13/02/2011
Durou exatos 38 dias o retiro sabático de Luiz Inácio Lula da Silva. Foi só surgirem as oportunidades - o 11.º Fórum Social Mundial, em Dacar, Senegal, e a festa do 31.º aniversário do PT, em Brasília - para o ex-presidente subir de novo no palanque. Para variar, disse algumas, poucas, coisas sensatas (como o puxão de orelha nos sindicalistas "oportunistas" que estão pressionando pelo aumento do salário mínimo acima do previamente combinado com o governo) e, como de hábito, confirmando o dito popular segundo o qual quem fala muito dá bom dia a cavalo, exibiu o melhor de seu repertório: banalidades, incongruências e demagogia. O mais notável, porém, foi a revelação de um sentimento insuspeitado: ciúmes. Lula deixou claro, exaltou-se mesmo, ao manifestar sua inconformidade com o fato de os "formadores de opinião" tenderem a aplaudir e elogiar o comportamento de Dilma Rousseff em suas primeiras semanas no poder. Para ele, isso significa que se está tentando "criar diferenças" entre o seu governo e o de sua sucessora, com o objetivo de "desconstruir" sua administração: "O sucesso do governo Dilma é o meu sucesso. O fracasso de Dilma é o meu fracasso. Se a grande desconstrução do governo Lula é falar bem do governo Dilma, eu posso morrer feliz". Descontada a patética demagogia barata dessa manifestação, ela pode ser interpretada também como um incisivo recado aos "formadores de opinião": parem de falar bem da Dilma!
E para que cada um entenda como quiser, garantiu, exaltado, que elegeu Dilma para ela fazer mais e melhor, porque "se fosse para fazer o mesmo, eu teria disputado o terceiro mandato". E, com a mesma desfaçatez, completou: "Eu apenas não estou no governo. Mas sou governo como qualquer companheiro que está no governo".
Compreende-se que o ex-presidente esteja ferido em sua egolatria, mas as diferenças entre seu governo e o atual não são invenção da mídia. Elas saltam aos olhos, mesmo quando se trata apenas de questão de estilo. Para citar apenas um exemplo, este no âmbito externo: Dilma já deixou claro que não mais ignorará o desrespeito aos direitos humanos de regimes autocráticos como o do Irã e o de Cuba. Mesmo assim, em Dacar, cobrado pelos jornalistas a respeito da incoerência que significa apoiar tanto as manifestações populares contra o governo do Egito quanto o regime fundamentalista dos aiatolás, Lula saiu-se com uma tirada que beira o cinismo: "É diferente. No Irã tem eleições". Como se não soubesse que no Egito também há eleições. Há outra diferença notável: em apenas duas ocasiões, em Dacar e Brasília, Lula falou muito mais do que Dilma em 40 dias de governo.
Além da revelação do ciúme de sua sucessora, o retorno do ex-presidente indicou, claramente, o papel que ele pretende desempenhar na cena internacional. Lula e seus conselheiros diplomáticos gostam de se jactar de que em oito anos de intensa participação conseguiram transformar o Brasil, de mero coadjuvante, em protagonista dos foros diplomáticos. Não passa, é claro, de uma pretensão desmontada pelas evidências. O Itamaraty não obteve, durante os dois mandatos de Lula, sequer uma conquista diplomática significativa. Ao contrário, protagonizou uma série de intervenções desastradas - Honduras e Irã, para citar apenas dois exemplos - e comprometeu qualquer possibilidade de êxito a curto prazo de sua maior ambição diplomática: a admissão do Brasil como membro permanente do Conselho de Segurança da ONU. Apesar disso, Lula está convencido, e o demonstrou em seu discurso no Fórum Social Mundial, de que tem um importante papel a cumprir como líder na luta contra os "países ricos" que só pensam em infelicitar a Humanidade: "Não pensem que lá (no G-20) tem sensibilidade para o problema da fome, para os problemas dos pobres do mundo. (...) Só fomos chamados para a reunião dos países ricos quando eles entraram em crise e precisaram do nosso apoio". Lula esbaldou-se falando mal dos Estados Unidos e da Comunidade Europeia, para uma plateia entusiasmada de "esquerdistas" de todos os matizes e procedências. É o velho Lula que volta com tudo e - quem diria! - com ciúmes de Dilma.
Entrevista:O Estado inteligente
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