FOLHA DE SÃO PAULO - 24/02/11
Choque menor de preços pode ser "amaciado" pela Petrobras; "estagflação", por ora, é um risco distante
DEPOIS DO zum-zum-zum por enquanto algo histérico sobre o risco de nova crise econômica global, devido ao aumento dos preços do petróleo, começou uma conversa ainda mais ansiosa a respeito do efeito das revoltas árabes sobre o Brasil.
Por ora, o preço do petróleo sobe por precaução especulativa, digamos. A guerra civil na Líbia está feiíssima, mas o temor é de o caldo entornar na península Arábica, nos Emirados e na Arábia Saudita. O entupimento dos canos da Líbia não enfartaria o mercado mundial. Em paz, os emires e os sauditas precisam apenas abrir algumas torneiras extras em seus campos gigantes a fim de compensar o forfait líbio.
No caso de não haver choque maior nas economias maiores, Estados Unidos e China, no Brasil há um amortecedor parcial para a alta do preço do petróleo. Para o bem ou para o mal, a Petrobras funciona como um monopólio regulador. Não repassa imediatamente nem altas nem baixas de preço. Esteja o barril a US$ 35 ou a US$ 135, muito consumidor não sente a variação, em particular o consumidor de varejo, de gasolina, por exemplo. Nos Estados Unidos, a variação de preço é sentida na veia e rápido, nas bombas da gasolina que os americanos bebem como doidos.
Mas não só combustíveis de varejo são feitos de petróleo & gás. Químicos vários, plásticos e fertilizantes dependem de produtos de refinaria. Muitos dos insumos desses produtos são importados -trata-se de um dos maiores buracos na balança comercial do Brasil. Os preços subiriam, se espraiando por toda a indústria e pela agricultura. A variação de outras commodities já colabora com a inflação "puramente" doméstica. A petroquímica inflacionada pioraria a situação. Além do mais, petróleo mais caro também pressiona o preço da comida por outros meios, devido aos biocombustíveis americanos, feitos de milho.
Quão provável é hoje o contágio?
Seria necessário um tumulto duradouro e radical, que mantivesse o barril a mais de uns US$ 120 por meses. Ou que houvesse a expectativa de que o preço ficasse por aí ou acima disso durante meses, ano até, no caso do preço do barril do tipo Brent -então seria provável mais especulação financeira e formação de estoques de segurança, o que levantaria ainda mais os preços.
O clima está, sim, tenso. O Brent foi a US$ 105 na segunda-feira e a US$ 111 ontem. Mas os entendidos desse mercado ainda não vislumbram a perspectiva de "choque do petróleo". O pessoal do "mercado" da finança, "analistas", é que está mais perturbado. Não há sinal de pânico no mercado financeiro ele mesmo, porém.
Num cenário de alta contínua de preços, consumo pessoal e lucros cairiam nos EUA (haveria menos dinheiro para gastar em outras mercadorias; custos de produção subiriam). Alguma mordida no crescimento haveria, como houve em 2007/8, antes da crise financeira.
De julho de 2007 a julho de 2008, o preço do barril aumentou uns 70%, para US$ 135, levando talvez um ponto percentual de crescimento, segundo a conta de alguns bancos e economistas. Talvez houvesse mais inflação na China, embora os chineses ditatoriais estatistas tenham meios de sufocar o efeito de uma alta temporária de preços.
Mas isso tudo é apenas especulação, ainda.
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