O Estado de S. Paulo - 03/08/2011
Pode ser que seja apenas choro de perdedor. Mas pode ser também que tenham fundamento as denúncias de Oscar Jucá, o irmão do líder do governo no Senado, Romero Jucá, demitido na diretoria financeira da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) por autorizar irregularmente o pagamento de dívida de R$ 8 milhões a empresa registrada em nome de dois "laranjas".
Ele acusa o próprio ministro na Agricultura, Wagner Rossi, de comandar um esquema de corrupção "pior" do que aquele que levou o governo a promover 27 demissões no Ministério dos Transportes.
Rossi é do PMDB - partido que ocupa três das cinco diretorias da Conab - e foi indicação direta do vice-presidente Michel Temer. A acusação, se verdadeira, atingiria o partido que na semana passada chegou a redigir uma nota oficial exortando os "órgãos de controle" a cumprirem seu dever de fiscalizar sem dó nem piedade todas as suspeitas irregularidades na administração federal, envolvendo o PMDB ou qualquer outro partido da coalizão governamental.
Os pemedebistas estavam especialmente desconfortáveis com versões de que seriam poupados da ofensiva ética para evitar retaliações ao governo no Congresso. Da nota não se teve mais notícia - pelo visto achou-se por bem não oficializar por escrito a defesa da transparência.
O governo, de seu lado, rechaçou desconfianças de que a limpeza poderia ser seletiva, limitando-se ao mal-afamado e combalido PR. "Vai continuar", repetiu várias vezes a presidente Dilma Rousseff sempre que lhe perguntaram sobre sua disposição de mudar o escopo da obra do fisiologismo.
"Nenhum ato (de corrupção) será tolerado", começou a semana dizendo Gilberto Carvalho, garantindo que o governo iria "para cima" quando houvesse denúncias.
Pois bem, surgiu uma com nome e sobrenome do denunciante, que aponta a existência de um balcão de negócios no Ministério da Agricultura.
Do partido até outro dia indignado com ilações ao seu respeito o que se ouviu foi um pedido de desculpas feito pelo irmão do acusador à presidente.
Célere no caso dos Transportes, o Palácio do Planalto quedou-se inerte diante do PMDB, a quem atribuiu a tarefa de "resolver" o problema. Da parte de quem transmitiu à sociedade a impressão de que o rigor seria a palavra de ordem de agora em diante, seria de se esperar alguma atitude.
Ao menos o anúncio da determinação de apurar se o que disse Oscar Jucá é passível de investigação ou se as acusações, na visão da presidente, são denúncias vazias.
A falta de clareza e de firmeza no trato do episódio que põe na berlinda o PMDB elide a credibilidade da presidente da República. Mais: levanta a suspeita de que o PR pode ter sido escolhido a esmo no meio do lodaçal para fazer o papel de contraponto numa investida meramente promocional da imagem de Dilma Rousseff.
Bom entendedor. O senador Alfredo Nascimento, ex-ministro dos Transportes, disse ontem no Senado que todos os aumentos de preços em obras do PAC foram feitos enquanto Dilma e ele estavam afastados para concorrer à Presidência e ao Senado, respectivamente.
Ou seja, durante a campanha eleitoral sobre cujas arrecadações se lançam suspeitas recorrentes.
Em andamento. A propósito de artigo sobre a ausência de ação da Polícia Federal nos casos dos demitidos do Ministério dos Transportes, o Ministério da Justiça informa que a PF está analisando cada um deles para verificar se há necessidade de abertura de novas investigações ou se podem ser enquadrados nos mais de 80 inquéritos já abertos envolvendo o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e a Valec, empresa encarregada das ferrovias.
Parada técnica. A partir de amanhã e pelos próximos dez dias. Até a volta em 15 de agosto.
Entrevista:O Estado inteligente
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