O Estado de S. Paulo - 10/02/11
A visita do secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Timothy Geithner, parece compor uma nova agenda da política externa americana, que busca reaproximação com o Brasil após o esfriamento das relações durante o governo Lula. Geithner aproveitou o momento para ressaltar os problemas do Brasil com seu principal parceiro comercial, mesmo porque Dilma está revendo e questiona a chamada "parceria estratégica" nas relações com a China.
Para Rodrigo Tavares Maciel, que foi durante muito tempo economista-chefe da Conselho Empresarial Brasil-China e hoje é sócio da Strategus Consultoria, as relações do Brasil com a China e os EUA precisam ser avaliadas com base em dados atuais, que mostram distorções crescentes.
"Geithner trouxe a mensagem de que Brasil e EUA precisam se alinhar para exigir da China mudança imediata em sua política cambial. Justificando a competitividade chinesa somente em razão da moeda desvalorizada - o que a maioria dos economistas especializados em China contesta -, o secretário americano procurou reforçar o coro de parte da indústria brasileira que exige mudanças nas relações com a China." Mas, pergunta ele, será que o Brasil tem condições, ou mesmo teria ganhos significativos, nessa batalha ao lado dos EUA?
Brasil pode pouco. Primeiro, afirma Maciel, é preciso analisar os números e a importância do mercado chinês para o Brasil. "Em 2010, o comércio bilateral ultrapassou US$ 53 bilhões e o Brasil manteve um superávit de US$ 5,2 bilhões. Não é nada comparado com o déficit de US$ 7,7 bilhões com os EUA nesse ano. Mais ainda, o comércio com o país asiático já representa 13,9% das nossas trocas com o mundo e o superávit de 2010 equivaleu a 38,1% do superávit total brasileiro. Realmente, diz Tavares Maciel, não me parece que o Brasil tenha peso significativo nesse comércio.
Nós e os EUA. No caso dos EUA, todos sabem da sua relevância e interdependência do mercado chinês. "Os EUA são o maior mercado para produtos chineses (ou segundo maior, se considerarmos as compras totais da União Europeia). Eles importaram o equivalente a US$ 334,1 bilhões no ano passado. O comércio bilateral superou US$ 415,8 bilhões, ou seja, cerca de 14,4% do comércio total chinês em 2010. Mais ainda, os EUA registraram déficit de US$ 252,3 bilhões com a China."
É uma situação completamente inversa à do Brasil. Ao contrário dos EUA, a grande reclamação do Brasil se refere unicamente à composição da pauta comercial sino-brasileira, acrescenta Maciel em entrevista à coluna.
"Nos últimos cinco anos, a indústria brasileira tem sido responsável por cerca de 70% do total que importamos da China. Ou seja, a própria indústria tem adquirido maquinário para renovação e expansão do parque industrial e componentes mais baratos que garantem a maior competitividade nos mercados doméstico e internacional. A não ser que defendamos a tese de verticalização total da cadeia produtiva brasileira, que resultaria em retrocesso inimaginável, a relação comercial com o país asiático também apresenta benefícios significativos à indústria que não podem ser ignorados\."
É claro, admite ele, que determinados setores, como calçados, brinquedos e vestuário, sofrem com a competição no mercado interno, "mas não podemos, nem mesmo por um só instante, culpar somente o câmbio".
Nova agenda? A agenda brasileira para a China deve ser reformulada a fim de garantir ainda maior aproximação, diálogo e negociação entre os dois países, afirma ele. "Acredito que o governo Dilma tem plena convicção da importância da relação sino-brasileira e irá adotar uma política que permita avançar quantitativamente e qualitativamente."
É isso o que pensa um respeitado analista do comércio Brasil-China. O debate está aberto. Vamos ver em próxima coluna o que pensa a Confederação Nacional da Indústria.