Entrevista:O Estado inteligente

domingo, julho 08, 2012

Podemos reagir, eles não - ALBERTO TAMER


O Estado de S.Paulo - 08/07


Os bancos centrais da zona do euro, da China e da Inglaterra reduziram juros e aumentaram a liquidez no sistema, na quinta-feira, revelando um maior nível de alarme com as tensões no mercado financeiro e a desaceleração da economia mundial.

O juro de 0,75% na zona do euro (inalterado desde dezembro do ano passado, apesar do agravamento da crise) é agora negativo em termos reais, descontada a inflação de 2,4%. Na Grã-Bretanha, ele permaneceu no nível histórico mais baixo, 0,5% - pouco adiantava uma nova redução -, mas o Banco da Inglaterra anunciou uma nova injeção imediata de liquidez de 50 bilhões, sinalizando que sua intervenção pode ir além dos £ 325 bilhões que já emitiu. Alguns, falam que pode ir a £ 500 bilhões. A prioridade é evitar a recessão.

Coordenação? O presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi, negou que tivesse havido uma ação coordenada dos três bancos. Coordenação ou não, as medidas em Frankfurt, Londres e Pequim foram anunciadas num curto prazo - em apenas uma hora - revelando que estão preocupados, mas atrasados três anos, quando a crise na zona do euro se iniciou. Eles estão fazendo, agora, o que o Fed (banco central americano) faz desde a quebra do Lehman Brothers, em 2008, com juros reais negativos em torno de 0,5% por longo prazo - vão ser mantidos pelo menos por mais dois anos -, além da emissão, criação direta ou indireta maciça de injeção de US$ 3 trilhões no sistema financeiro. E o Fed já sinalizou que poderá voltar a agir com mais rapidez do que se esperava. Talvez anuncie uma nova linha de liquidez antes da reunião marcada para o dia 31, porque o desemprego não cede, chegou ao nível recorde de 8,2%, a situação na Europa se deteriora, as exportações se retraem, o consumo não reage e a economia desacelera novamente. Emitindo maciçamente dólares, o Fed conseguiu evitar o pior há três anos, tirou em dois anos o país da recessão, mas não foi suficiente para sustentar um crescimento, que, prevê, deve ficar abaixo de 2% este ano. Os europeus acordam e só começam a agir agora. Em 2011, o BCE, na presidência de Jean-Claude Trichet, chegou até a aumentar os juros em plena crise! Para ele, a inflação de 2% era uma tragédia a ser evitada mesmo ao custo da recessão, que acabou vindo.

O juro que ajuda. O Brasil tem várias vantagens nesse cenário em que a Europa, os Estados Unidos e o Japão não podem mais contar com redução dos juros para retomar o crescimento.

A taxa Selic de 8,5% é ainda elevada, o que permite novas reduções a curto e a médio prazos sem afetar muito a rentabilidade dos títulos dos papéis brasileiros. O juro de 8,5% representa uma taxa real de 3,5% se a inflação ficar em 5,0%, apesar de o câmbio ser ainda atraente em relação ao juro internacional, que só recua. Ou seja, o Brasil pode ainda continuar reduzindo os juros. Eles, não. Perderam um instrumento da política monetária e lhes resta emitir dólares, euros ou pressionar os governos a afrouxarem também a política fiscal. Outro aspecto favorável ao Brasil é que os Estados Unidos e a Europa têm inflação baixa, de 2,0%, em média, enfrentam o risco de deflação e lutam ainda para evitar a recessão. O Brasil cresce em torno de 2,0%, tem inflação alta, cerca de 5,0%, o endividamento é baixo e o Congresso, meio abalado por sucessivos escândalos, incomoda, mas não atrapalha. O governo e o BC têm hoje instrumentos para agir nas frentes monetária, fiscal e ainda subsidiar investimentos, como estão fazendo por meio do BNDES.

Não decidem nada. Há um terceiro aspecto positivo, que diferencia o Brasil da zona do euro e dos Estados Unidos. O político. Em ano de eleição, o Congresso americano, dividido, impede o governo de oferecer mais incentivos fiscais, tributários e, acreditem, até mesmo salariais para retomar o crescimento. Na União Europeia, persiste a divisão de Alemanha, França e Inglaterra sobre o que fazer para superar a crise. Uma divisão que já dura três anos sem sinais de mudanças mais firmes. Empurra-se a crise da dívida para diante, mas ao mesmo tempo nada se faz para evitar que a economia resvale novamente para a recessão. Quando muito, cresceria 0,5% este ano.

Devem muito. Finalmente, os governos americano e europeu têm um altíssimo nível de endividamento - cerca de 100% do PIB e até mais em alguns países - e encontram dificuldades para investir, estimular a demanda e reanimar o crescimento, que definha.

Brasil favorecido. Nada disso ocorre no Brasil. O Congresso incomoda, mas não atrapalha seriamente; o endividamento do setor público de 35,7% é o mais baixo desde que a série vem sendo levantada, em 2001 - eles devem 100%. O juro é alto e pode ser reduzido, a inflação está controlada e, acima de tudo, o governo tem reservas e recursos para investir. Eles estão mal, nós poderíamos estar bem. E, em último caso, haveria espaço para emitir. O único fato entre eles e nós é a hesitação. Parece que eles estão atrasados e não têm pressa. E nós?

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