JORNAL DO COMMERCIO (PE)
A entusiasmada rememoração da queda do Muro de Berlim ora em curso contrasta visivelmente com a parcimônia, quase penúria, das lembranças sobre o início da Segunda Guerra Mundial. Separados por um intervalo de meio século, o início da maior catástrofe dos últimos 500 anos (1939) e o desabamento do Muro de Berlim (1989) fazem parte do mesmo processo. Diferentes e igualmente sanguinárias – uma quente, incandescente, a outra erroneamente chamada de "fria" – as duas guerras que compõem o Século das Ideologias o abreviaram decisivamente: no lugar de 100 anos, apenas 73. A centúria começou atrasada, em 1918, quando acabou a Primeira Grande Guerra e terminou em 1991 quando depois do Muro, ruiu toda a Cortina de Ferro.
Neste panorama contínuo, ininterrupto e extraordinariamente dinâmico, não fazem sentido festejos parciais para valorizar momentos ou porções. Envolvida ainda pela brutalidade e pelo luto, a Segunda Guerra Mundial em geral é mantida como um impreciso pano de fundo. Não consegue sequer funcionar como advertência de que o nazifascismo está morto mas não enterrado. Mais recente, a Queda do Muro está na lembrança de muita gente, foi um evento, tem o seu folclore, virou cult.
Daí os retumbantes equívocos que produziu. Nestes dias é imperioso lembrar o tropeço do pensador norte-americano Francis Fukuyama que, tomado pela euforia com os acontecimentos em Berlim, proclamou o Fim da História. Para ele, a derrota do socialismo e o triunfo da dupla capitalismo-democracia burguesa significavam o início de um período harmonioso, sem conflitos, reprise da Dourada Era de Segurança (expressão usada por Stefan Zweig para designar o fin-de-siècle 19).
O fim do Muro de Berlim representou o lance final da disputa entre os dois vencedores da Segunda Guerra Mundial (os aliados ocidentais e o império soviético), mas neste confronto não deve ser minimizada a tenacidade do povo alemão em purgar seus pecados, assumir suas culpas e assegurar a extinção do nacional-socialismo. Hitler foi, de certa forma, o pai da Guerra Fria: sua carreira política começou logo depois da Primeira Guerra, quando participou de um curso no exército alemão para a formação de líderes antibolcheviques. Entrou para o Partido dos Trabalhadores Alemães, de direita, com a missão de mostrar que o comunismo era uma invenção judaica para dominar o mundo. Juntou as duas paranoias (antissemita e anticomunista) e com elas tomou conta da Alemanha, grande parte da Europa e tocou fogo no mundo.
Benito Mussolini, mestre-escola e jornalista panfletário, era um inflamado socialista, de esquerda. A Itália nem de longe se comparava ao poderio alemão. Mas ainda nos anos 30 do século passado o fascismo de Mussolini teve fortíssima penetração no mundo latino-europeu, latino-americano, eslavo e quase tomou conta da Áustria se Hitler não mandasse assassinar Engelbert Dollfuss. A derrubada do Muro de Berlim não acabou com o veneno que o gerou. Este é um dado que não deve ser esquecido: o fascismo tem uma incrível capacidade de mutação. Outro dado que não pode ser ignorado é aritmético: o idolatrado Fim da História durou apenas 12 anos.
Em 11 de setembro de 2001, sem pedir licença a Fukuyama nem a seus mentores na Casa Branca, introduziu-se no cenário mundial um poderoso e até agora imbatível protagonista: o terrorismo islâmico. Logo em seguida, no final de 2008, o sempiterno capitalismo exibiu toda a sua fragilidade quando uma das bolhas que periodicamente fabricava o arrastou para o brejo. De onde ainda não saiu, apesar do esforço dos estatísticos.
O Muro de Berlim foi derrubado com martelos e picaretas, uma festa. Mas antes dele a humanidade entrou em colapso, um horror. Esta moeda, como todas, de qualquer valor, tem duas faces. A transmissão de informações e a capacidade de armazená-las constituem a mais preciosa faculdade da nossa espécie. A memória tem sido uma ferramenta fundamental para a sobrevivência do ser humano. Lembrar é vital. Lembrar fragmentos pode ser mortal.
Entrevista:O Estado inteligente
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