contradições da Zona do Euro. As bolsas caem.
A inflação de serviços continua alta, os preços administrados continuam sendo corrigidos com base nos IGPs, que nos últimos meses está perto de 10%.
O economista da Modal Asset, Alexandre Póvoa, calcula que pelo lado das contas do governo, o superávit primário para o ano já foi 50% cumprido. Seria ótimo se não fosse resultado que depende principalmente do aumento da receita: ela subiu 17% nos cinco primeiros meses do ano, em relação a 2010, sem descontar a inflação. Póvoa está mais preocupado com 2012 porque o salário mínimo vai subir 7,5% acima da inflação, afetando a Previdência, os estados e municípios.
O PIB cresceu muito no primeiro trimestre, mas está desacelerando. Na segundafeira, a Anfavea anunciou a venda de carros em maio: alta de 10% sobre abril. Mas não é o que parece. A entidade explicou que maio teve mais dias úteis, e pela média diária houve queda de 5%. Para o presidente da entidade, Cledorvino Belini, as medidas de restrição ao crédito estão fazendo efeito. Ele diz que o crescimento do crédito ao setor estava na faixa de R$ 4 bi por mês até dezembro. Em maio, o crescimento foi de R$ 1 bilhão. A venda de carros à vista saiu de 32% do total para 38%, enquanto a venda à prazo caiu de 68% para 62%, como reflexo dos prazos mais curtos para pagamento.
O presidente da Abinee, Humberto Barbato, também acha que as medidas estão surtindo efeito pela redução dos prazos, que encarece as prestações:
— O brasileiro compra se a prestação cabe no bolso. Então o prazo mais curto está tendo efeito sobre o consumo de eletroeletrônicos. A queda da confiança dos consumidores e dos empresários reflete isso. Vamos rever nossa projeção de venda para o ano, de 11% para menos de 9%.
A desaceleração que o BC buscava está acontecendo.